Sir Richard Francis Burton, explorador, espião e escritor britânico protagonizou algumas das maiores aventuras da História

0
Powered by Rock Convert

Sir Richard Francis Burton (Torquay, 19 de março de 1821 – Trieste, 20 de outubro de 1890), escritor, explorador, antropólogo, erudito, poeta, espião, espadachim – mais que uma figura histórica

Introdução sobre Sir Richard Francis Burton

Indiana Jones, o maior aventureiro da sétima arte, não passaria de um escoteiro se comparado a Sir Richard Francis Burton. Esse explorador, espião e escritor britânico protagonizou algumas das maiores aventuras da História, numa época cheia de homens brilhantes e intrépidos como o explorador David Livingstone, o cientista Charles Darwin e o coronel Percy Harrison Fawcett, em quem o herói cinematográfico teria se inspirado.

Richard Burton foi uma mistura de aventureiro e erudito, que durante o século 19 atuou como explorador, espadachim, agente secreto do governo inglês, se infiltrou disfarçado em lugares impensáveis para cristãos, como santuários muçulmanos, aprendeu 29 idiomas e dialetos, fez importantes descobertas antropológicas e científicas e foi poeta, tradutor e escritor.

Entre suas contribuições mais lembradas estão a descoberta da nascente do rio Nilo, na África, as traduções de “As Mil e Uma Noites” e do “Kama Sutra”, que publicou e distribuiu em segredo, e sua participação num complô para derrubar o xá da Pérsia. Durante a sua vida, o número de admiradores que conquistou foi proporcional ao número de inimigos que colecionou.

Os palcos de suas aventuras foram a África, a Ásia e a América do Sul, com uma passagem pelo Brasil, que resultou numa inédita navegação pelo rio São Francisco até o mar e no acompanhamento dos combates da Guerra do Paraguai, ao lado do duque de Caxias.

Burton não se preocupava em ser um exemplo para as criancinhas e era viciado em drogas, como o ópio e o haxixe, e um alcoólatra inveterado. Seus comentários sobre os costumes dos povos que conhecia também não respeitavam a cartilha do politicamente correto, o que resultou em relatos antropológicos importantes sobre a cultura muçulmana e a indiana, principalmente, e em duras críticas aos jesuítas, entre outras. Seu gosto por bordéis e prostitutas também o acompanhou desde a adolescência e contribuiu, junto com seu gênio irascível e seu hábito de desafiar colegas para um duelo, para a sua expulsão da Universidade de Oxford.

O mais incrível é que esse aventureiro libertário, espécie de anti-herói romântico, acabou casado com uma aristocrata puritana que se encarregou de destruir boa parte da obra original que Burton deixou ao morrer. A explicação para isso está na beleza de Isabel Arundell, sua esposa católica e moralista, que segundo os relatos da época era capaz de encantar e levar à loucura até o mais abnegado dos homens. Na próxima página, conheça como foram as primeiras aventuras dele.

Richard Burton: as primeiras aventuras

Richard Francis Burton nasceu em 19 de março de 1821 em Torquay, Devonshire, na Inglaterra. Seu pai era um militar do exército britânico que teve de se aposentar cedo em função de problemas de saúde. Na ascendência dos Burton havia irlandeses, ingleses e possivelmente franceses, mas a aparência de Richard desde criancinha trazia traços ciganos. A asma de seu pai levou os Burton a morar na França e na ensolarada Itália, o que contribuiu para a incrível aptidão que Richard mostraria no domínio de idiomas e na expectativa de sua família dele ser uma criança-prodígio.

Mas, além das línguas, ele mostrou outra importante habilidade desde muito jovem. Apesar dos professores rigorosos e da exigência no estudo de disciplinas tradicionais e importantes para os jovens ingleses da época, como o latim, a dança e a música, Richard e seu irmão Edward tinham um interesse especial por armas. Foi nessa época que ele começou a manifestar seu caráter bélico, quando por exemplo quis matar um porteiro por ele simplesmente ter feito piadas sobre suas armas de brinquedo e nas constantes brigas com outros garotos ingleses e franceses. Essa faceta rude de Richard era compensada por um lado doce em sua natureza, que se manifestava principalmente na admiração que tinha pela mãe. Mas,o que predominou no fim da infância foi uma personalidade delinquente que resultava em pequenos furtos nas lojas, tiros em monumentos com a espingarda que roubara do pai e em obscenidades ditas para as moças.

