Pedro Ludovico Teixeira, médico, político, encabeçou a mais poderosa dinastia política do seu Estado

0
Powered by Rock Convert

Um patriarca atento aos tempos novos

Pedro Ludovico Teixeira (Goiás, 23 de outubro de 1891 – Goiânia, 16 de agosto de 1979), médico e político, encabeçou a mais poderosa dinastia política do seu Estado. Ele deitou as raízes de seu poder em Goiânia, cidade que mandou construir em 1934 para substituir a antiga capital, Goiás Velho, símbolo da hegemonia dos políticos do norte goiano – capitaneado pelo clã dos Caiado, típicos caciques da República Velha. O último dos grandes patriarcas da política brasileira gerados pelo getulismo. Desde 1930, quando o vitorioso Vargas o nomeou interventor de Goiás, até 1969, quando o AI-5 lhe ceifou o terceiro mandato de senador (os dois primeiros pelo PSD, o último pelo MDB). Nasceu na Cidade de Goiás, em 23 de outubro de 1891. Formado pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro (1915). Um dos líderes da Revolução de 1930, em Goiás, interventor federal no estado (1930-1933) e governador de 1935 a 1937.

A diferença entre Ludovico e os oligarcas que o antecederam é que ele ficou no lado ganhador das transformações sociais que viriam na esteira da Revolução de 1930. Além disso, o “doutor Pedro”, como todos o chamavam em Goiás, apoiava ideias como a extensão do direito de voto aos analfabetos. Com tais estandartes e sua enorme influência, ele se fez suceder no governo do Estado, em 1961, pelo filho Mauro Borges Teixeira – que seria destituído do cargo pela Revolução de 1964. Mesmo depois da própria cassação, Ludovico manteve intato seu cacife na política goiana: na eleição de 1978, outro filho seu, Paulo Borges Teixeira, ganhou um lugar na Câmara dos Deputados, e seu neto Mauro Borges Júnior, filho do ex-governador, elegeu-se para a Assembleia Legislativa. Embora se considerasse “aposentado” politicamente, acompanhou até o fim as questões nacionais.

Em sua última entrevista, em julho de 1979, falou a favor da abertura democrática e classificou o presidente Figueiredo de “muito hábil e sensato”. Ludovico morreu no dia 16 de agosto de 1979, aos 87 anos, dois meses antes de completar 88 anos, do coração, em Goiás.
(Fonte: Veja, 22 de agosto, 1979 -– Edição 572 -– MEMÓRIA – Pág; 38)

 

 

 

Casos de família
Desde que se lançou na política no interior de Goiás há cinquenta anos, o ex-senador Pedro Ludovico Teixeira viveu aventuras tão intensas quanto as revoluções de 1930, que ajudou a fazer, e de 1932, que ajudou a combater.
Fundou uma dinastia política e direta ou indiretamente governou seu Estado por 35 anos, além de compartilhar da copa e cozinha da longa ditadura Vargas. Ludovico só deixou o Senado e a bandeira do PSD em 1969, cassado pelo Ato Institucional n.º 5.

Nos idos de 1926, a recusa do “coronel” Antônio Ramos Caiado em permitir sua candidatura a deputado federal levou o jovem médico Pedro Ludovico à oposição e ao início da longa rixa política. “Os abusos eram tão grandes, havia tantos absurdos, que acabei resolvendo fazer política para melhorar a situação do povo”, disse. Entre retratos antigos, onde aparecem Getúlio Vargas e o próprio Ludovico assinando o decreto da mudança da capital do Estado quando interventor, há um diploma da Assembleia Legislativa dedicado ao “varão de rara estirpe, padrão de honradez e dignidade”.

Seu padrão de honradez e dignidade Pedro Ludovico o construiu em episódios que gosta de descrever minuciosamente. Em 1930, de rebelde prisioneiro passou a vitorioso quando o governador Mário Caiado fugiu e “com um revólver e cinquenta balas” tomou o prédio dos Correios, telegrafando em busca de reforços. Dois anos depois, haveria de cair definitivamente nas boas graças de Vargas ao organizar batalhões voluntários para combater os paulistas.

Construindo o farol – No entanto, nem o início de sua carreira nem os vinte anos que passou no Congresso, no Rio de Janeiro e em Brasília, depois da redemocratização de 1946, entusiasmou tanto o velho cacique quanto o que considera sua obra dileta: a transferência da capital de Goiás para Goiânia, em 1937. Alguns viram na época uma hábil manobra para liquidar com o poder dos Caiado, encastelados em Goiás Velho. Foi morar na terceira construção da cidade, desde 1938, – “Eu precisava dar o exemplo” -, Ludovico justifica: “Goiânia foi o farol de Goiás”. Com a luz de Goiânia e a do poder dinástico, o reinado só começou a se extinguir em 1964, quando Mauro Borges Teixeira, filho e herdeiro de Ludovico, governador do Estado, foi cassado.

