Dionísio Dias Carneiro, economista e pesquisador que com Francisco Lopes e Rogério Werneck, criou o Departamento de Economia da PUC

0
Powered by Rock Convert

Qualquer pessoa bem informada é capaz de entender o papel fundamental que desempenhou o Instituto Tecnológico de Aeronáutica no sucesso da Embraer. Ou de perceber a importância que tiveram as pesquisas da Embrapa na espetacular revolução observada no setor agropecuário nas últimas décadas. Mas o que muita gente não percebe com tanta clareza é que o impressionante salto de qualidade por que passou a condução da política econômica nos últimos 20 anos foi, em boa medida, fruto de longo esforço de aprimoramento do ensino e da pesquisa na área de economia no País. Um esforço do qual participaram várias instituições acadêmicas a partir dos anos 60 e 70.

 

Professor Dionísio Dias Carneiro foi um dos fundadores do Departamento de Economia da PUC (Foto: Divulgação / Agência O Globo/Núcleo de Memória - PUC-Rio)

Professor Dionísio Dias Carneiro foi um dos fundadores do Departamento de Economia da PUC
(Foto: Divulgação / Agência O Globo/Núcleo de Memória – PUC-Rio)

 

Um formador de jovens economistas

Dionísio Dias Carneiro Netto (Rio de Janeiro, 1945 – Rio de Janeiro, 29 de julho de 2010), um economista que desempenhou papel crucial nesse esforço. Pesquisador que, juntamente com Francisco Lopes e Rogério Werneck, criou o Departamento de Economia da PUC, universidade onde ele ficou por mais de 30 anos, além da trajetória de Carneiro pelas universidades, a única e breve passagem no poder público, como vice-presidente da Finep entre 1979 e 1980, apesar de “ser muito convidado (para o governo), sempre se recusou”.

Depois do doutorado em Vanderbilt, em Nashville, Estados Unidos, Carneiro passou pela UnB, a convite de Edmar Bacha que assina o prefácio do livro. Como a experiência de criar a “Cambridge do Planalto” não dera certo, Carneiro vai para FGV, a convite de Simonsen, que logo depois segue para o governo. Na época, Carlos Langoni ficou na direção da EPGE, na FGV, vindo da universidade de Chicago, com perfil mais liberal, enquanto Lopes e Dionisio, com influência keynesiana. Eles acabaram saindo, juntamente com Rogério Werneck.

Para isso, aceitaram uma redução de 30% do salário e assumiram o desafio de formar a pós-graduação da PUC. Pedro Malan se juntou ao grupo, depois veio André Lara Resende, que foi aluno de Dionisio da FGV. Logo depois vieram Edmar Bacha, Eduardo Modiano e Persio Arida. As discussões iniciadas lá resultaram no Plano Real. (E a PUC tinha esse jeito “dessa aproximação da política econômica com a academia”). Hoje está mais separado. A universidade, a academia no Brasil está mais próxima do padrão internacional, com publicações no exterior.

Esse trabalho de criação dos planos de estabilização que finalmente deu certo com o Real foi muito relatado por jornalistas. Nesse processo, foi intensa a participação de Dionisio.

A época era de inflação alta e temor de hiperinflação. As discussões acadêmicas em torno da maneira de enfrentar a alta dos preços frequentavam os bancos da Escola de Pós-graduação de Economia da Fundação Getulio Vargas, onde vivia Mario Henrique Simonsen. Esses economistas estavam lá quando se discutia se o combate à inflação aconteceria de forma gradual, como defendia Simonsen, ou por um choque heterodoxo.

— O que chamou a atenção, ainda na fundação (Fundação Getúlio Vargas), é que Simonsen fazia o controle de preços. O próprio Simonsen, que defendia o modelo gradualista, achava que o modelo realimentava a inflação, que tendia a se reproduzir. Mudar o regime foi um avanço importante.

O choque heterodoxo aconteceu com o Plano Cruzado, que, na opinião de economistas nasceu morto, com a inclusão do gatilho salarial, que poderia rapidamente reindexar a economia. Nesse hora, se perguntavam por que economistas como André Lara Resende e Pérsio Arida, principais articuladores do plano, afastaram-se tanto das ideias iniciais concebidas ainda na PUC. Também se culparam por ter participado, embora no fim do processo, à equipe do Plano, juntamente com Eduardo Modiano.

A resposta é que é indescritível a explosão de autoestima, no sentido kohutiano do termo, que pode ser experimentada por um economista acadêmico ao ver suas ideias teóricas se transformarem em decisões importantes de governo e isso o torna particularmente vulnerável a todo o tipo de imposição política.

O gatilho permitiu a indexação. Se não se quebra a indexação, não se estabiliza. Foi o entendimento que economistas desenvolveram, num país de inflação crônica. No esboço do André (Lara Resende) não tinha gatilho salarial, que foi o grande problema do Cruzado. Difícil entender como aparece o gatilho no plano.

