Liu Shao-chi, presidente da República chinesa que nunca se opôs frontalmente a Mao Tsé-tung.

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Liu Shao-chi (24 de novembro de 1898 – 12 de novembro de 1969), ex-chefe de Estado chinês, talvez o mais formidável adversário de Mao Tsé-tung. Foi militante do Partido Comunista Chinês (PCC). Liu Shao-chi, veterano agitador sindical e ativo participando da guerra civil, foi durante muito tempo um dos mais leais partidários de Mao entre as frações rivais do partido. Tanto Mao confiava em seu amigo que, em 1959, lhe passou seu posto de chefe de Estado. Sete anos depois, contudo, estavam em campos opostos – destituído do cargo, Liu tornou-se então uma das primeiras e mais denegridas vítimas da Revolução Cultural. Não se soube mais de seu paradeiro, embora se acredite que tenha morrido de doença em novembro de 1969.
(Fonte: Veja, 5 de março de 1980 – Edição n° 600 – ISRAEL/ Internacional – Pág; 37)

O GOSTO DO CAOS

Enquanto milhões de bustos de Mao Tsé-tung são espalhados por toda a China, Liu Shao-chi, o grande inimigo do caos no país, cai finalmente da Presidência

Liu Shao-chi foi um dos fundadores do Partido Comunista Chinês, veterano de todas as lutas dos comunistas e criador dos sindicatos operários.

Realistas frios – Presidente da República desde 1959, Vice-Presidente do PC e membro do Politburo do Comitê Central, Liu Shao-chi, foi também um teórico que nunca se opôs frontalmente a Mao Tsé-tung, mas que tem suas ideias próprias sobre o marxismo – ao contrário dos maoístas ortodoxos que se limitam a propagar os pensamentos de seu chefe. A originalidade de Liu – e seu pecado mortal – foi defender a amizade com a União Soviética, onde ele estudou na mocidade, e a necessidade de por a China em dia com a ciência moderna, preservando muitas das tradições chinesas e adaptando-as ao comunismo. Mao foi totalmente contrário a isso e considerou sua divergência com Liu como sendo do tipo “antagônico”, o que, na terminologia de qualquer acordo.

Entretanto, mesmo derrotando Liu, Mao soube que a própria China ainda era dirigida, em grande parte, por realistas frios, que pensam e agem como o Presidente agora deposto. Esses realistas conseguiram fazer com que a tropa de choque da revolução cultural – a Guarda Vermelha – recebesse ordens de debandar e, em muitos casos, fosse levada para um longo estágio em fábricas e estabelecimentos agrícolas. Em seu lugar, os elementos mais conservadores da China – paradoxalmente os operários e camponeses – foram elevados ao mais alto degrau da escada ideológica.

Desde 1966, Liu tem sofrido tamanha barragem de críticas e ataques pessoais, que a única surpresa de sua queda é que não tenha ocorrido há mais tempo – Liu sempre foi o Número Dois do PC até 1966 e o mais sério obstáculo de Mao Tsé-tung para a conquista do poder absoluto na China. Apontado como líder do grupo de “renegados” do Partido que queriam “restaurar o capitalismo na China”.

No balcão da antiga torre construída pelos imperadores da dinastia Ming há 350 anos, um homem idoso, com uma curiosa fisionomia de cera, assiste atentamente para baixo, observando o meio milhão de seus conterrâneos reunidos na imensa Praça da Paz Celestial, em Pequim. Em cadência alternada, sem cessar, sobe o trovejante refrão da multidão: “Longa vida ao Presidente Mao!” Naquela festa do 19.° aniversário da tomada do poder pelos comunistas na China, Mao Tsé-tung, 75 anos, Presidente do Partido Comunista Chinês, erguia a mão para agradecer às manifestações.
Um mar de manifestantes desfilava, em grupos de 140 pessoas, ladoa lado. Em certo momento das festividades, a atenção da multidão se desviou brevemente para a diminuta figura do Ministro da Defesa, Lin Piao, herdeiro aparente de Mao. “A conspiração contra-revolucionária faliu completamente”, disse Lin com sua voz estridente.”Nossa Grande Revolução Cultural Proletária alcançou enormes vitórias.”

Barragem de críticas – Foi um discurso pouco inspirado e, até certo ponto, inverídico. Quaisquer que sejam os elementos de julgamento à disposição dos entendidos em assuntos chineses, tudo indica que a revolução cultural foi mais um fracasso do que um êxito. Após os últimos três anos, desde que Mao lançou sua campanha para transformar a China numa sociedade de revolucionários abnegados, a revolução cultural parece destinada a repetir os pequenos resultados de outra experiência maoísta – o “Grande Salto para a Frente”, lançado em 1958 para dotar a China de base industrial e criar uma nova situação no campo, através de grandes fazendas coletivas denominadas “comunas populares”.