O ex-senador Pedro Ludovico lançou no início de junho de 1973, aos 81 anos em Goiânia o livro “Memórias”. Contudo, quem procurou revelações e surpresas sobre a política nacional no livro, ficou decepcionado. Como quase todos os memorialistas brasileiros vivos, ele conta o menos possível dos bastidores dos grandes dramas do país, mas justificou: “Eu poderia ter dito coisas muito sérias, mas preferi deixá-las para um segundo livro que só será publicado depois que eu morrer”.

Por enquanto, o velho Ludovico, atualmente dedicado cultor de uma sóbria elegância e desvaleza polidez, ofereceu aos seus correligionários do interior e demais interessados simples fatos da vida política provinciana: seu nascimento, crônica de sua vida e a disputa histórica com o clã dos Caiado.

(Fonte: Veja, 27 de junho, 1973 –- Edição 251 –- MEMÓRIA – Pág; 30)

 

 

 

 

AS FAMÍLIAS DE GOIÁS

Em 1749, quando o capitão-mor Bartolomeu Bueno da Silva, um bandeirante conhecido pelos índios como Anhanguera, instalou no povoado de Vila Boa a sede da capitania de Goiás, ocorreu o primeiro caso de nepotismo na política da região:  Anhanguera, o Diabo do Fogo, nomeou os três genros para importantes funções administrativas. E nos 223 anos seguintes Goiás continuou sendo governada por sobrenomes. No Império houve os Bulhões Jardim. Na República Velha chegaram os Caiados, que caíram com a Revolução de 1930 e ressurgiram depois da de 1964, enquanto os Ludovicos, velhos protegidos do getulismo, baixavam aos infernos por falta de direitos políticos.

Para muitos goianos, o poder dos Caiados ou a força dos Ludovicos são fenômenos que se relacionaram diretamente com fatores divinos. Contudo, fora das fronteiras do Estado, de tempos em tempos essa situação serviu como argumento para insatisfeitos em geral.

E como os bandeirantes tem uma fraqueza pelos genros, na década de 20, quando o jovem médico Pedro Ludovico pretendeu se candidatar a deputado, o todo poderoso Antônio Ramos Caiado, ou Toto, irritou-se: “Esse doutorzinho candidato? Nunca. O candidato é meu genro”, e mandou modificar a ata tão falsa quanto a República em que vivia.

Por essas e outras, quando a Revolução de 1930 chegou a Goiás, todos os Caiados perderam as cadeiras. Por coincidência e graças às suas habilidades, o doutorzinho Ludovico começou seu governo em nome da democracia. Arrigementou coronéis, praticou violências e nomeou parentes. Seu filho, Mauro Borges, foi eleito governador em 1962. Belarmino Cruvinel, seu concunhado, assumiu a presidência da Caixa Econômica e Oriovaldo Borges, seu cunhado, presidiu o Banco do Estado.

Como não podia deixar de ser, os Ludovicos eram o PSD e os Caiados passaram a ser a UDN.

Em 1965, o governador Mauro Borges, que mais tarde foi comerciante em Brasília, foi cassado por ter ligações com o ex-governador gaúcho Leonel Brizola e seu pai ainda conseguiu resistir durante quatro anos. Quando o marechal Castello Branco mandou pressionar os convencionais do PSD contra um candidato de Ludovico ao governo do Estado, o velho cacique proclamou: “Convenção e votação é coisa de homem. Aqui o voto vai ser a descoberto.” E os coronéis tementes de sobrenomes ousaram derrotar as ordens de Brasília.

Apesar disso, sua vida política foi curta. Em 1969 o AI-5 cassou-o. Um ano depois, seu filho, Pedro Ludovico Teixeira, foi derrotado para o Senado por Emival Caiado. Em 1971, finalmente, veio o golpe supremo: Leonino Caiado, um técnico bem relacionado com o comando militar, subiu as escadarias do palácio das Esmeraldas. Apesar disso as duas famílias não se atacam.

Os Ludovicos sabem o que os Caiados levaram trinta anos para aprender: “As oligarquias nunca foram derrubadas. Elas sempre caem junto com o poder central”, ensina o escritor goiano Bernardo Ellis.

Mesmo assim, o problema central é a falta de ascensão de novas famílias ou pessoas “intelectualizadas”, pois o governador Leonino Caiado foi casado com uma sobrinha neta de Pedro Ludovico e ele mesmo reconheceu: “É a mesma massa do velho Pedro.”

(Fonte: Veja, 7 de Junho de 1972 – Edição 196 – AS FAMÍLIAS DE GOIÁS – Pág: 21/22)

Powered by Rock Convert
Share.