Victor Assis Brasil, aclamado instrumentista, saxofonista de jazz.

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Victor Assis Brasil (Rio de Janeiro, 28 de agosto de 1945 – Rio de Janeiro, 14 de abril de 1981), aclamado instrumentista, saxofonista de jazz.
Victor Assis Brasil nasceu no dia 28 de agosto de 1945, cinco minutos antes de seu irmão gêmeo – e também músico – João Carlos. A vocação para a música veio cedo. Da gaita (atenção, amigos portugueses: gaita aqui é harmónica de boca) dos tempos de infância ao primeiro saxofone-alto, aos 17 anos, foi um pulo. O primeiro mestre foi Paulo Moura. O Rio descobriu o talento de Victor nas jam sessions do lendário “Little Club” no Beco das Garrafas, em Copacabana, que, junto com o “Bottles”, foi um dos nascedouros de inúmeros astros da Bossa Nova.
Depois foi a vez dos shows improvisados em faculdades e colégios da Zona Sul. Nessa época, estava em curso um processo de popularização (ou pelo menos uma tentativa) da Bossa Nova e, por tabela, do jazz. Muitos desses shows nos colégios cariocas converteram-se em verdadeiros exercícios de pedagogia da linguagem jazzística. Victor teve um papel muito importante nesse processo. Lembro-me especialmente de uma dessas “aulas” no Colégio Benett, com o crítico Luiz Orlando Carneiro, na primeira parte do programa, a ilustrar sua palestra com trechos de discos dos principais mestres do jazz, que fazia rodar num toca-discos arranjado pelo Colégio e que produzia um som horrível.
Em 1965, já estava tocando nas sessões do “Clube de Jazz e Bossa”, de tão curta existência. Numa dessas noites, apareceu no Clube o pianista e maestro austríaco, Friederich Gulda, amante do Jazz. Nessa noite não fui ao Clube. E talvez por isso a surpresa foi grande quando, dias depois, ouvi de Oswaldo Sargentelli Filho, baterista bissexto, e também “macaca de auditório” de Victor, que nosso amigo tinha sido convidado a participar de um concurso internacional de jazz em Viena. Dessa primeira incursão ao exterior, Victor trouxe na bagagem o terceiro lugar do concurso de Viena, na categoria de saxofone, e o prêmio de melhor solista do Festival de Berlim, de que participou a seguir. Mas a bagagem de Victor vinha também carregada, sobretudo, do reconhecimento de seu talento. Isso o encorajou a seguir de vez a carreira de músico profissional. Mas as dificuldades eram grandes e, talvez por isso, em 1965 Victor fez – junto comigo – o vestibular de Direito, na Universidade Cândido Mendes, sendo aprovado entre os primeiros lugares.
Em 1966 gravou seu primeiro disco, “Desenhos”, hoje uma peça de colecionadores. Nesse disco, o grupo – um quarteto – era integrado ainda pelo pianista Tenório Júnior (que viria a desaparecer em Buenos Aires, e posteriormente seria dado como morto pelo regime militar), Edison Lôbo, um contrabaixista, então com 19 anos, que todos nós admirávamos, e Chico “Batera”. Victor deixaria pela primeira vez impressa no vinil a marca do extraordinário improvisador e a inegável influência – que o acompanharia pelo resto de sua trajetória musical – de John Coltrane e do nosso já conhecido Phill Woods.
Em 1969, voltou a viajar ao exterior, graças a uma bolsa que ganhou na prestigiosa Berklee School of Music, em Boston, (EUA). Lá ficou cinco anos, durante os quais aprimorou sua técnica e estudou composição e arranjo. Paralelamente, batalhou duramente para ter um lugar ao sol (e, tratando-se dos “States”, bota sol nisso), mas conseguiu tocar com grandes nomes do jazz norte-americano e acabou formando sua própria banda, um grupo integrado por brasileiros (entre eles o trompetista Cláudio Roditi) e americanos.
De volta ao Brasil, em 1973, já era um músico conhecido, embora mais reconhecido no exterior do que no seu próprio país. E isso lhe doía muito. Victor sempre foi um músico de jazz (talvez o maior do Brasil), mas nunca deixou de expressar, através da linguagem musical do jazz, suas raízes brasileiras e cariocas. Num depoimento à revista Veja em novembro de 1974, revelou que sua maneira de compor “se enraizara naquelas duas influências básicas”. Mesmo quando tocava músicas brasileiras (como foi o caso do disco que gravou só com composições de Tom Jobim), Victor usava o léxico musical do jazz. Mas, como músico de jazz, Victor viria a sentir na própria carne as dificuldades dessa condição de instrumentista no Brasil. Sobretudo porque jamais admitiu fazer concessões com sua música. E aí chegamos a outro traço do seu caráter: a honestidade musical. Numa entrevista à Folha de São Paulo em junho de 1977, diria que “é uma barra viver e sobreviver dentro desse esquema a que me propus. É preciso ter peito, garra, passar fome, como eu passei nos Estados Unidos”. E prometia – como, de resto, cumpriu – “nunca tocar bolero na Praça Mauá”. Seja como for, seu talento de músico de jazz foi-se consolidando com o tempo (é uma pena que esse tempo acabaria sendo demasiado curto para a arte de Victor).
