Oswaldo Goeldi, desenhista, ilustrador, gravador e professor brasileiro.

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Oswaldo Goeldi (Rio de Janeiro, 31 de outubro de 1895 – Rio de Janeiro, 16 de fevereiro de 1961), desenhista, ilustrador, gravador e professor brasileiro.

LINHA DO TEMPO

1895

Nascido no Rio de Janeiro em 1895, parte com a família para Belém do Pará onde permanece até os seis anos de idade. Seu pai, o eminente naturalista Emílio Goeldi desempenhou papel importante na formação dos estudos científicos sobre a fauna e a flora amazônicas. Esta infância embalada à sombra da exuberância do mundo tropical marcará sua atividade de ilustrador.

1901

O período amazônico se encerra com a viagem da família para a Suíça. Goeldi realizará os estudos básicos e secundários na Europa. Ainda adolescente começa a desenhar, porém, apenas após a morte do pai, em 1917, abandonará os estudos de engenharia na Escola Politécnica (Academiae Technicae Helvetiae), de Zurique passará a se dedicar integralmente à arte.

1914

Durante a Primeira Guerra Mundial, Goeldi é enviado como sentinela a uma fronteira da Suíça com a Áustria. Neste período mudialmente conturbado Goeldi ainda era um estudante de engenharia na Escola Politécnica de Zurique. Vigiando um distante posto suíço, estabelece comunicação com um soldado austríaco, Martin Wenger, que viria a se casar com sua irmã. Ao se mudar para o Brasil, a convite do próprio Goeldi, Wenger se tornaria um rival levando a família a repudiar e a expulsar o artista. A reviravolta familiar provocada pelo cunhado nunca seria superada.

1916

Ingressa na Escola de Artes e Ofícios (École des Arts et Métiers de Genève), em Genebra. Decepcionado, abandona-a também e dedica-se ao trabalho de ateliê com dois pintores, Serge Pahnke (1875-1950) e Henri van Muyden (1860-1936). Permanecendo um tempo curtíssimo sob a tutela dos dois artistas, resolve continuar seu trabalho artístico isoladamente, sempre desenhando muito, seguindo sua necessidade interior.

1917

Após a morte do seu pai abandona definitivamente os estudos de engenharia. Realiza sua primeira exposição, na Galeria Wyss, em Berna, evento que lhe propiciou o primeiro e definitivo contato com a obra de Alfred Kubin (1877-1959), que, a partir de 1911, participava com Franz Marc e Wassily Kandinsky, de uma exposição que circulou pela Europa – O Cavaleiro Azul (Der Blaue Reiter).

1919

Em 1919 Goeldi retorna ao Brasil pois, após a morte do patriarca Emílio Goeldi, a família não consegue recursos para mantê-lo na Europa. Inicialmente trabalha no Banco de Londres (London and River Plate Bank), como escriturário bancário. Inicia neste ano, humildemente, os primeiros trabalhos para a revista Paratodos, além das páginas dominicais de A Manhã . Dedica-se então, exclusivamente, à ilustração de periódicos e livros, fazendo desta atividade um meio de subsistência.

1920

A volta ao Brasil, gerou inúmeros conflitos tanto na esfera familiar quanto na crítica de arte, a qual não aprovou sua linguagem despojada. Depois da primeira exposição no Liceu de Artes e Ofícios do Rio de Janeiro, Goeldi recebeu o descaso da crítica à sua obra, fato que o abalou profundamente. As raízes estéticas estavam definitivamente vinculadas às fantásticas obras do grupo expressionista alemão e, naquele momento, o que predominava no Rio de Janeiro eram as manifestações artísticas centradas na Academia Imperial de Belas-Artes, com influências marcadamente neoclássicas.

1922

Após uma dramática decisão familiar Goeldi é enviado à Europa, sem destino, a bordo de um vapor de terceira classe, o Valdívia. No dia 25 de setembro, recebe uma mensagem transatlântica da poetisa Beatrix Reynal, amiga das rodas literárias no Rio de Janeiro. Goeldi, ao chegar em Dacar, recebe o dinheiro para retornar ao Brasil e, daí em diante, passará a morar com o casal que adotará como amigos de toda uma vida. Ao casal Beatrix e José Maria dos Reis Jr., deixou como herança toda a sua obra, matrizes, desenhos e gravuras, tornando-os herdeiros universais através de testamento público.

