Affonso Celso Pastore, economista e ex-presidente do Banco Central do Brasil (BC), foi um dos economistas mais respeitados do país, tanto no meio acadêmico como no serviço público

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Affonso Celso Pastore, economista e ex-presidente do BC

Economista foi presidente do Banco Central (BC) nos anos 1980, além de ter feito carreira como professor da Universidade de São Paulo.

Affonso Celso Pastore, ex-presidente do Banco Central — (Foto: Wilton Junior/Estadão Conteúdo/Arquivo)

Affonso Celso Pastore (nasceu em 19 de junho de 1939, na cidade de São Paulo – faleceu em 21 de fevereiro de 2024, em São Paulo), economista e ex-presidente do Banco Central do Brasil (BC).

Doutor em Economia pela Universidade de São Paulo (USP), Pastore foi um dos economistas mais respeitados do país, tanto no meio acadêmico como no serviço público.

Em 1973, tornou-se livre docente e professor da FEA-USP. Entre 1979 e 1983, foi secretário da Fazenda do Estado de São Paulo. Presidiu o BC entre 1983 e 1985, no governo de João Figueiredo, durante a ditadura militar.

Anos depois, em 1993, passou a atuar também como consultor em economia ao fundar a A.C. Pastore Consultores e Associados junto de sua esposa, Maria Cristina Pinotti.

Bacharel e doutor em economia pela FEA/USP (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo), Pastore foi professor titular do Departamento de Economia, diretor da instituição e um dos economistas mais respeitados do país.

Ele se dedicou à vida pública e acadêmica, tendo ministrado aulas também em faculdades como Insper e FGV (Fundação Getulio Vargas).

Sua principal contribuição foi à frente do BC entre 1983 e 1985, o último presidente da autarquia durante o período da ditadura militar. À época, em substituição a Carlos Langoni (1944 – 2021), Pastore teve o desafio de renegociar as obrigações internacionais do país em meio à crise de dívida externa.

Ele se formou em 1962 e concluiu o doutorado dali sete anos, com a tese “A resposta da produção agrícola aos preços no Brasil”. O trabalho, que mostrava como a agricultura respondia a preços como qualquer outro setor, “foi de enorme importância”, avalia o economista Marcos Lisboa, colunista da Folha de S.Paulo.
“Affonso faz parte de uma geração que acompanhava a pesquisa científica e buscava entender o que os dados tinham a dizer sobre a realidade”, disse ele, em mensagem de condolências. “Depois [do doutorado]migrou para a macroeconomia, sempre com o mesmo cuidado de analisar os dados, algo que fez a vida toda. Affonso foi o cara mais ético dessa profissão. Correto com os fatos, com os dados, de uma integridade intelectual inacreditável.”

Enquanto preparava a tese, entrou para a vida pública em 1966, como assessor de Antonio Delfim Netto, então secretário da Fazenda de São Paulo. Quando Delfim foi nomeado ministro da Fazenda, no ano seguinte, Pastore integrou a equipe de comunicação e assessoria da pasta.

Em 1968, fez parte da delegação do governo brasileiro na reunião do FMI (Fundo Monetário Nacional), em Washington, Estados Unidos. Em 1979, assumiu a Secretaria de Fazenda do estado de São Paulo. Em 1983, a presidência do BC.

Pastore era conhecido por perfil ortodoxo e rigor na defesa do controle da inflação

Affonso Celso Pastore teve carreira em boa medida estruturada na academia, como gostava de afirmar, com passagens pela administração pública, sem ter experiência em instituições financeiras privadas. O berço de sua formação foi a Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP), onde cursou graduação, pós-graduação e realizou também sua Livre Docência, tornando-se posteriormente professor titular e diretor. Nos anos 90, lecionou na pós-graduação em Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e também no Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec).

A vida na administração pública começou ainda nos anos 60, integrando a equipe de assessores do então Ministério da Fazenda. Nos anos 70, assumiu a Secretaria da Fazenda de São Paulo.

Assumiu a presidência do Banco Central no começo de setembro de 1983, em pleno processo de renegociação de dívida externa e com o País quebrado, e ficou até março de 1985. Sucedeu o economista Carlos Langoni, após este entrar em rota de colisão com o então ministro do Planejamento Delfim Netto.

A saída de Langoni, que dispunha de alta credibilidade no mercado financeiro, foi lamentada, mas ao mesmo tempo a indicação de Pastore foi vista com alívio. Assim como o antecessor, o acadêmico da FEA também tinha trânsito junto à comunidade internacional, sendo considerado um nome forte para dar sequência às negociações da dívida com bancos e organismos como Fundo Monetário Internacional (FMI), Clube de Paris e Banco Mundial, num momento em que o Brasil vivia crise no balanço de pagamentos. “Entrei em meio a uma crise e fui o administrador dessa crise, não fui propriamente um presidente de banco central”, relatou. À época, o BC não tinha o status de hoje, sendo uma mera divisão do Ministério da Fazenda.

