Edifício Martinelli, o primeiro arranha-céu de São Paulo

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Edifício Martinelli, o primeiro arranha-céu de São Paulo

Ela foi à paixão de Mário de Andrade, musa inspiradora de muitos compositores, objeto de devaneio de centenas de poetas. É amada e odiada por seus moradores. Um centro de lazer e um antro de estresse. O paraíso dos arquitetos em meio aos arranha-céus da cidade. A distração dos esportistas que fogem do concreto para dentro dos parques. O cinza rodeia o verde em um mundo de gente agitada, nervosa, mas cheia de vontade de viver. São Paulo é assim. Um desencontro de contrastes, uma combinação de cores que em nada se parecem.
A quarta maior metrópole do mundo faz aniversário. Dia 25 de janeiro, os paulistanos “vindos de todas as partes do Brasil” comemoram os 450 anos da cidade. Quatro séculos e meio de história. Quatro séculos e meio de muita mistura de raças. Mas, para ser paulistano, não basta nascer em São Paulo. Aliás, esta não é a característica principal. É preciso amar essa cidade. É preciso brigar por ela. É preciso se divertir dentro dela.
E, se a confusão da capital paulista incomoda alguns, vale lembrar que isto é uma questão praticamente histórica.

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Dizem que a cidade foi fundada no Pateo do Collegio. No entanto, isto não é um dado realmente comprovado. Há quem diga que São Paulo nasceu na Serra da Cantareira. Outros, dizem que até o ano de fundação está errado. São Paulo teria nascido em 1532 e não em 1554 e estaria completando 472 e não 450 anos. Outro ponto de desacordo é sobre quem fundou São Paulo. Oficialmente foram os jesuítas, mas alguns historiadores dão o mérito para o explorador Martim Afonso de Souza.
No entanto, seja lá quando isso realmente aconteceu e quem foi o autor da façanha, poucos apostavam que a antiga São Paulo de Piratininga, que esbanjava tranqüilidade, fosse se transformar em um caldeirão pronto para explodir a qualquer momento, séculos depois. São Paulo não pára. Se de dia o paulistano se acaba no trabalho, à noite ele vai curtir o que a cidade oferece de melhor: a programação cultural. Teatros, restaurantes, cinemas, shoppings, casas noturnas, bares… A infinidade de programas é de dar inveja a qualquer outro estado do País.
Historicamente, a cidade foi fundada durante uma missa celebrada pelo padre Manoel da Nóbrega, que oficializou a criação do colégio jesuíta, para catequizar os índios. Entre os jesuítas, estava José de Anchieta.