Na adolescência, na Itália, além da esgrima, aprendida com um professor francês que tinha participado das Guerras Napleônicas, outros grandes interesses de Richard e seu irmão foram a prática de tiros com a pistola, as bebidas e as prostitutas. Com esse histórico, Richard foi enviado pelo pai para o Trinity College, na Universidade de Oxford, em 1840. Àquela altura, ele já era fluente em francês, latim, grego e em dialetos italianos e franceses. A vivência no exterior e as farras que pode desfrutar por lá, contrastando com o puritanismo da Inglaterra vitoriana, fazia Richard afirmar que a Inglaterra era o único lugar no mundo onde ele não se sentia em casa.

Sua estadia em Oxford foi curta. Dois anos de serviços religiosos obrigatórios, monotonia, comida ruim e convivência com estudantes e professores medíocres, quando comparados aos seus talentos e conhecimentos, foram preenchidos com muita indisciplina, provocações, visitas a acampamentos ciganos e um interesse por filosofia e misticismo, como a cabala e a astrologia. Em 1842, ele acabou expulso de Oxford e sem perder tempo, após aprender uma língua hindu, realizou seu sonho de infância, e que o pai não aceitava, de iniciar uma carreira militar. Partiu para Bombaim, na Índia, para lutar contra os afegãos e foi designado para o 18.° Regimento de Infantaria da Companhia das Índias Orientais.

Quando Burton partiu para a Índia estava em curso uma disputa entre Rússia e Inglaterra pelo controle dos territórios da Ásia Central e Ocidental, que incluíam as terras do antigo império Persa. Ao chegar lá ele começou a fazer anotações sobre aquele mundo oriental exótico e exuberante, que se tornariam importantes relatos etnológicos. Logo suas habilidades o fizeram um dos oficiais favoritos de Sir Charles James Napier, comandante das forças inglesas. Ele tornou-se um oficial da inteligência britânica e disfarçado de mercador muçulmano passou a espionar nos bazares. Assim como outros oficiais ingleses, ele também passou a ter amantes indianas – muçulmanas ou hindus – e provavelmente deixou por lá uma prole de mestiços.

Mas um de seus relatórios sobre um bordel homossexual frequentado por soldados ingleses e meninos indianos era tão explícito que foi desastroso para ele e seu comandante. Mandado de volta, Richard passou um tempo vivendo com a mãe e a irmã em Boulogne, na França, onde escreveu quatro livros sobre a Índia, entre eles um brilhante estudo etnológico chamado “Sindh e as Raças que Habitam o Vale dos Hindus”, e conheceu a jovem católica Isabel Arundell, que viria a ser sua esposa. Nesse período ele também finalizou um mirabolante plano que tinha em mente havia anos e que se tornaria uma de suas grandes aventuras, como veremos na página a seguir.

Richard Burton: as grandes aventuras
Em 1853, o capitão Richard Francis Burton colocou em prática um plano que vinha desenvolvendo há muito tempo. Interessado em fazer uma grande exploração da Arábia, ele partiu do porto de Southampton, na Inglaterra, disfarçado de príncipe persa rumo ao Cairo, no Egito. No caminho treinou os hábitos e jeitos árabes e leu o Alcorão. Ao chegar, mudou seu disfarce e caracterizou-se como um afegão muçulmano. De lá, passou por Suez e foi até a cidade sagrada de Medina, onde Maomé mais de mil anos antes desenvolveu os pilares do Islã. Burton viajou através de uma rota infestada de bandidos para Meca e conseguiu entrar num dos lugares mais sagrados para o Islamismo, o santuário de Caaba, para onde anualmente milhões de muçulmanos peregrinam para realizar suas orações.

A viagem foi financiada pela Royal Geographic Society, de Londres, e Burton realizou uma das melhores investigações etnográficas até então sobre o mundo árabe. Sua erudição e sofisticação resultaram em comentários valiosos sobre o cotidiano e os costumes dos muçulmanos, especialmente durante a peregrinação anual rumo a Meca. Apesar de ter cumprido seu objetivo, Burton não estava satisfeito. Em vez de retornar a Londres, partiu em direção a outro local proibido a não-muçulmanos: a cidade de Harar, localizada a quase dois mil metros de altitude na Etiópia. Ele tornou-se o primeiro europeu a entrar na cidade e sobreviver para contar o que viu.