Poucos meses após assumir o desafio de comandar o BC, Pastore e a área econômica conseguiram um acordo para empréstimo em janeiro de 1984. As reservas cambiais eram negativas em US$ 2 bilhões (conceito caixa, não de liquidez internacional) em setembro de 1983, mas no começo do ano seguinte o saldo era positivo em US$ 6 bilhões.

Foi imperioso ainda um processo de indexação e desvalorização cambial que estimulasse as exportações e ajudasse a equilibrar o balanço de pagamentos, mas que teve como trade off a explosão da inflação, que chegou a rodar em 100% ao ano. “A forma de resolver a crise externa nos empurrou para o câmbio real fixo na paridade de poder de compra, tendo como consequência a total impossibilidade de controlar a quantidade de moeda”, disse, em entrevista dada para a coleção História Contada do Banco Central do Brasil, no volume a ele dedicado, lançada em 2019.

Conhecido por seu perfil ortodoxo e rigor na defesa do controle da inflação, Pastore afirmava que sua grande frustração na passagem pelo BC foi não poder fazer política monetária, que à época era de responsabilidade do Conselho Monetário Nacional (CMN).

Para entender e explicar os fenômenos por trás dos processos de descontrole de preços no Brasil nas últimas décadas, se aprofundou em pesquisas que resultaram no livro Inflação e Crises – O papel da Moeda, lançado em 2014, considerado fundamental pela classe para os que querem estudar macroeconomia.

Suas posições firmes lhe renderam polêmicas, como o famoso atrito com o ex-presidente do Banco Central na gestão Dilma Rousseff Alexandre Tombini, em março de 2015. Incomodado com a crítica de Pastore de que desde que havia chegado ao BC nunca entregou a inflação na meta de 4,5%, Tombini acionou a assessoria de imprensa da autoridade monetária para responder que, quando Pastore era o titular da instituição, a inflação acumulada em 12 meses passou de 134,69% para 224,60%.

Pastore disse ter se sentido ofendido e treplicou: “nunca me escondi atrás de nota à imprensa para desrespeitar quem está ou esteve no Banco Central” e disse que nunca ter escondido ou mentido sobre seus feitos no BC.

Carreira e vida pública

Affonso Celso Pastore nasceu em 19 de junho de 1939, na cidade de São Paulo. Pastore vinha de uma família de origem italiana. Não teve dúvidas quanto ao caminho profissional trilhado: “Sempre pensei em ser economista. Não chegou nem a ser uma escolha, foi algo natural”, disse ele em entrevista para o livro de memórias do BC, em 2016. O economista se dedicou, durante toda a carreira, à vida acadêmica, com dezenas de estudos e livros publicados. Mas teve também uma passagem por cargos públicos em diferentes governos.

Em entrevista ao projeto “História Contada do Banco central do Brasil”, que reúne conversas com os presidentes da instituição, Pastore afirmou que sua escolha pela economia foi guiada apenas pelo gosto pessoal, sem influência da família.

Começou a carreira pública em 1966, como assessor do então secretário da Fazenda do Estado de São Paulo, Antônio Delfim Neto, que foi o orientador de Pastore durante sua pós-graduação. No ano seguinte, Delfim virou ministro da Fazenda e Pastore passou a integrar a equipe ministerial.

Em 1979, assumiu o cargo de secretário da Fazenda do Estado de São Paulo, durante o governo de Paulo Maluf.

Sobre a experiência de trabalhar na Fazenda do governo estadual, Pastore afirmava que seu papel era gerenciar o fluxo de caixa, o que o fez deixar de lado, por um tempo, o papel de acadêmico para assumir o papel de gestor.

“Acredito que todos que desejam refletir sobre política econômica deveriam submeter-se a essa experiência de gestor”, disse o economista em entrevista ao BC.
Poucos anos depois, entre 1983 e 1985, presidiu o Banco Central, durante o governo do ex-presidente militar João Figueiredo, último mandatário da ditadura militar brasileira. Pastore considerava que, durante essa vivência, ele não foi propriamente um presidente de banco central, mas, sim, o administrador de uma crise.

Naquela época, o Brasil já vivia a crise da dívida externa, com as reservas de caixa negativas em US$ 2 bilhões, e os esforços eram direcionados para a renegociação dos valores e a busca por financiamentos.

