José Antônio da Silva, foi pintor e escritor; considerado o maior naïf do Brasil.

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Pela vida, mordia-lhe a dor do desapreço e da incompreensão.

José Antônio da Silva (Sales de Oliveira (SP), 12 de março de 1909 -– São Paulo, 1996), foi pintor e escritor; considerado o maior naïf do Brasil. Seus feitos pessoais e como artista o revelaram antena de nossa cultura de raízes; é o rio-pretense mais famoso nas artes plásticas, no Brasil e no exterior. Criado na roça e filho de humildes meeiros, José Antônio chegou a Rio Preto bem jovem, a capinar em sítios e fazendas da região. Sua disposição para a arte o chamou para a cidade, em finais de 1930. Sem eira nem beira, foi alojado com a mulher e seis filhos descalços, nos fundos do Centro Espírita Allan Kardec de São José do Rio Preto. Realizava o serviço que aparecia, de carroceiro e pedreiro a guarda-noites de hotéis. Já famoso em São Paulo na década de 1950, e por indicação do governador Adhemar de Barros, lhe foi dado emprego na Prefeitura Municipal. Era o faxineiro da Biblioteca. Muito antes já havia criado uma pequena Galeria de Arte, em sua residência. Nem sabia o matuto da roça que estava criando o primeiro Museu de Arte na cidade que o acolhera.

Desde criança sentiu inclinação para o desenho. Rabiscava em superfícies improvisadas. Autodidata, corajoso, visionário e aventureiro, inventando os próprios meios, Silva barganhava pinturas por mantimentos, remédios e bugigangas; dava quadros em troca de receitas médicas. Semialfabetizado, e durante 10 anos, escreveu o Romance da Minha Vida, editado em 1949 pelo Museu de Arte Moderna de São Paulo. Publicou os versos de Sou Artista, Sou Poeta (1981) e três outras narrativas romanceadas: Maria Clara (1970, prefácio de Antônio Cândido), Alice (1971, adaptada em 1986 como a peça “Rosa de Cabriúna”, pelo Centro de Pesquisa Teatral do Sesc, direção de Márcia Medina, sob a supervisão de Antunes Filho) e Fazenda da Boa Esperança (1987).

Embora no decênio de 1940 fosse desconhecido em Rio Preto, merecendo apoio de uns poucos jornalistas e intelectuais, como Basileu Toledo França e Dinorath do Valle, Silva foi revelado em 1946, na exposição de inauguração da primeira Casa de Cultura, pelos críticos Lourival Gomes Machado, João Cruz Costa e Paulo Mendes de Almeida. Imbuídos estética e ideologicamente pelo Modernismo de 1922, aqueles intelectuais enxergaram no artista genuína expressão da cultura rural brasileira, mormente a caipira. José Antônio participou, em 1949, da Exposição de Pintura Paulista, no Ministério da Educação e Saúde da então capital federal. Expôs em 1950 no MAM – Museu de Arte Moderna de São Paulo. Em 1951 recebeu o Prêmio de Aquisição do MoMA – Museu de Arte Moderna de Nova York. No ano seguinte, foi selecionado para expor na XXVI Bienal de Veneza. Em 1953 participou da II Bienal de São Paulo; em 1954, foi premiado pela II Bienal Hispano-americana de Havana; em 1955, foi admirado na Exposição Internacional de Lissone, Milão. Em 1956, mencionado no “The Arts in Brazil”, de Pietro Maria Bardi, Milão; em 1960 foi referido no “Whos who in Latin América”, dicionário de personalidades notáveis editado por Wheeler Sammors de Chicago. Passaram-se muitos anos e conquistas. Em 1987, além da exposição coletiva Brèsil Arts Populaires Contemporain organizada pelo Ministério da Cultura e a Maison des Cultures du Monde da França, fez parte da Sala Especial Imaginários Singulares da XIX Bienal de São Paulo.