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Como São Paulo não possuía nenhuma riqueza natural que despertasse os interesses de Portugal, a cidade até então chamada Piratininga tornou-se rapidamente o principal local de partida do movimento das bandeiras. Bandeiras eram aquelas expedições lideradas pelos bandeirantes, que desbravavam novas rotas e caminhos pelo interior, em busca de pedras preciosas e escravos, mesmo que isso contrariasse os jesuítas.
A cidade de São Paulo, que até então não passava de uma vila, foi promovida à capitania de São Vicente em 1681 e reconhecida como cidade em 1711. Na época, São Paulo era chamada de cidade de barro, já que quase todas as casas da região eram feitas com esse material. E se a Serra do Mar dificultava as operações para encontrar riquezas, os bandeirantes resolviam o problema. Em uma das bandeiras que contava com a presença de Borba Gato (um dos bandeirantes mais conhecidos da história) descobriu-se ouro em Minas Gerais, no século 17.
Os homens partiram de São Paulo na corrida do ouro rumo a Minas Gerais. A cidade de barro ficou nas mãos das crianças, das mulheres e dos escravos. E até por volta do século 18, São Paulo limitava-se à região das igrejas de São Francisco, São Bento, e do Carmo, além das ruas Direita, Quinze de novembro (na época Imperatriz) e São Bento, formando o triângulo histórico.
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A economia da cidade estava estagnada, e a língua oficial era o tupi-guarani. O rio Tietê, por exemplo, levou esse nome porque Ty significa rio. Ete, verdadeiro, legítimo. O único rio que nasce, corre e deságua em território paulista. A ladeira Porto Geral, no centro, era um porto do Tietê. Por isso leva esse nome. Em 1822, Dom Pedro I proclamou a independência do Brasil e, só em 1830, São Paulo passaria de cidade de barro à cidade do café.
Ao contrário dos dias de hoje, as pessoas andavam muito a pé. Os rios Tamanduateí e Anhangabaú eram cruzados por barcos ou pontes de madeira. E do outro lado deles, ficava a fazenda do Morumbi, primeira a ter plantação de chá no País, ainda no século 19.
São Paulo mudou. Os fazendeiros se tornaram os barões do café. Deixaram o interior e vieram morar na capital. Foi criado o Jardim da Luz, o primeiro jardim público da cidade. O comércio se desenvolveu. Abriram livrarias, lojas de roupas com trajes da última moda na Europa. Foi aberto o mercado central. Surgiram os jornais, as editoras, os teatros.
São Paulo se desenvolvia rapidamente. A cidade de barro já não era mais a mesma. O café tinha atraído a atenção do mundo para cá. Enfim, construíram as primeiras ferrovias da cidade, para facilitar o acesso ao interior. A São Paulo Railway, em 1846, a Sorocabana, em 1871 e a famosa Central do Brasil, em 1875.
Com a expansão da economia, houve então a primeira explosão demográfica de São Paulo. O número de habitantes em 1876 era de 30 mil. Menos de 20 anos depois, em 1895, a cidade já somava 130 mil moradores. E não parou por aí. Em 1905, já éramos cerca de 300 mil.
São Paulo começou a ganhar formas. Do barro ao concreto. Em 1892, ganhamos o Viaduto do Chá. Naquela época, havia três pedágios por ali. Construído entre 1878 e 1892, muitos achavam que deveria se chamar Viaduto do Café. Isto porque tal obra foi feita em uma região que tinha muitas plantações do produto, além do chá. A obra ligava o Centro ao bairro de Higienópolis e à chiquérrima avenida Paulista, aberta em 1891. Era lá que se concentrava a maioria dos casarões dos barões de café.
O século 20 deu o ar de sua graça e ganhamos de presente a Estação da Luz e o Theatro Municipal, com estilo renascentista. E foi nessa época que o paulistano conheceu o primeiro congestionamento de sua história. Cerca de 300 carros pararam enfileirados para prestigiar o primeiro espetáculo a ser exibido no Theatro Municipal. Inaugurado em 11 de setembro de 1911, o Teatro foi projetado pelo arquiteto Ramos de Azevedo, nome que leva a praça em que está localizado o casarão. O estilo interno da arquitetura foi inspirado nos teatros europeus do começo do século XX.
A primeira grande guerra estourou e a indústria têxtil paulistana ganhou seu espaço no mercado internacional. A cidade deu início à dívida externa com a construção do Viaduto Santa Ifigênia. A obra foi realizada graças a um empréstimo feito junto à Inglaterra, o primeiro financiamento feito por São Paulo até então. A inauguração aconteceu em 1913. Toda sua estrutura de metal foi fabricada na Bélgica. Na época em que foi inaugurado, o viaduto facilitava o trânsito de carruagens e bondes entre os dois lados do vale do Anhangabaú. Hoje, serve apenas para o trânsito de pedestres.