Foi durante essa viagem que ele teve a ideia de uma outra grandiosa aventura: descobrir a nascente do rio Nilo. A primeira tentativa em 1855 fracassou quando sua expedição foi atacada por guerreiros africanos na Somália e ele foi seriamente ferido por uma lança que atravessou seu maxilar. Após se recuperar em Londres, ele foi para a Crimeia como voluntário lutar na guerra contra a Rússia. Com o fim da luta, ele retomou sua busca pela fonte do Nilo.

A expedição que liderou partiu de Zanzibar em 1857 e sofreu todos os infortúnios que a natureza africana podia infringir. Ao alcançar o lago Tanganica em 1858, Burton estava tão enfraquecido pela malária que mal podia caminhar. Quase desistindo da busca, ele foi convencido pelo seu companheiro na aventura africana, o explorador John Hanning Speke, a seguir para o nordeste antes de retornarem para Londres. Nessa rota, eles finalmente alcançaram a nascente do rio Nilo no maior lago africano, que recebeu o nome de Vitória em homenagem à rainha inglesa. Só que os méritos da descoberta ficaram com Speke que voltou antes para a Inglaterra.

Em 1860, Burton partiu para os Estados Unidos e passou um tempo vivendo em Salt Lake City, a “cidade dos mórmons”, e no seu retorno a Inglaterra, em janeiro do ano seguinte, casou-se secretamente com a aristocrata Isabel Arundell. Após o casamento, Burton iniciou uma carreira diplomática que não o impediu de fazer várias viagens curtas de exploração, principalmente na África Ocidental. Essas explorações o levaram a descrever vários costumes e rituais tribais da região, incluindo canibalismo e práticas sexuais bizarras, que muito contribuíram para os estudos antropológicos modernos.

Entre 1865 e 1869, ele serviu como cônsul britânico no Brasil. Foi quando começou sua tradução de “Os Lusíadas”, do poeta português Luis de Camões, por quem tinha uma grande admiração, e também dos contos folclóricos indianos “Vikram e o Vampiro”. Nem essas atividades, nem o abuso do álcool ajudaram a diminuir a aversão que ele sentia pela vida que levava no Brasil. Sua esposa ficou encarregada de usar os bons contatos familiares que tinha para lhe conseguir um posto no Oriente Médio. Burton foi nomeado então cônsul em Damasco, na Síria. Sua paixão pela cultura árabe, no entanto, não foi suficiente para evitar que as indiscrições de sua esposa católica resultassem em uma intriga dos muçulmanos que levaram a sua demissão em 1871.

No ano seguinte, ele foi nomeado diplomata na cidade italiana de Trieste, que naquela época fazia parte do Império Austro-Húngaro. Lá revelou-se um excepcional tradutor e publicou várias obras que mostravam sua paixão pela arqueologia e antropologia, além de narrarem suas grandes aventuras. Foi em sua temporada em Trieste que ele traduziu e publicou sem cortes uma edição com 16 volumes de “As Mil e Uma Noites”, que foi um marco pela sua fidelidade ao original e pela força literária do texto em inglês. Em fevereiro de 1886, os serviços de Burton a Sua Real Majestade foram reconhecidos e ele foi condecorado como Cavaleiro de São Miguel e São Jorge pela rainha Vitória.

Sir Richard Francis Burton morreu em 20 de outubro de 1890 em Trieste aos 69 anos de idade. Após sua morte, sua esposa temendo pela imagem do marido num mundo regido pela moral vitoriana queimou quase todos os diários e anotações que Burton fez durante 40 anos, um ato que representou uma tragédia para a antropologia, para os estudos históricos e para todos aqueles que seriam inspirados pelos detalhes das aventuras de Burton.

(Fonte: http://pessoas.hsw.uol.com.br – Biografia de Sir Richard Francis Burton/ Por Sílvio Anaz – Sociedade e Cultura > História)

Powered by Rock Convert
Share.