Em 1966, Silva criou o Museu Municipal de Arte Contemporânea de Rio Preto, que funcionava nos fundos da Biblioteca Municipal onde trabalhava. Ainda nesse ano, além de coletivas em Moscou e Paris, foi distinguido com “Sala Especial” na Bienal Internacional de Veneza, considerada por muitos como a mais importante do mundo. É citado em dicionários e enciclopédias nacionais e estrangeiras; referido e estudado em livros de história da arte. Há publicações sobre o artista no Brasil e no exterior, além de estudos universitários de alto nível. Acerca do artista foram realizados filme de cinema, reportagens em jornais e revistas, inúmeros programas de televisão e o CD-Rom “José Antônio da Silva”, produzido pela Associação dos Amigos da Pinacoteca e Prefeitura de São Paulo. O artista possui quadros em Galerias e Museus de várias partes do planeta. Na capital de São Paulo, faz parte do MASP, do MAM, do MAC, da Pinacoteca do Estado e do Museu de Arte Sacra.
Após a aposentadoria, José Antônio estabeleceu domicílio e atelier em São Paulo. O Museu de Arte Contemporânea foi fechado e as obras do acervo, assim como objetos históricos coletados e adquiridos pelo artista, ficaram abandonados, sujeitos ao calor e à umidade, às traças, ao fungo… ao esquecimento. Anos mais tarde, essa fortuna cultural foi doada pelo artista a Rio Preto e, em 1980, foi inaugurado o MAP – Museu de Arte Primitivista “José Antônio da Silva”. Em 1999, com a interdição do prédio, as telas de Silva foram depositadas no subsolo do Teatro Municipal, onde permaneceram até março de 2001.

Silva foi um Antônio; um José… tudo nome de gente simples, ordeira e cumpridora. Foi emblema político e gritante do sem-terra, do sem-teto, do sem-nada que venceu na vida. À moda dos artistas populares, e incorporando tardiamente um ardente romantismo, fez de sua existência, arte; de sua arte, vida. Era personagem de si mesmo, um rapdoso perdido em desejos. Materializou o mito do pertencimento à nação; nela, o caipirismo gritante em sua obra. Seu tino para a expressão crua da arte fez ecoar pelos quatro ventos as aspirações, devaneios, sentimentos e paixões que identificam a maioria esquecida e espezinhada do nosso país.

Seu primitivismo de cores desnorteantes – para os padrões refinados das “belas artes” – remoça arquétipos e símbolos elementares da existência coletiva. O artista parece encarnação da voz do povo, pronunciada no dialeto esquecido pelas elites integradas. Seja em pintura, literatura ou no que lhe indicasse a prodigiosa inspiração, Silva se expressava – como poetizaria Manuel Bandeira em “Evocação do Recife” – “na língua errada do povo, na língua certa do povo, pois ele é que fala gostoso o português do Brasil”. José Antônio, ingênuo em muitos aspectos, foi sujeito sabido, despachado, instintivo, descomedido, espontâneo e previdente; foi singelamente culto – no sentido mais refinado que se dá a essa palavra.

Em 12 de março de 2001, quando o artista completaria 92 anos, o MAP – Museu de Arte Primitivista “José Antônio da Silva” voltou a funcionar. Entre abril e junho foram restauradas 11 de suas telas a óleo, com o apoio cultural do SESC – Rio Preto. Em março de 2002, inaugura-se no MAP – Museu de Arte Primitivista “José Antônio da Silva” a exposição permanente Silva: Imagens e Meios, composta de 26 objetos fotográficos impregnados de óleo sobre tela, com forte influência da Pop Art norte-americana e outros movimentos experimentais de 1960 e 70.

Em abril de 2012, o MAP passou a funcionar no prédio da antiga Biblioteca Municipal, onde Silva trabalhou como faxineiro e onde criara o Museu de Arte Contemporânea de São José do Rio Preto. Materializa-se outra vez a utopia de Silva, acalentada desde moço, quando chegou em Rio Preto, de mala e cuia, desejos visionários, a tristeza encalacrada do caipira tradicional, e a semente quixotesca de melhores dias. Cores exuberantes de suas telas e desenhos refletem uma sesmaria rústica e remota, que deslanchou no Brasil de hoje.

(Fonte: Veja, 8 de setembro de 1976 – Edição 418 – ARTE/ Por Olívio Tavares de Araújo – Pág; 122/123)

(Fonte: Veja, 16 de dezembro de 1981 – Edição 693 – ARTE/ Por Casimiro Xavier de Mendonça – Pág: 143)

(Fonte: http://www.riopreto.sp.gov.br/PortalGOV – MAP – Museu de Arte Primitivista > José Antonio da Silva – Romildo Sant”Anna)

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