Depois desse período, voltou à vida acadêmica. Em entrevista ao livro “Conversas com Economistas Brasileiros”, de 1996, Pastore disse que não tinha desejo de voltar para cargos em governos, afirmando que isso não tinha “utilidade marginal nenhuma”.

Em 1993, fundou a A.C. Pastore Consultores Associados, consultoria especializada em análises econômicas do Brasil e do mundo, consultoria com foco em macroeconomia aplicada, junto com a esposa, também economista, Maria Cristina Pinotti, e se dedicou à carreira de professor, lecionando na FEA-USP e na Fundação Getúlio Vargas (FGV). Também foi um dos fundadores do Centro de Debate de Políticas Públicas (CDPP), órgão que reúne economistas e pensadores do país.

A equipe de sua empresa destaca que Pastore foi “uma figura marcante nas discussões sobre a economia brasileira”.

“Em suas análises, sempre prezou pela franqueza e imparcialidade. Foi indispensável na formação de diversos economistas, seja na sala de aula, na sala de reuniões ou dentro de seu escritório. Além da perda para os amigos e família, também fará falta para o debate econômico do país”, diz a consultoria.

Posicionamento durante a pandemia e união com Sergio Moro

No primeiro ano de pandemia, em 2020, Affonso Pastore deu uma entrevista ao g1 em que afirmou que a recuperação da economia brasileira seria lenta e custosa. Disse que, naquele momento, era difícil ter uma noção exata do tamanho da crise que o país enfrentava, mas considerava que não havia alternativa para além das medidas de isolamento social.

“Tem uma coisa nova aqui e no mundo, que é uma pandemia. É muito difícil lidar com isso. Na comparação com a Europa, o Brasil não conseguiu superar a pandemia ainda. Os países europeus fizeram logo no começo um lockdown muito rígido e derrubaram o contágio. No Brasil, nós estamos há muitos dias com cerca mil mortes por dia. Numa situação como essa, o afastamento social continua, não tem outra maneira”, disse.
Em relação ao governo de Jair Bolsonaro, Pastore acreditava que o maior objetivo do seu governo era conseguir se reeleger em 2022, “não propriamente o bem-estar dos brasileiros”.

Recuperação da economia vai ser custosa, diz ex-presidente do BC

Em 2021, Pastore participou da carta de alerta em relação ao agravamento da pandemia no Brasil, assinada por mais de 500 empresários e economistas do país, como Armínio Fraga, Pedro Malan, Ilan Goldfajn, Gustavo Loyola e Pérsio Arida.

Intitulado “O País exige respeito; a vida necessita da ciência e do bom governo — carta aberta à sociedade referente a medidas de combate à pandemia”, o documento reforçava que o Brasil era, então, o epicentro da Covid-19 e que as políticas públicas deviam ser baseadas na ciência.

“Estamos no limiar de uma fase explosiva da pandemia e é fundamental que a partir de agora as políticas públicas sejam alicerçadas em dados, informações confiáveis e evidência científica. Não há mais tempo para perder em debates estéreis e notícias falsas”, diz a carta.
Para os signatários, a crise que o país enfrentava, com retração econômica e desemprego, só poderia ser superada com o controle da doença. Para isso, o documento pedia pela vacinação em massa e incentivava o uso de máscaras e as medidas de isolamento.

No ano seguinte, em 2021, Pastore ensaiou um retorno à vida pública como assessor do ex-ministro da Justiça Sergio Moro, que foi pré-candidato à Presidência da República. Ele atuou como o principal conselheiro econômico de Moro para a disputa presidencial de 2022, uma candidatura que nunca chegou a acontecer.

Banco Central emite nota de pesar
Ex-presidente do Banco Central entre 1983 e 1985, o economista Affonso Celso Pastore deixou marca profunda nos estudos de economia desenvolvidos no Brasil. Com rigor analítico, empreendeu um esforço contínuo de compreensão das raízes de problemas crônicos da nossa economia, como a inflação, o desequilíbrio das finanças públicas e o crescimento econômico.

Em sua passagem pelo Banco Central, se dedicou ao trabalho de lançar as bases de uma economia estável e com crescimento sustentável. Deu significativa contribuição para a resolução do problema do endividamento externo brasileiro. Com exímia habilidade, foi negociador junto ao Fundo Monetário Internacional e os bancos credores internacionais, ajudando de forma definitiva a evitar que o país entrasse numa situação de insolvência externa.

No campo acadêmico, Pastore deixa trabalhos inovadores que serviram de inspiração a uma geração de ex-alunos e que certamente serão consultados por novos economistas. Em vida, ganhou o reconhecimento dos mais renomados economistas do país.

