Philip K. Dick, autor de ficção científica norte-americano

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Philip K. Dick (Foto: Divulgação)

Philip K. Dick (Foto: Divulgação)

 

Philip K. Dick (Chicago, Illinois, 16 de dezembro de 1928 – Santa Ana, Califórnia, 2 de março de 1982), autor de ficção científica norte-americano.

O autor Philip Kindred Dick, formado em filosofia pela Universidade da Califórnia, amargou certo ressentimento pelo menosprezo dos editores que se recusaram a publicar suas obras nos anos 1950. Dick teve de recorrer a revistas populares como Planet Stories para editar seus contos, dedicando-se à ficção científica por considerar o gênero perfeito para especulações filosóficas.

De 1955, ano de seu primeiro livro, até 1982, Dick publicou 44 romances e 121 contos, uma média de um romance a cada sete meses e um conto a cada 81 dias, sem parar, por 27 anos. O ritmo visivelmente frenético foi mantido à base de muita anfetamina – apesar dos boatos que sempre circularam à sua volta, Dick passou mais ou menos batido pelo LSD, a droga da moda na sua época, tendo apenas uma ‘bad trip’ em toda sua vida (e outro boato divertido é que a “revelação” religiosa que lhe ocorreu mais tarde seria um flashback dessa única viagem). Outros livros de sua autoria ainda seriam publicados postumamente.

A batalha interna que Dick travou com a ficção científica, um gênero que ele dominou como poucos, mas que lhe trouxe reconhecimento amplo apenas após sua morte, e a batalha que travou consigo mesmo no terreno teológico – ele foi durante a maior parte de sua vida adulta um católico convertido.

A dificuldade que o escritor sentia em ficar sozinho: foram cinco casamentos, um período de alguns meses em que sua casa se transformou num ponto de uso e tráfico de drogas, uma temporada voluntária numa clínica de reabilitação e até um par de semanas no apartamento de um casal de desconhecidos no Canadá. A mistura entre drogas sintéticas e paranoia latente fizeram de Dick um sujeito complicado, para dizer o mínimo.

A relação de Dick com uma de suas mulheres: “Ela o desprezava dizendo-lhe que era um miserável, mas ela precisava de um miserável para desprezar, enquanto ele sentia uma volúpia sinistra ao dar-lhe razão, portando-se como um miserável. Dedicara a ela O Homem do Castelo Alto, como prometido, mas ela empalideceu ao descobrir os termos da dedicatória: ‘Para Anne, minha mulher, de quem sem o silêncio eu não teria escrito esse livro’. Uma pequena obra-prima da grosseria, golpe baixo de um Untermensch…”

Ainda pouco conhecido como escritor no Brasil, mas popular entre cinéfilos por filmes baseados em seus livros.

O mais popular deles, Blade Runner (1982), foi baseado no romance Do Androids Dream of Electric Sheep? (1966), publicado no Brasil com o título “O Caçador de Androides”.

 

Blade Runner - o Caçador de Andróides (Foto: Um Historiador/Divulgação)

Blade Runner – o Caçador de Andróides (Foto: Um Historiador/Divulgação)

 

Desde que topou com uma estranha mulher de cabelos negros batendo à porta de sua casa, em 1974, o autor passou a afirmar que tudo o que vemos não passa de projeção de um mundo paralelo. O livro Realidades Adaptadas, que chega ao mercado com sete dos seus oito contos transformados em filmes (inclusive O Vingador do Futuro), tem histórias que insinuam ser essa não apenas a crença de alguém diagnosticado como esquizofrênico, mas de um panenteísta empenhado em provar que suas visões do futuro lhe foram reveladas pela divindade criadora do universo.

A coletânea de contos inaugura uma série de cinco livros do autor que a Editora Aleph coloca no mercado com novo visual. Depois de “Realidades Adaptadas”, chega às livrarias, Fluam, Minhas Lágrimas, Disse o Policial, seguido, em 2013, por “O Homem do Castelo Alto” (1962), “Os Três Estigmas de Palmer Eldritch” (1965) e “Ubik” (1969). Todas as capas trazem os títulos aplicados em adesivos, podendo ser substituídos por novo layout, disponível num marcador encartado em cada volume. O projeto é de Pedro Inoue, diretor de criação da revista ativista canadense Adbusters, que se opõe ao capitalismo.

Os relançamentos aqui acontecem no momento em que os livros de Philip K. Dick, traduzidos em 25 línguas, começam a ser adotados no currículo das universidades americanas. Embora dispense a legitimação da comunidade acadêmica.

