Bruno Bettelheim, psicanalista e educador que traduziu a alma das crianças, foi um investigador abnegado, um humanista, o seu livro Uma Vida para Seu Filho, se tornou leitura obrigatória para pais de todas as nacionalidades

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Bettelheim: reflexões sobre educação e nazismo

 

 

Bruno Bettelheim (nasceu em Viena, em 28 de agosto de 1903 – faleceu em Silver Spring, Maryland, em 13 de março de 1990), psicanalista e educador americano nascido na Áustria que traduziu a alma das crianças. O seu livro Uma Vida para Seu Filho, se tornou leitura obrigatória para pais de todas as nacionalidades.

De origem judia, o psicanalista esteve confinado nos campos de concentração nazistas de Dachau e Buchenwald entre 1938 e 1939. Graças à intervenção americana, foi libertado ainda em 1939 e passou a viver nos Estados Unidos. Sua experiência em campos de concentração lhe forneceu elementos para criar uma terapêutica infantil baseada justamente na reflexão sobre o terror provocado pelo nazismo.

Uma a uma, as sólidas bases que ele construiu ao longo da vida intensa pelas vias de um intelecto poderoso e de uma transbordante capacidade emotiva foram sendo cavadas debaixo de seus pés. A morte levou-lhe a mulher, companheira de uma vida, depois um derrame tirou-lhe a capacidade de trabalho, brigou com a filha que mais amava e o internamento num asilo privou-o do convívio com os netos. Foram golpes demais, mesmo para alguém cuja existência foi uma reafirmação, uma celebração da vida. Na noite de terça-feira, dia 13 de março, o psicanalista americano recolheu-se a seu quarto numa clínica de repouso para velhos em Silver Spring, no Estado de Maryland, tomou uma dose que ele sabia fatal de tranquilizantes e, antes que perdesse os sentidos, enfiou pela cabeça uma sacola plástica. Morreu por asfixia antes que as drogas fizessem efeito. Aos 86 anos, saiu da vida por livre-arbitrío o homem que para continuar vivendo precisou superar os traumas da passagem por um campo de concentração nazista e da adaptação num país estrangeiro.

Da sua luta para recompor-se, evitar a amargura e esquecer os terríveis sofrimentos, surgiu uma obra fabulosa, uma original abordagem da mente e da alma das crianças traduzida em mais de uma dúzia de livros que se tornaram best-sellers em quase todo o mundo. Bruno Bettelheim foi um investigador abnegado, um humanista científico que só não ganhou um Prêmio Nobel porque não existe o galardão para sua atividade, a psicanálise. Um de seus últimos livros, de 1988, traduzido no Brasil com o título de Uma Vida para Seu Filho, ficou durante meses no primeiro lugar das listas de mais vendidos. Suas lições: todo pai pode ser bom o bastante para criar os filhos, mesmo que trabalhe fora, mesmo que chegue cansado em casa, mesmo que não tenha todo o tempo disponível para cuidar das crianças. Foi um desmistificador. Os contos de fada ajudam a criança a enfrentar a vida. A infância é para brincar, não para aprender a ler e fazer conta antes da hora. Criança é criança, e não um adulto em miniatura. Televisão não faz nenhum mal desde que pais e filhos discutam alguns minutos sobre o conteúdo dos programas. “Participe dos planos de seus filhos e não faça planos por eles”, ensinava Bettelheim.

Sócrates – O suicídio de Bruno Bettelheim tem mais o acento de uma decisão consciente de um homem que optou por não abdicar do direito de escolher como morrer pela forte razão de ter sempre sabido escolher como viver. Não tem a aura do desespero que marcou, por exemplo, o suicídio do escritor brasileiro Pedro Nava. Foi uma decisão em que se destila de uma só vez toda a amargura da alma, mas foi um gesto medido. “A situação foi se tornando insuportável para ele, que sempre comandou com firmeza a própria vida”, disse o psicanalista Rudolf Ekstein (1912-2005), de Los Angeles, o melhor amigo de Bettelheim. “A morte da mulher, Gertrud, em 1984 o desnorteou bastante, depois veio o derrame, em 1987, e agora essa inexplicável separação do convívio com a filha Ruth que culminou na sua ida para uma casa de repouso”, disse o professor Ekstein. Antes de se internar, Bettelheim morava numa casa ensolarada em Santa Monica, a famosa praia da Califórnia, com uma linda vista para o Oceano Pacífico. Os amigos não conseguiam arrancar dele uma expressão de esperança, mas as premonições negras brotavam com facilidade nas conversas, como a que teve com Ekstein: “Quando a dor é muito grande, o homem tem direito de fazer como Sócrates e tomar cicuta”.

Bettelheim faleceu em 13 de março de 1990, aos 86 anos, no Estado de Maryland, Estados Unidos.

(Fonte: Revista Veja, 21 de março de 1990 – Edição 1122 – Datas – Pág; 130)

(Fonte: Revista Veja, 17 de maio de 1989 – ANO 22 – Nº 19 – Edição 1079 – LIVROS/ Por Marcello Rollenberg – Pág: 126)

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