Talvez o único saldo positivo que Mao Tsé-tung apresentou nessa revolução cultural tenha sido a derrota definitiva de seu maior rival dentro da China: o Presidente Liu Shao-chi. No dia 15 de outubro, a Rádio Pequim, lendo editorial do jornal “Bandeira Vermelha”, disse que Liu tinha perdido todos os seus cargos no Partido e no Governo. Gosto pelo caos – Para um líder político ordinário, um revés como este equivale à desgraça final. Mas, quando se trata de Mao Tsé-tung, as condições ordinárias não contam. Ele é um líder que vive conforme suas próprias pregações. “Para construir algo de novo”, diz ele, “é preciso destruir primeiro o que é velho.” E, nos seus dezenove anos de poder, Mao tem sido um praticante meticuloso dessa política, um estadista-guerrilheiro que governa seu país arrastando-o violentamente para o seu lado. Por mais idealista que possa parecer esse gosto pelo caos, na realidade ele vem ocasionando à China grandes sofrimentos e muitos atrasos.

Durante anos, observadores estrangeiros acreditaram que, sob a direção dos novos mandarins comunistas, em pouco tempo a China se colocaria ao lado dos Estados Unidos e da URSS como uma das três potências mundiais. Sua economia havia crescido novamente após se recompor do caótico “grande salto” e, em 1965, crescia em ritmo apreciável. No campo da diplomacia, a China conseguira atrair considerável apoio no mundo comunista em sua luta mutuamente destrutiva com Moscou.

Salto para trás – A desorganização gerada pela revolução cultural pos tudo a perder. Nos últimos dezesseis meses, a China não fez nenhuma experiência nuclear, ao contrário das cinco bombas atômicas e uma de hidrogênio explodidas entre 1964 e junho de 1967. Sua produção industrial caiu de 15% só em 1967. Mas nada se compara ao verdadeiro “salto para trás” que a revolução cultural causou na estrutura política da China. Por meio de expurgos em massa, Mao conseguiu praticamente destruir o Partido Comunista, ao qual dedicou toda a sua vida. Dos 172 membros do Comitê Central desde 1965, restam apenas 34. Com exceção de sete, todos os outros catorze membros do Bureau Político caíram no ostracismo – inclusive Liu Shao-chi e o próprio Secretário-Geral do PC, Teng Hsiao-ping.

Mao quis destruir o Partido porque o achava tão hierárquico e burocrático, que se tornara incapaz de realizar sua missão revolucionária. Para substituí-lo, ele experimentou, inicialmente, criar governos locais segundo o modelo da Comuna de Paris, de 1871. Quando a iniciativa fracassou, ele ordenou a criação de Comitês Revolucionários – coalizações tríplices compostas de quadros leais do PC, militares do Exército e a Guarda Vermelha.

Estudantes parados – Também isto não funcionou como Mao desejaria. O Exército, o grupo mais coeso que ainda subsiste na China – e, como em todo o mundo, uma força inclinada ao conservadorismo -, logo tomou a frente desses Comitês. Por outro lado, os comunistas “leais” se revelaram apenas bons burocratas. Dos 29 Comitês Provinciais (dos quais 25 presididos por militares), 21 são dirigidos por elementos moderados e apenas oito são controlados por maoistas genuínos. Mais desanimador que isto, foi para Mao o seu relativo fracasso em remodelar a juventude chinesa à sua própria imagem. Um dos principais objetivos da revolução cultural era livrar a China do que Mao considerava como um sistema de educação muito “acadêmico”, enraizado no passado sob o domínio dos mandarins. Parece difícil admitir que Mao tenha adotado medidas sem pensar nas suas consequências negativas. A sua disposição de executá-las assim mesmo mostra que o velho dirigente não se interessou em começar o trabalho de construir uma sociedade nova e viável na China, para substituir a que ele havia destruído. Enquanto Mao Tsé-tung estiver vivo, será muito difícil que a imensa tarefa de transformar a China em grande Estado industrial moderno possa ser iniciada sériamente.

(Fonte: Veja, 23 de outubro de 1968 – Edição n° 7 – CHINA/ Internacional – Pág; 40/41)

Liu Shao-chi (24 de novembro de 1898 – 12 de novembro de 1969), político chinês, foi presidente da China, e assumiu o cargo em 27 de abril de 1959 e deixou em 31 de outubro de 1968. Mao Tsé-tung gostava de Deng, confiava em sua capacidade de cumprir missões complicadas e o usava ao sabor das intrigas políticas que fomentava, como fazia, de resto, com todo mundo. Deng ocupava a quarta posição mais importante na hierarquia comunista, atrás apenas do próprio Mao, do venerado Chu Enlai e de Liu Shao-chi, quando a desgraça despencou sobre ele – e sobre a China inteira. O nome da desgraça era Revolução Cultural, o movimento ultra-radical desencadeado por Mao contra a própria liderança do partido, utilizando como massa de manobra a juventude fanatizada.

(Fonte: Veja, 26 de fevereiro, 1997 – Edição n° 1484 – INTERNACIONAL/CHINA/ Por Izalco Sardenberg – Pág; 30/33)
(Fonte: www2.uol.com.br/historiaviva – edição 58 – por Rémi Kauffer – Agosto 2008)

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