Foi assim que seu primeiro livro publicado, Solar Lottery (Loteria Solar, 1955), nasceu como uma distopia sobre o mundo futuro, mais precisamente, o século 23, quando a democracia se torna página virada na história da humanidade e as funções dos terráqueos são definidas por um sistema lotérico viciado. Dick, que tinha simpatia pelo comunismo – chegou a ser investigado e interrogado pelo FBI -, explorou em suas obras não só uma temática relacionada à percepção extrassensorial como ao jogo político entre as superpotências. Ele imaginou, por exemplo, como seria o mundo se a Alemanha e o Japão tivessem derrotado os países aliados na 2.ª Guerra Mundial, tema do livro responsável pelo seu reconhecimento nos EUA, o premiado “O Homem do Castelo Alto”, de 1962, cujos direitos também foram vendidos para o cinema, assim como os de Ubik.

A influência do autor, que se autodenominava um filósofo ficcionista, cresce a cada dia. Pensadores como o francês Jean Baudrillard e o esloveno Slavoj Zizek reconhecem sua genialidade. Autores como o japonês Haruki Murakami e o chileno Roberto Bolaño (1953-2003) foram inspirados por alguns dos seus 121 contos e 44 romances, publicados num espaço de 27 anos. Cineastas como Ridley Scott e David Cronenberg o veneram, a ponto do último ter feito Gêmeos – Mórbida Semelhança, que lembra, ainda que superficialmente, a estranha ligação de Dick com sua irmã gêmea Jane, que morreu seis meses após seu nascimento. O escritor sentia-se atado a ela de forma espiritual, mas patológica, como no filme. Ao morrer, suas cinzas foram depositadas no túmulo da irmã.

A inspiração de Dick vinha dos mortos. E chegava à noite. Ele dizia ouvir vozes, mas nunca assumiu isso em entrevistas, com medo do ridículo. Quando alguém lhe perguntava a origem das histórias, simplesmente respondia: “Não sei”. Considerava mais seguro desconversar, já que sua esquizofrenia era assunto público. O episódio da mulher de cabelos negros que bateu à porta de Dick no dia 20 de fevereiro de 1974 também era considerado pelo escritor como uma manifestação teofânica. Ela portava uma gargantilha de ouro com o desenho de um peixe, símbolo das primeiras comunidades cristãs. Desde então, ele começou a ver um raio cor-de-rosa sempre que tinha uma premonição (como a doença de um de seus três filhos).

Entre fevereiro e março de 1974, Dick jurou ter visto várias vezes a imagem de Jesus. Talvez fosse o desejo de uma vida menos ordinária que movesse suas alucinações, atribuídas ao uso de drogas e psicotrópicos, mas intriga o fato de o autor ter escrito Fluam, Minhas Lágrimas, Disse o Policial sem ter lido os Atos dos Apóstolos. O romance reconta um episódio encontrado no livro bíblico. Antes de colocar as palavras no papel, Dick, formado na fé episcopal, contou o epílogo ao pároco de sua comunidade, em que Felix Buchman encontra um negro na estrada. O religioso ficou arrepiado ao ouvir em detalhes a mesma história contada pelo profeta Elias.

A religiosidade do escritor era idiossincrática, marcada pelo gnosticismo, o taoismo e o confucionismo. No entanto, ele acreditava ser um cristão do século 1.º, cujos pensamentos era capaz de ler enquanto dormia. O conto Lembramos para Você a Preço de Atacado, que abre Realidades Paralelas e serviu de inspiração para O Vingador do Futuro, começa exatamente com um homem comum – todos o são nos livros de Dick, que não elege super-heróis – sonhando com uma viagem a Marte. Ele acorda e não está lá, mas diz à mulher que não vai morrer sem conhecer o planeta vermelho – e o faz, por meio da memória de um viajante (que é um agente interplanetário) implantada em seu cérebro. Quail, o personagem, só acorda para descobrir que perdeu a identidade, sendo incapaz de diferenciar a fantasia do mundo concreto. A esfacelada natureza do real era seu tema. Tudo, para Dick, era uma questão de percepção do real, o que, no seu caso, significava ver o mundo de forma mística.

Tanto em Os Três Estigmas de Palmer Eldritch como em Ubik, a religiosidade está presente. No primeiro, sobre a colonização do sistema solar no século 21, uma droga provoca alucinação coletiva – estado alterado que permite sonhar com uma vida extraordinária. Em, Ubik (spray usado como representação metafórica de Deus), a dissolução da realidade numa sociedade futurista vem na forma de mensagens concretas de um morto transmitidas por meio de maços de cigarro e moedas. Simplesmente arrebatador.

(Fonte:http://infograficos.estadao.com.br/especiais – ESPECIAIS / POR GUILHERME SOBOTA E  ANTONIO GONÇALVES FILHO – O HOMEM DUPLO: VIDA E OBRA DE PHILIP K. DICK/ Por EMMANUEL CARRÈRE – 10/09/2016)

(Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer – CULTURA/ Por Antonio Gonçalves Filho – O Estado de S. Paulo – 17 de agosto de 2012 – REALIDADES ADAPTADAS/Autor: Philip K. Dick/Tradução: Ludimila Hashimoto – Editora: Aleph)

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