Graças à perseverança com que lutou pela sua música, a trajetória de Victor Assis Brasil abriu novos caminhos para a música instrumental no Brasil, e teve uma contribuição extraordinária na divulgação do jazz em nosso país e na formação de novos instrumentistas. Em fins de 1979, passou algumas semanas em Curitiba realizando um trabalho pioneiro de workshops, estimulando o aperfeiçoamento dos músicos locais, através do desenvolvimento das técnicas de improvisação. Ao morrer precocemente, em 14 de abril 1981, Victor Assis Brasil tinha contribuído para a formação de uma nova geração de instrumentistas brasileiros, entre os quais Mauro Senise, Cláudio Roditi, Márcio Montarroyos, Nivaldo Ornelas e Hélio Delmiro. Tendo morrido aos trinta e cinco anos, em conseqüência de periartite nodosa, uma doença circulatória rara e grave, Victor deixou uma discografia pequena, restrita a oito álbuns que gravou entre 1966 e 1980. Muito pouco para sua força criativa. Pouca gente sabe, por exemplo, que a obra que deixou revela um compositor fecundo. Quando Victor morreu, Dona Elba manteve fechadas duas malas que encontrou no quarto do filho. Em 1988, quando o irmão João Carlos deixou o apartamento da Marquês de Abrantes, Dona Elba entregou-lhe as malas. Um dia, João Carlos resolveu abrí-las e deparou com mais de quatrocentas composições inéditas: peças para piano solo, para orquestra, quarteto de cordas, jazz erudito (uma vertente que começou a explorar, seguindo as pegadas da chamada “Third Stream”, uma corrente musical que pretendia unir elementos do jazz e da música clássica). Victor também deixou valioso material de música popular.
Victor se foi muito cedo do nosso convívio. Sua música, contudo, há de ficar para sempre. Claro que a partida prematura nos privou de enormes porções desse inigualável elemento de nutrição da alma que é a música – a música dele. Quanta coisa bonita ficou por fazer. Quantos desenhos harmônicos deixaram de ser traçados. Quanto improviso forte e insinuante, naquele fraseado inspirado no mestre Bird, não raro blusado” e de longas linhas melódicas, ficou por aí e se perdeu no ar. Que inveja desses privilegiados Querubins e Serafins a quem não lhes falta, lá em cima, a música do Victor tão carecida cá embaixo, – com todos os superagudos a que a vida eterna lhe dá direito.
(Fonte: www.assisbrasil.org – por Marcos Borelli)

Esse grande saxofonista brasileiro nasceu no Rio de Janeiro em 28 de agosto de 1945, sendo gêmeo de João Carlos de Assis Brasil, famoso pianista. Foi atraído desde cedo pela música sem nenhuma influência especial. Seus primeiros instrumentos foram a gaita-de-boca e a bateria, que ganhou de presente aos 12 anos de idade. No início, copiava na gaita os solos de saxofonistas e trompetistas das gravações de jazz que possuía. Aos 17 anos sua tia deu-lhe um saxofone alto e um mundo novo abriu-se à sua frente. O sax foi uma extensão do jazz que ouvia e praticava, um instrumento de maiores recursos e compatível às suas aspirações musicais.
Freqüentou o famoso Beco das Garrafas, tocando, dando “canjas” e participando das jam sessions dominicais do “Little CIub”, onde conheceu músicos de renome entre nós. Também apresentou-se em inúmeros shows de estudantes em auditórios de colégios cariocas. Na década de 60 era prática comum a realização de jam sessions em festas familiares e Victor participou de um sem número delas, que foram importantes no seu desenvolvimento de improvisador.