Paralelamente, crescia o movimento operário, liderado sobretudo pelos italianos e em 1917 São Paulo viveu seus primeiros dias de greve.
A guerra acabou e os paulistanos caíram na farra. Conheceram os prazeres da dança, das corridas de carros, dos jogos de futebol e do carnaval. Em 1922, São Paulo sediou a Semana de Arte Moderna, no Theatro Municipal. A identidade nacional estava na moda. À frente do movimento nacionalista, Oswald e Mário de Andrade.
A crise de 1929 devastou a economia paulistana sustentada pelo café e a Revolução Constitucionalista provocou novas mudanças na cidade. O Mercado Municipal, obra do arquiteto Ramos de Azevedo, começou a ser construído em 1928, mas só foi inaugurado em 25 de janeiro de 1933. A obra foi concluída em 1932, época em que estourou a revolução. O mercadão foi usado para guardar armas.
Getúlio Vargas, empossado na Revolução de 30, era criticado. A Pinacoteca teve seu prédio danificado pelos manifestantes. Mas São Paulo era uma cidade valente. Continuou a crescer e, em 1933, foi fundada a Universidade de São Paulo (USP), a primeira do Brasil.
Veio então, a segunda grande guerra. São Paulo, que era a maior concentração de imigrantes no Brasil, sofreu com a entrada do país no conflito. Mas, com o fim da guerra, nossos museus ganharam destaque, como o Masp (1947) e o MAM (1948).
Ao completar 400 anos, São Paulo ganhou dois dos pontos turísticos mais bonitos da cidade: o Parque do Ibirapuera e a Catedral da Sé, onde está localizado o marco zero da cidade. É a partir deste ponto que são calculadas todas as distâncias de São Paulo. Na mesma época, grandes montadoras de veículos começaram a surgir na cidade, dando ainda mais sinais de que a cidade de barro nunca mais seria a mesma.
Veio a ditadura e os conflitos entre militares e ativistas. O mais conhecido deles entre estudantes do Mackenzie e da USP, na Rua Maria Antonia. O jornalista Vladimir Herzog foi assassinado. Em 1984, cerca de 300 mil pessoas lotaram a Praça da Sé para pedir as “Diretas Já!” para presidente.
Na segunda metade do século 20, a economia de São Paulo já era mais serviços do que indústria. E assim é até hoje. Mas, com o passar dos anos, não foi apenas a economia paulistana que sofreu um processo de decadência se comparada à época do café. Um pouco da história da cidade foi ficando manchada não apenas pela ação do tempo, mas também com o vandalismo, as crises econômicas e problemas políticos. Mas, aos 450 anos, São Paulo começa a dar a volta por cima, com projetos como a revitalização do Centro histórico e a cada vez a mobilização cada vez maior dos paulistanos em busca de uma qualidade de vida e uma cidade melhor.
Para colocar um fim ao processo de degradação da cidade, a prefeitura desenvolveu, em parceria com a sociedade civil, o projeto Ação Centro. Segundo a Emurb, a previsão é de que sejam investidos US$ 168 milhões até 2008, dos quais US$ 100 milhões financiados pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). De 2001 até 2003, foram aplicados R$ 85 milhões.
Entre as obras, está prevista a restauração da fachada do Edifício Martinelli, o primeiro arranha-céu de São Paulo, a reforma da área que fica entre a Estação e o Parque da Luz, que será transformada em uma grande praça fechada, a restauração do Mercado Municipal, que ganhará um mezanino interno para restaurantes, a recuperação da Biblioteca Mário de Andrade, a segunda maior do país, e a criação de um café no local, além da recuperação da Casa da Marquesa dos Santos, o Beco do Pinto e a Casa Número 1. Além disso, a prefeitura planeja criar um novo museu na região central: o Museu da Cidade, no Palácio das Indústrias.
A recuperação de praças também faz parte do projeto e já começou. A Praça Patriarca teve seu terminal de ônibus removido e o piso de mosaico português foi refeito. Em breve, o Corredor Cultural, que inclui a Rua Xavier de Toledo, a praça Dom José Gaspar – que fica em frente à Biblioteca Mário de Andrade – e a Praça Ramos, ganhará novo piso, nova iluminação e paisagismo. As praças da Sé, da República e Roosevelt e o Largo do Arouche também sofrerão intervenções.
Os corredores de ônibus do Centro passarão por obras. Na Avenida Nove de Julho, um dos pontos mais degradados da cidade, elas começaram no dia 9 de setembro de 2003. O corredor deixará de existir para a implantação do Passa Rápido. Entre as mudanças, está a troca das muretas por faixas pintadas no asfalto, a mudança dos pontos de parada para o canteiro central – os ônibus ganharão portas à esquerda. A avenida também passará por um trabalho de recuperação asfáltica e paisagística. E vem muito mais por aí. São Paulo merece.

(Fonte: Boletim Terra – 23/12/03 – Homenagem a 450 anos de São Paulo)

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