1924

Neste ano inicia-se na arte da gravação em madeira, por influência do amigo Ricardo Bampi, gravador que o introduz no conhecimento das goivas, madeiras e técnicas de impressão da xilogravura. Paralelamente ao exercício desta antiga arte, a pedido de Álvaro Moreyra (1888-1964), conhecido diretor da revista Paratodos, realiza ilustrações para o periódico O Malho. A longa trajetória de ilustrador lhe permitiu atingir um nível de comunicação mais amplo com o público.

1926

Exacerbado-se o conflito com o acanhado panorama artístico carioca, Goeldi, num distante 4 de agosto de 1926, sentindo-se em “pleno abandono”, resolveu enviar a Alfred Kubin um pedido de aprovação à sua obra.

“Caro senhor Kubin, queira ter a bondade de olhar os meus desenhos. […] A forte influência que o senhor exerce sobre mim, sem dúvida, se nota logo. […] Num momento crítico da minha vida foi o senhor que me deu forças.” O artista austríaco respondeu demonstrando entusiasmo e sentindo-se uma espécie de vizinho e parente na “estrutura primária da personalidade”, qualificou os trabalhos de tecnicamente magistrais.

1928

Em trecho do artigo “O Brasil que insiste em pintar”, do jornal paulista A Província, datado de 13 de setembro de 1928, o poeta Manuel Bandeira nos dá alguns esclarecimentos sobre a produção artística da época. Os antigos salões da Escola de Belas Artes, atual Museu Nacional de Belas Artes, se recobriam de telas selecionadas de maneira tolerante, que, apesar da participação oficial, não eram adquiridas posteriormente. O texto nos diz da má qualidade das obras, que Manuel Bandeira chama de “monótono realismo anedótico, sem emoção ou poesia”. Neste ano Goeldi recebe o convite para ilustrar Canaã, de Graça Aranha, considerada a primeira obra moderna da literatura brasileira. O romance denuncia as extorsões praticadas pelos poderosos, os preconceitos e o racismo da sociedade brasileira.

1929

Neste ano Goeldi viaja a São Paulo onde são publicados dois artigos extremamente positivos sobre sua obra, um de Mario de Andrade e outro de Geraldo Ferraz. Goeldi trabalhou durante um ano, lixando e polindo madeiras para imprimir artesanalmente o álbum 10 Xilogravuras em madeira. Consegue com a venda, dinheiro suficiente para realizar o sonho de conhecer o artista austríaco. Ainda neste ano realiza algumas xilos para O Mangue, de Benjamin Costallat livro que não chegou a ser publicado.

1930

Grandes amigos de juventude, Goeldi enviou, durante vários anos, cartas e provas de gravuras ao amigo. Esta que era a maior coleção do artista fora do país, foi adquirida por um brasileiro que a trouxe recentemente para o seu verdadeiro lar, o Rio de Janeiro. Preparando-se para realizar uma visita a Alfred Kubin, escreve a Hermann Kümmerly, antecipando os temas do esperado encontro: “Se tudo der certo vou embarcar, no dia 15 de abril, num transatlântico enorme (Cap Ancona) que vai me deixar na sua vizinhança. Vou poder te levar várias notícias dos jornais nacionais.”

1931

A visita a Hermann Kümmerly, na propriedade de Muri, afastou-o das discussões sobre o Modernismo no Rio de Janeiro, lançadas no Salão Revolucionário, de 31 por Lúcio Costa e Manuel Bandeira. No ano seguinte, Henrique Pongetti escreve uma crônica em Bazar, a 7 de outubro, a respeito do salão concebido por Lúcio Costa:
“O Salão de 1931 foi o último clarinar das forças revolucionárias na trincheira conquistada pelo Sr. Washington Luís. […] Como amostra da situação em que estamos em face das artes plásticas contemporâneas, o primeiro Salão revolucionário foi também o primeiro Salão digno de ser levado a sério em todo o nosso passado artístico.”

