José Luiz Benicio, um dos maiores desenhistas de cartazes de pornochanchada do país.

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José Luiz Benicio, um dos maiores desenhistas de cartazes de pornochanchada do país

Benício, um dos maiores desenhistas de cartazes de pornochanda do país, pinta suas musas e guarda seu acervo de referências em ateliê no Leblon.

José Luiz Benicio criou imagens exclusivas para o ELA

José Luiz Benicio (Foto: Os Trapalhões/GilTokio)

José Luiz Benicio (Foto: Os Trapalhões/GilTokio)

A primeira pessoa com quem o gaúcho José Luiz Benicio esbarrou ao chegar ao Rio, com 16 anos e uma bolsa de estudos para aprender piano no Conservatório Brasileiro de Música, foi a desinibida Luz del Fuego.

Da carreira de músico, que estudou até onde deu e chegou a tocar profissionalmente, pouco sobrou. Até o piano de cauda, que dois anos atrás ficava em sua casa no Alto Leblon, foi vendido (“Mas antes ele animou muita festa aqui”). A ilustração realista, técnica que aprendeu sozinho e desde menino praticava, passou a ser a sua ocupação principal quando, às vésperas dos 20 anos, ele conseguiu uma vaga na Rio Gráfica Editora, que imprimia fotonovelas, primeiro como assistente e depois como desenhista principal. Foi o começo do Benicio, o homem que desenhava as mulheres.

— Foi lá que me profissionalizei. Eu completava os desenhos dos quadrinhos que eram cortados quando faziam as adaptações das falas. Até que passei a assinar capas — explica ele, que em seguida foi trabalhar em agências de publicidade. — Fiz trabalhos muito variados, mas os safadinhos foram os que marcaram.
Foi na década de 70 que Benicio fez fama. Tinha fila de pedidos para cartazes de filmes. Havia dias em que desenhava até três telas. Seu traço preciso, que rabiscava desenhos que ficavam entre um kitsch ultracool e os catecismos de Zéfiro (“Mas nunca fiz pornografia como ele, minha referência é o americano Norman Rockwell”), estamparam mais de 300 cartazes para o cinema brasileiro, a maioria feita para a Pornochanchada. Ele criou imagens para títulos como “Tem piranha no garimpo”, “Eu dou o que elas gostam”, “Cada um dá o que tem” e “Eu faço… elas sentem”, para citar os mais quentes, e “Dona Flor e seus dois maridos”, “O beijo no asfalto”, “Independência ou morte” e “A super fêmea” (que ajudou a montar o mito Vera Fischer, com a sua imagem nua e os cabelos esvoaçantes) para falar dos mais comportados.

— As mulheres adoravam: eu tirava as celulites — lembra ele, achando graça por ser uma espécie de Photoshop da época.
Em 60 anos de carreira, só ouviu uma reclamação. Foi de Renata Sorrah, que pensou em processá-lo (a Justiça considerou que o caso não merecia nem ir a julgamento) por causa das pernas e barriga de fora no cartaz de “Lua de mel e amendoim”. Hoje, ela ri, e diz que gostaria de ter um pôster do filme considerado cult.
Por ilustrar frequentemente musas com pouca, ou nenhuma roupa, tinha fama de pegador, mas não era bem assim.
— Pensavam que meu estúdio era uma orgia, que eu era um tremendo devassa, mas nenhuma delas posou para mim. Eu as conhecia pelos retratos, e só — avisa Benicio, 78 anos, que foi casado a vida toda com a mesma mulher e teve quatro filhos. — Os dois meninos viraram diretores de arte, acho que inspirei a escolha.
Nada de magrelas
Junto com a fama no cinema, ele fazia história nas bancas com a espiã Brigitte Montfort, escrita pelo espanhol Lou Carrigan e lançada pela Editora Monterrey. A morena exuberante, sempre de transparências, biquínis ou só um paninho, deixou muita gente apaixonada.
— Me inspirava na Maria de Fátima Priolli. Nunca vi mulher mais linda. Às vezes, a Brigitte não estava parecida, estava igual à Fátima. Nunca a encontrei para contar isso. Para dizer a verdade, caso a encontrasse, provavelmente ficaria tímido e não falaria nada. Mas ela devia perceber, era descarado — diz ele, que tem um armário lotado de recortes e fotos e não recorre ao Google em suas pesquisas. — Quando busco por “mulher pelada” ou “mulher de biquíni” só encontro fotos que não me servem. Gosto de imagens sensuais e não vulgares.
Ainda na ativa mesmo depois de um AVC que lhe tirou parte do comando da mão direita, Benicio produz em um ritmo mais leve.
— Seleciono muito, preciso me poupar — admite.
Este ano, ele assinou alguns desenhos, o mais recente é a pin-up morena e de olhos verdes enrolada em uma estola de vison preta, feita especialmente para o ELA.
— Quis fazer uma mulher sexy e linda, digna dos leitores — explica.
Recentemente, lançou uma coleção de cadernos para a Cícero Papelaria, e desenhou duas capas: a do livro “Monica(s)”, em que 150 artistas, entre eles o americano Will Eisner, retratam a personagem infantil de Mauricio de Sousa, e a da coletânea “A comédia mundana: três novelas policiais sacanas”, de Luiz Biajoni. Versatilidade total.
Suas musas continuam voluptuosas, curvilíneas, apesar do atual padrão de corpo. Ele não consegue entender bem o sucesso das modelos magrelas.
— A mulher de hoje está muito seca. A Gisele Bündchen tem peito, não é uma modelo reta, por isso o sucesso. A Luana Piovani poderia ser listada como uma musa atual. Ela tem presença, como as de tempos atrás — analisa ele, que sempre pesquisou a cena fashion para desenhar. — Sou atento ao que se usa. Na maquiagem, nas joias, nos cortes e no gestual. Recortava imagens da revista “Manchete”, que tinha mulher pelada, mas de bom gosto; da “Cruzeiro”, para saber como estava o estilo cafonão; e algumas gringas, como “Vogue” e “Good Housekeeping”. Minhas mulheres são sempre chiques.

 

Outra característica das musas atuais é o cabelo preto.
— Eu vejo beleza em todas, mas o cabelo preto, confesso, é mais fácil de pintar. Com a mão mais cansada, sou obrigado a preferir as morenas — faz piada.
Os homens também passaram por seus pincéis. Fez o logotipo da Catuaba Selvagem (“Um cara meio Conan”), o espião Patrick (“Me inspirei em Alain Delon”), os cartazes dos filmes dos Trapalhões (“Dedé era o que mais se importava com a aparência”), filmes com Ney Latorraca e Antonio Fagundes, além de capas de disco, como a de “Amar para viver, ou morrer de amor”, de Erasmo Carlos, de 1982, que foi plagiada quase 30 anos depois pelo MC alemão Morlockk Dilemma (“Estava descarada, apenas trocaram o rosto, nem as pulseiras de Erasmo tiraram”).
— Fiz muita coisa séria, mas o que eu gosto mesmo de desenhar é mulher bonita — garante, dando uma risadinha.

(Fonte: http://ela.oglobo.globo.com/vida/design – VIDA – DESIGN/ Por LÍVIA BREVES – 25 de janeiro de 2014)

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