Em 1965 tocou na inauguração do “Clube de Jazz e Bossa”, tornando-se figura obrigatória em suas atividades. Deixou uma obra preciosíssima, oito discos lindíssimos muito difíceis de se encontrar atualmente. O seu primeiro LP – “Desenhos” – hoje uma peça de colecionadorer foi gravado em janeiro de 1966. Nesse mesmo ano foi convidado a participar do Concurso Internacional de Viena, patrocinado pelo maestro e pianista austríaco Friedrich Gulda, obtendo o terceiro prêmio na categoria dos saxofonistas. Ficou quase um ano na capital austríaca. Ainda em 1966 foi considerado o melhor solista do Fest Jazz Berlin, o que lhe valeu receber uma bolsa de estudos para Berkley School of Music, que usaria em 1969. Com esses lauréis, retorna ao Brasil, ganha publicidade na imprensa pela repercussão de sua atuação na Europa e profissionaljza-se definitivamente, vislumbrando a possibilidade de tocar exclusivamente jazz. Em 1967 e 1968 apresentou-se continuamente com quartetos e quintetos nos teatros, clubes e universidades do Rio de Janeiro, estendendo suas atuações a outras capitais brasileiras. Ainda em 68 grava o disco “Trajeto”, outra raridade nos dias atuais. Ganha maior divulgação no noticiário jornalístico e toca em shows de televisão. Em 1969 foi vencedor do Festival de Montreux, sendo considerado o melhor saxofonista do festival. Seus parceiros foram Salvador ao piano, Hélio Delmiro na guitarra, Edilson Lobo no baixo e Edison Machado na bateria.
A seguir muda-se para os Estados Unidos, onde vai cursar a Berkley School of Music até 1974. Nos Estados Unidos tocou com Dizzy Dillespie, Jeremy Steig, Richie Cole, Clark Terry, Chick Correa, Ron Carter, Bob Mover e outros. Teve oportunidade de escrever arranjos de suas composições para todo tipo de formações orquestrais, ganhando inestimável experiência. Paralelamente, lecionou improvisação em geral na J. D. 5. School of Music, de Boston.
Em 1970 passou três meses de férias no Brasil, quando gravou dois LPs: um deles, Victor Assis Brasil toca Antonio Carlos Jobim, que marca sua estréia em discos no sax soprano, foi editado imediatamente. O outro, intitulado “Esperanto”, aguardou alguns anos para ver a luz do dia. Regressando definitivamente ao Brasil em 1974, reativou sua carreira, liderando seus combos em apresentações em várias cidades. Nesse mesmo ano gravou um disco em concerto, no Teatro da Galeria. No ano seguinte escreveu 4 composições para a trilha sonora da novela “O Grito”, inclusive o tema-título. Em 1976 foi convidado pelo regente Marlos Nobre a apresentar, em primeira audição no Brasil, sua composição “Suíte Para Sax Soprano e Cordas” com a Orquestra Sinfônica Brasileira, na Sala Cecília Meireles, do Rio de Janeiro.
O ano de 1977 foi um ano de muita atividade, incluindo concertos no Museu de Arte Moderna e na “Concha Verde”, do Rio. Uma das apresentações no MAM incluiu o flautista americano Jeremy Steig. Ainda em 77, foi convidado por Art Blakley a integrar os seus Jazz Messengers como diretor musical, porém foi obrigado a declinar o convite por não haver tempo hábil para contornar as exigências legais.
Em 1978 participou com inteiro êxito do Festival de São Paulo, quando entusiasmou o público, músicos e críticos, entre eles Chick Correa, Joe Farrell e Leonard Feather. Este último escreveu a seu respeito: “Victor Assis Brasil, um esplêndido saxofonista, não deixou que sua longa estada nos Estados Unidos confundisse seus valores, apresentando uma música firmemente plantada nos solos dos dois países. Seu “Love For Sale” recebeu um tratamento altivo, contagiante, jamais incerto em seu senso de direção”.
Victor foi um exímio músico, dotado de uma técnica invejável. Seus improvisos, muito criativos, eram de fraseado perfeito e bonito lirismo. Sabia interpretar uma melodia, sempre conseguindo uma excelente expressividade com um lindo timbre. Victor desenvolveu em cada trabalho uma atuação expressiva, criando em cada improvisação um clima apropriado ao contexto, estendendo através de suas frases uma torrente de idéias precisamente articuladas e superiormente construídas. No alto ou no soprano, a complexidade aparente de certas evoluções encerra uma lógica definida, cuja clareza resoluta é aparente aos que compreendem seu vocabulário. Ele não é somente um improvisador de nível internacional, mas transcendeu a esse estágio para situar-se entre os criadores do jazz, um músico cuja experiência, inventiva e bagagem musical empresta a cada solo a marca indelével de sua individualidade, desenvolvendo idéias com forma, propósito e beleza estética.

(Fonte: www.correiodopovo.com.br – ANO 116 – Nº 196 – Cronologia – 14 de abril de 2011)
(Fonte: www.assisbrasil.org – por José Domingos Raffaelli)

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