1932

Este período é de grande produtividade e experimentação. Goeldi dedica-se com profundidade à construção da sua conquista técnica e continua ilustrando jornais e revistas como meio de subsistência.
A gravura Bahiana é uma experiência de Goeldi, datada de 1932, aproximadamente. Através da utilização de tinta à base de água, numa impressão em duas cores e estudo das figuras em guache preto, o artista inicia aqui o que seria uma marca registrada do seu processo de gravador, a cópia trabalhada com um caráter de impressão sensível e irreprodutível.

1935

Cada vez mais Goeldi é convidado a ilustrar álbuns e livros. Neste ano produziu várias xilos para o álbum de Heckel Tavares (1896 – 1969, que compôs sua primeira música erudita André de Leão e o demônio de cabelo encarnado, poema sinfônico baseado no poema de Cassiano Ricardo (1895 – 1974), lançado com libreto ilustrado pelo gravador. Nessa época o músico continuava inspirando-se na música regional e produzindo no gênero erudito e editava suas obras por conta própria. Goeldi participou ativamente do projeto de Heckel Tavares, realizando as ilustrações e vinhetas para o álbum. O gravador interessava-se cada vez mais pela literatura modernista o que o levaria a produzir trabalhos voltados para os temas das lendas e mitos brasileiros.

1937

O livro Cobra Norato de Raul Bopp (1898 – 1984), com impressão semi-artesanal, é uma publicação de apenas 150 exemplares numerados com xilogravuras em cores. Raul Bopp retoma o tema do “brasilianismo” e das lendas amazônicas. O livro vem a público em 27 de agosto,de 1937, em edição coordenada pelo próprio artista. O autor encontra em Goeldi um ilustrador competente, interessado em passar ao leitor a poética do texto. É nesta época, depois de várias tentativas iniciadas em 1932, que Goeldi sistematiza a utilização de cores nas gravuras.

1938

Em carta a Kubin, datada 24 de dezembro de 1938, Goeldi escreve: “Também aqui os movimentos estão se fazendo valer e a gente se sente forçada a tomar posição a respeito.” O clima de tensão também exigia posicionamento diante do acirramento da II Guerra Mundial. Beatrix Reynal, se envolve diretamente no movimento da Resistência no Brasil, dilapidando seu patrimônio para ajudar os franceses na luta contra os nazistas. Em 1938 Goeldi participa do II Salão de Maio, em São Paulo, nele são expostas, pela primeira vez, obras surrealistas e abstratas, ao lado de artistas brasileiros como Volpi, Di Cavalcanti, Guignard, Cícero Dias, Flavio de Carvalho, Tarsila do Amaral e Victor Brecheret.

1941

É chamado por José Olympio para ilustrar os livros de Dostoiévski; Recordações da Casa dos Mortos, O idiota e Humilhados e Ofendidos. A produção das gravuras levará mais de dois anos de trabalhos diários. Múcio Leão solicita a Goeldi as ilustrações das páginas dominicais do suplemento literário Autores e Livros de A Manhã. No mesmo período dedica-se a ilustrar uma série sobre a guerra – As luzes se apagam, agitam-se os monstros. A II Guerra Mundial o obriga a buscar refúgio na Bahia, pois neste momento ocorriam perseguições aos alemães radicados no Brasil. Entre os anos de 1941 a 1944 sua obra percorre os Estados Unidos da América, integrando uma exposição itinerante da International Business Machine Corporation.

1942

A gravura de Goeldi, nesta data, já havia incorporado definitivamente a temática dos pescadores e da natureza, no entanto, os horrores da guerra, a violência e a morte inútil ainda acompanhavam as visões recriadas por sua sensibilidade. Totalmente adaptado à vida dos trópicos, seu trabalho como ilustrador no jornal A Manhã participava de uma linha editorial arrojada, coordenada por Múcio Leão. Goeldi dedicava grande parte do seu tempo a ilustrar jornais, livros e revistas além da quantidade de desenhos a carvão e nanquim que produzia incansavelmente no período. Seus trabalhos alcançavam um reconhecimento cada vez maior.