A Diretoria do Banco Central expressa seu pesar pelo falecimento de Pastore. Sua partida deixará uma lacuna no debate econômico brasileiro. Sempre manteve um diálogo generoso com o Banco Central, dando apoio inestimável às causas da instituição. Deixamos nossas condolências para Maria Cristina Pinotti, esposa de Pastore, demais familiares, amigos e os muitos colegas de trabalho e da academia.

Affonso Celso Pastore faleceu na quarta-feira (21), em São Paulo, aos 84 anos. Ele estava internado no Hospital Albert Einstein desde o último final de semana, com problemas vasculares em uma das pernas.

Paulo Hartung
O economista e ex-governador do estado do Espírito Santo (2003-2010 e 2015-2018) Paulo Hartlung ressaltou o legado de Pastore para o Brasil.

“É com profundo pesar que recebo a notícia do falecimento do professor Affonso Celso Pastore. Um dos mais influentes e respeitados economistas do país, que deixa uma enorme contribuição para o debate econômico do Brasil. Meus sentimentos aos familiares e amigos.”
Samuel Pessôa, economista e pesquisador da FGV
“A regra de Taylor, criada pelo economista John Taylor e que estabeleceu a relação entre inflação e taxa de juros, por pouco não foi a ‘regra de Pastore’. Ele publicou um trabalho, anos antes de Taylor, no qual descrevia a estabilização de preços numa economia via taxa de juros – numa época em que a governança para moedas baseadas no padrão fiduciário, em oposição ao padrão ouro, era desconhecida. Se a equação que ele derivou tivesse dado um passo a mais, ele chegaria à regra de Taylor. Isso mostra como ele, aqui, na periferia do conhecimento, dialogava de igual para igual na literatura, sempre na fronteira, com a pesquisa mais avançada que existia. Pastore foi, ao lado de Carlos Langoni (ex-presidente do Banco Central, morto em 2021), o pesquisador que tem a melhor e a mais consistente produção de economia aplicada brasileira em sua geração. Além do estudo sobre política monetária, Pastore também deu outra grande contribuição à teoria econômica, debruçando-se sobre dados ligados à agricultura. Pastore era um pesquisador empírico, sem muita paciência para teoria. Também uma pessoa pragmática, que entendeu que, mesmo numa ditadura, poderia ajudar o Brasil trabalhando no governo. Ele era um democrata que percebeu que, dadas as circunstâncias, o melhor que ele poderia fazer era servir o País porque, de forma discreta, ele era muito nacionalista.”
Josué Gomes da Silva, presidente da Fiesp
“O Brasil perde um importante pensador e economista. Além de ser um estudioso das nossas questões econômicas, também teve relevante trajetória pública, atuando em momentos-chave, como na negociação da dívida externa brasileira quando era presidente do Banco Central.”
Pérsio Arida, ex-presidente do BNDES e do Banco Central
Foi um professor muito influente da USP, avançou muito os estudos de uso de métodos quantitativos na universidade. Teve, depois, um longo período de colaboração com o governo formal quando era presidente do Banco Central. E mesmos antes, informal. O Delfim o respeitava muito.

Era uma figura muito firme nas suas ideias, muito centrado na preocupação de (adotar) políticas públicas com base em evidência e feitas com rigor. Eram palavras que ele, inclusive, usava muito. Foi um intelectual público.
Felipe Salto, ex-secretário da Fazenda e Planejamento SP
“Affonso Celso Pastore foi um dos maiores economistas do País e continuará a ser uma referência para todos nós, no setor público e privado, que estamos preocupados em decifrar os caminhos do desenvolvimento econômico. A sua dedicação à economia é inspiradora e a sua generosidade para com as novas gerações, sobre a qual dou testemunho, foi gigantesca. Quando assumi a IFI (Instituição Fiscal Independente), com menos de 30 anos, ele topou fazer parte do conselho inicial formado por mim. Anos à frente, continuou sempre participando das iniciativas para as quais o convidei, sempre emprestando sua credibilidade e motivando a todos por onde passava. Foi assim na aula que ele nos deu na Secretaria da Fazenda, em São Paulo, quando o convidei para participar do grupo de conjuntura que montei quando fui secretário, em 2022. Deixa muitas saudades e um dever para todos nós: honrar o seu legado.”
(Créditos autorais: https://www.msn.com/pt-br/noticias/brasil – Folha de S.Paulo/ NOTÍCIAS/ BRASIL/ SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – 21/02/2024)
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(Créditos autorais: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2024/02/21 – SÃO PAULO/ NOTÍCIA/ Por Bruna Miato, g1 – 21/02/2024)
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