A segunda tentativa de estabilização, no Plano Bresser em 1987, afastou os dois amigos, Lopes e Carneiro. Dionísio não entendia o motivo de Francisco Lopes entrar na experiência e fez críticas públicas ao plano. A relação entre Dionísio e Francisco passou nesse período por um de seus piores momentos, com Francisco se sentindo injustamente criticado pelo amigo.

O Real deu certo quase 30 anos depois das primeiras discussões sobre gradualismo e choque heterodoxo. Passou pelo teste da troca de governo e do sistema cambial.

Mas, na opinião de Carneiro, “a estabilização seria uma tarefa que não terminaria nunca. Nos seus artigos na imprensa, com sua característica combinação de rigor e ternura, estava o tempo todo apontando eventuais inconsistências na política econômica, e reclamando dos governantes do dia sobre qualquer complacência ou desvio em relação à postura séria que considerava a única garantia da estabilidade dos planos de estabilização”.

O último centro de pensamento criado por Carneiro foi a Casa das Garças. Como berço de economistas ligados aos planos e aos governos que o implementaram, a casa chegou a ser chamada de ninho de tucanos: Ele detestava esse título. Não era o que pretendia ali. Poderia se perder a isenção do pensamento.

Dionisio Dias Carneiro, considerado um dos mais influentes economistas do país (Foto: Portal PUC-Rio Digital)

Dionisio Dias Carneiro, considerado um dos mais influentes economistas do país (Foto: Portal PUC-Rio Digital)

 

 

Carioca, estudou no Colégio Militar e cursou a Faculdade de Economia e Administração da UFRJ. Em 1968, foi admitido no programa de mestrado da Escola de Pós-Graduação em Economia (EPGE) da Fundação Getúlio Vargas, onde se beneficiaria da presença marcante de Mário Henrique Simonsen (1935-1997), no auge de sua dedicação à vida acadêmica. Da EPGE, partiu para um programa de doutorado nos EUA, em Vanderbilt, onde a estrela era Nicholas Georgescu-Roegen. Mais tarde diria que seus grandes mestres tinham sido Oscar Portocarrero, Mário H. Simonsen e Georgescu-Roegen.

Retornou ao País como professor da Universidade de Brasília. No final de 1973 aceitou convite de Simonsen para voltar ao Rio, como professor da EPGE, para a montagem de um programa de doutorado. Poucos meses depois, contudo, Simonsen afastou-se da instituição para assumir o Ministério da Fazenda no governo Geisel. Dionísio Carneiro permaneceria por três anos e meio na EPGE. Mas, em meados de 1977, sua crescente insatisfação com o projeto acadêmico que havia prevalecido na instituição o levou a se transferir para a PUC-Rio, com dois outros professores da EPGE, para ali criar um programa de pós-graduação em Economia.

À PUC-Rio Dionísio Carneiro ficaria vinculado por 30 anos. Durante a maior parte desse período, em regime de tempo integral. Foi uma das figuras centrais na construção institucional que, em poucos anos, transformou o Departamento de Economia da universidade num centro de excelência em ensino e pesquisa na área, com grande influência na concepção da política econômica no País. Nesse processo, destacou-se pela liderança intelectual, pela lucidez de suas análises, por sua incansável participação no debate econômico e por seus dotes como educador e formador de talentos.

Tinha extraordinária capacidade de incutir ambição intelectual nos alunos e de induzi-los a desenvolver visão mais ampla dos problemas que lhes interessavam. Basta uma lista curta de ex-alunos, de mais de uma geração, sobre cuja formação teve grande influência – como André Lara Resende, Armínio Fraga, Ilan Goldfajn e Eduardo Loyo – para perceber a importância do papel que desempenhou no processo de modernização e racionalização da política econômica que teve lugar no País desde o início da década de 90.

Nos últimos anos dedicou-se ao Instituto de Estudos de Política Econômica da Casa das Garças que, graças a ele, se firmou em pouco tempo como um dos principais espaços de discussão de políticas públicas no País. Conciliava essa dedicação com atividades de consultoria, artigos quinzenais no Estado e participação em conselhos de empresas. Sempre nos estritos limites de uma saúde muito precária.

O parágrafo final de um dos seus últimos artigos, no Estado de 21/5, bem ilustra a admirável argúcia com que buscava resgatar o bom senso no debate econômico. “O candidato do PSDB declara-se contra a independência do Banco Central e a candidata do PT mostra que não sabe o que é restrição fiscal. Para ambos, algo a pensar. Quem leva a sério a responsabilidade fiscal não precisa tirar a independência do BC. Quem não leva não merece mandar no BC.”

Dionísio Dias Carneiro morreu dia 29 de julho de 2010, no Rio de Janeiro, pouco antes de completar 65 anos

(Fonte: http://economia.estadao.com.br/noticias/geral – GERAL – Economia & Negócios – ECONOMIA/ Por Rogério L. F. Werneck , O Estado de S.Paulo 06 Agosto 2010)

(Fonte: http://oglobo.globo.com/economia  – ECONOMIA/ POR CÁSSIA ALMEIDA – 24/11/2013)

© 1996 – 2016. Todos direitos reservados a Infoglobo Comunicação e Participações S.A.

Powered by Rock Convert
Share.