1944

São deste ano a série de xilogravuras Balada da Morte, publicadas na revista Clima, editada em São Paulo. Os desenhos e gravuras sobre a morte o tornam símbolo da consciência moderna desgarrada, afogada em angústia.
Neste mesmo período Goeldi produz diversas ilustrações para o livro de Manuel Villegas Lopes, Carlitos. Realiza exposição individual no Instituto dos Arquitetos do Brasil e participa de uma coletiva em Belo Horizonte. A José Olympio publica, com ilustrações suas, Humilhados e Ofendidos de Dostoiévski. Rachel de Queiroz, num elogio emocionado, afirma que apenas Goeldi poderia dar aos textos do autor russo, a sua verdadeira tessitura dramática.

1949

Em 22 de junho, Goeldi redige uma rápida autobiografia narrando de modo muito particular o seu ponto de vista sobre a arte que para ele significava sacrifício, disciplina e dedicação constantes. Essa sua frase expressa sua visão:
“Nunca sacrifiquei a qualquer modismo o meu próprio eu – caminhada dura, mas a única, que vale todos os sacrifícios.”

1950

Sua evolução artística atinge um reconhecimento cada vez maior da crítica de arte. Goeldi participa de várias exposições internacionais entre 1950 e 1960. São inúmeros os países que recebem exposições das suas gravuras e desenhos: Itália, Paris, Suíça, Uruguai, Equador, Argentina, Alemanha e Áustria, estão entre os principais. Como confirmação da sua importância como artista recebe Medalha de Ouro no II Salão Baiano de Belas Artes em Salvador.

1951

O seu esforço é totalmente reconhecido através do maior prêmio de gravura na I Bienal Internacional do Museu de Arte Moderna de São Paulo . Após vários anos de dedicação exclusiva à sua arte, a crítica finalmente reconhece o valor inovador dos seus trabalhos e o agracia com este importantíssimo prêmio.

1952

Goeldi participa de várias bienais internacionais, sendo que sua participação em Veneza aconteceu nas bienais de 1950, 1952, 1956 e 1958. Neste ano de 1952, o artista é convidado a expor seus trabalhos em Paris, na Associação Artística e Literária, participa de uma Bienal Internacional de xilogravura em Tóquio e expõe em Santiago do Chile. Goeldi torna-se professor de xilogravura na Escolinha de Arte do Brasil, uma iniciativa inovadora de Augusto Rodrigues.

1953

Em 1953 participa da II Bienal de São Paulo, com sala especial destinada para seus trabalhos. Nos próximos anos, com o crescente interesse por sua obra, Goeldi passa a trabalhar em formatos maiores, encomendando madeiras tropicais de extrema resistência e dureza, como é a peróba-rosa. Suas gravuras atingem um nível expressivo e técnico inquestionável. Goeldi dava preferência a madeiras resistentes, de superfície uniforme extraindo delas um preto denso e aveludado. Os contrastes da impressão eram sempre conseguidos através da manipulação do uso da colher de impressão. Goeldi expõe seguidamente no exterior, seja individualmente ou em coletivas.

1960

Goeldi recebe o I Prêmio Internacional de Gravura na II Bienal Interamericana do México, no Palácio de Belas Artes da Cidade do México. Este prêmio, ainda que tardio, deixou-o extremamente feliz pois chegou num momento em que o artista já estava gravemente doente e, mais ainda, porque veio de um país onde a xilogravura tem profunda importância cultural e política. A gravura mexicana é famosa por seu vínculo com o povo e suas lutas por liberdades e cidadania.
Goeldi grava duas xilogravuras para o livro Poranduba Amazonense, de João Barbosa Rodrigues (1842-1909), projeto que permanece inacabado. Este último grande projeto já o encontrou extremamente fragilizado, sem forças para dar continuidade ao trabalho de toda sua vida – a xilogravura.

1961

No dia 15 de fevereiro, numa quarta-feira de cinzas, Goeldi vem a falecer, no acanhado e pequeno ateliê que alugava no Leblon, à rua Dom Pedrito. “Como um legítimo herdeiro do romantismo alemão, Goeldi tinha o amor pelo mistério da noite, pelas ruas humildes, pelas casas velhas, pelos namorados tristes, pela tragédia da morte”.
Texto de Antonio Bento, extraído do catálogo da exposição Oswaldo Goeldi, no MAM/RJ, maio, 1961.

(Fonte: http://www.centrovirtualgoeldi.com)
(Fonte: Veja, 25 de fevereiro de 1976 – Edição 390 – ARTE – Pág; 100/101)

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