A primeira mulher trans eleita no Brasil

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“Vereadora do povo”: quem é Kátia Tapety, a primeira trans eleita do Brasil

Na adolescência, o pai a tirou do convívio social por desconfiar de seus “trejeitos”; período de exclusão contribuiu para início na política

Estigma em relação à sexualidade e gênero impactaram na vida de Kátia Tapety, primeira trans eleita no Brasil. (Foto: Reprodção/Faceboo/@katia.tapety)

 

 

Em 2020, tivemos, pela primeira vez, um número significativo de pessoas transexuais e travestis se candidatando a cargos públicos, resultando em 25 pessoas eleitas. Um feito histórico para a população trans que luta por mais políticas públicas, segurança e qualidade de vida. No entanto, como diz o ditado, para alguns andarem, outros tiveram que correr.

Muito antes desse aumento da representatividade trans na política, em 1992, tivemos a primeira mulher trans eleita no Brasil. Ela veio de uma pequena cidade chamada Colônia do Piauí, que fica a 388 quilômetros ao sul da capital Teresina. Kátia Tapety, 75, a “vereadora do Povo”, como é chamada pelos moradores, fez história na política.

Quando ela nasceu, em 1949, as pessoas LGBTQIA+ ainda estavam na Classificação de Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID). Esse estigma em relação à sexualidade e gênero impactaram na vida de Kátia, que só estudou até a terceira série do ensino fundamental. Seu pai a tirou do convívio social e só permitiu  que ela saísse de casa quando completasse 18 anos. Sobre esse período de sua adolescência, Kátia conta que seu pai “desconfiava” dela, pelos “trejeitos” que ela apresentava, então a tirou da escola, a colocou para estudar com um professor particular dentro de casa até o quinto ano enquanto ajudava cuidando das galinhas, bodes e gados da propriedade da família.

Trajetória política de Kátia

Durante esse período de exclusão, a vaqueira se aproximou de sua mãe, Ceci do Carmo Tapety, sua inspiração para seguir carreira política. “Minha mãe era uma pessoa muito boa, ajudava todo mundo, ela tinha um projeto social aqui”, conta Kátia, referindo-se à Colônia do Piauí. Foi assim, ajudando sua mãe a conseguir consultas médicas para as crianças, receitas para quem precisava e até fazendo partos, que Kátia criou paixão pelas pessoas. “Eu peguei a mania dela”, sobre a sua mãe já falecida.

Através do chamado trabalho de base, Kátia foi conquistando as pessoas e os olhares dos políticos locais. Quando a Colônia do Piauí virou uma cidade, o prefeito da cidade de Oeiras na época, Dr. Marcos Santana (MDB), disse que lançaria a travesti à vereadora, candidatura que não foi fácil. Durante todo o processo eleitoral aconteceram muitas cenas de preconceitos contra Kátia.

Kátia Tapety foi eleita em 1992 pelo PFL, como vereadora, se tornando a primeira travesti a ocupar um cargo público no Brasil e foi a mais votada, como orgulhosamente ressalta – e seguiu assim nos anos de 1996 e 2000. Antes do seu segundo mandato, Kátia apareceu no programa do apresentador Jô Soares em 1995, na entrevista ela conta sobre sua vida, sua carreira na política e o respeito e admiração que a população tem por ela, mesmo que essa seja uma das entrevistas mais importantes que a política já deu, segundo ela mesma, é evidente o quão a mídia não se preocupava em respeitar a sua identidade de gênero. Muitas das perguntas focaram na transição de gênero de Kátia, e seu nome morto, ou seja o nome atribuído no nascimento, mas que não representa a verdadeira identidade dela.

Em 2002, Kátia realizou outro feito histórico: ela se tornou a primeira travesti a ser presidente da Câmara Municipal e foi vice-prefeita pelo PPS na chapa Lúcia de Moura Sá em 2004. Ela conta que foi neste momento que sabia que tinha aberto portas que nunca mais seriam fechadas para as pessoas trans dentro da política.

Foi tema de vários documentários, sendo o de maior relevância “Kátia”, produzido pela professora Karla Holanda. Uma das cenas que mais me chama atenção acontece logo nos primeiros minutos do documentário. Kátia caminha por uma estrada, quando um carroceiro passa com seu cavalo e grita “Olha a vereadora do povo!”.

Kátia me conta que é a mais velha dentro da Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), que passou por momentos delicados nestes últimos meses, que contraiu uma pneumonia e ficou internada, mas que essa rede nunca a deixou desamparada. Foram várias visitas, ajudas financeiras e pessoas ilustres, como a ministra da Igualdade Racial, Aniele Franco e Marina Silva Ministra do Meio Ambiente, e sua amiga Jovanna Baby, que mandaram mensagens desejando forças e celebraram a sua recuperação.

Na cultura trans é costume falar sobre traviarcado, sim, muito semelhante com o matriarcado, é uma forma de organização social e histórica que busca dar notoriedade e destaque para aquelas que são importantes para luta da população trans. Kátia compõe o traviarcado brasileiro, ela é  uma lenda viva a representação  da democracia brasileira.

(Créditos autorais: https://www.terra.com.br/nos/opiniao/antra – NÓS/ OPINIÃO/ por Sanara Santos – 18 ago 2023)

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