“Faça como Machado de Assis, Olavo Bilac e Coelho Neto – compareça à repartição só no fim do mês para pegar dinheiro”, recomendou o autor de Policarpo Quaresma

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A SAGA DO LIBERAL

 

Austregésilo de Athayde (Caruaru (PE), 25 de setembro de 1898 – Rio de Janeiro (RJ), 13 de setembro de 1993), deixou sua marca na democracia brasileira, tornou-se também personagem lendário e, não raro, folclórico no mundo literário.

 

No início dos anos 20, o pernambucano Austregésilo de Athayde, então um jovem que tentava a sorte no jornalismo carioca, ouviu várias vezes um mesmo conselho do já famoso escritor Lima Barreto.

 

Dizia-lhe que abandonasse a ideia de trabalhar apenas em jornais, profissão que não dava dinheiro, e tratasse de conseguir um cargo público para viver mansamente à custa do Estado. “Faça como Machado de Assis, Olavo Bilac e Coelho Neto – compareça à repartição só no fim do mês para pegar dinheiro”, recomendou o autor de Policarpo Quaresma. Athayde jamais lhe deu ouvidos, e quem ganhou com isso foi o Brasil.

 

Nas décadas seguintes, Athayde se tornou uma das vozes mais influentes da democracia nacional e um atilado analista dos acontecimentos mundiais. Com seus artigos diários em jornais e revistas, publicados até pouco antes de sua morte, em 1993, esteve sempre pronto a brandir seu ideário liberal contra as opressões, as ditaduras e toda forma de cerceamento das liberdades individuais e de imprensa. Como eterno presidente da Academia Brasileira de Letras, que comandou por mais de trinta anos.

 

A trajetória de Belarmino Maria Austregésilo de Athayde, sua correspondência e as notícias que a imprensa publicou sobre ele, além do resultado é uma História do Brasil e do mundo no século 20. A obra procura desmitificar algumas lendas a respeito de Athayde. Como a de que ele teria apoiado incondicionalmente o golpe militar de 1964. Os artigos de época mostram que ele realmente apoiou o levante militar como forma de evitar a baderna na vida nacional, mas apenas três dias depois já reclamava a devolução do poder aos civis.

 

Resgata histórias curiosas e divertidas protagonizadas por Austregésilo de Athayde. Como sua campanha contra a construção da estátua do Cristo Redentor, no Rio de Janeiro. “Por que obrigar o Cristo a ser o guarda-noturno dessa Sodoma incorrigível?”, perguntava ele em 1921.

 

Abordando episódios, ele ficou furiosos quando suas economias da vida inteira foram confiscadas pelo então ex-presidente Collor. Por coincidência, o primeiro pagamento que Athayde recebeu por um artigo, escrito para o jornal carioca A Tribuna, foi-lhe entregue pelo avô do ex-presidente, o também jornalista Lindolfo Collor, diretor da publicação.

 

Dias depois do confisco, Athayde aliviou a bílis com a ministra de Collor, Zélia Cardoso de Mello. Ambos se encontraram no show de Paul McCartney, no Rio de Janeiro. Zélia chamou a atenção de Athayde para o fato de que todos no Maracanãzinho estavam dançando ao som do ex-beatle. “Ministra”, devolveu o jornalista, “quem fez o Brasil dançar foi a senhora, não ele.” Humor admirável para um nonagenário.

(Fonte; Veja, 23 de setembro de 1998 – ANO 31 – N° 38 – Edição 1565 – LIVROS/ Por Pág; 150)

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