Richard Morse, foi um dos mais importantes estudiosos norte-americanos da história do Brasil

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Richard Morse era o brasilianista do espelho

Richard M. Morse (Nova Jersey, em 26 de junho de 1922 – Petionville, no Haiti, 17 de abril de 2001), rebelde, iconoclasta e anárquico, ele esteve muito mais próximo da América Latina, tanto no plano intelectual como pessoa.

Morse foi historiador, formado em História pela Universidade de Princeton, foi professor de História da Universidade de Yale e ex-secretário do Latin American Program do Wilson Center, centro de estudos afiliado ao prestigiado Smithsonian Institute, de Washington, e era um dos mais importantes estudiosos norte-americanos da história do Brasil.

No fim dos anos 40, veio pela primeira vez ao Brasil, e escreveu um trabalho acadêmico intitulado Formação Histórica de São Paulo, foi sua primeira tese universitária, publicada em português.

Os vínculos de Morse com a América Latina remontam mais de quarenta anos e nasceram por acaso. “Eu era jovem, queria ir para Paris, mas a Europa estava em guerra e os alemães ameaçavam entrar na cidade”, lembra o historiador. “Fui para Cuba, fiquei dois meses e adorei.”

Pouco depois, o historiador arrumou uma bolsa de estudo e foi ao Chile e, logo em seguida, ao México. “Só interrompeu suas andanças para servir na Marinha, durante a II Guerra Mundial, no Pacífico. “Como sobrevivi aos japoneses e aos furacões, voltei aos Estados Unidos em 1946 para estudar História e Cultura latina na Universidade Colúmbia”, disse Morse. No total, o historiador calculou que, em viagens intercaladas, viveu nove anos em países latino-americanos.

Richard Morse nasceu em Nova Jersey, em 26 de junho de 1922, apesar da origem branca, anglo-saxã e protestante (as origens de sua família remontam a 1635), e seu ensaio “O Espelho de Próspero” é um mergulho no sentimento de inferioridade do ibero-americano.

 

Ensaio de teses tropicalistas

 

Richard M. Morse, que, ao escrever O Espelho de Próspero, deixou de lado a preocupação de situar o contexto histórico na sua discussão a respeito da cultura das Américas do Norte e do Sul e deu vazão à torrente da consciência.

Mas, para além dos estereótipos da Anglo-América, protestante e democrática, em oposição à Ibero-América, católica e autoritária, o ensaísta montou um intrincado jogo de oposições entre os povos do continente. Para tanto, deixou de lado as diferenças de colonização para recuar até o século XII, detectando formações culturais diversas na Europa.

Até chegar ao presente, num trajeto bastante pessoal, Morse passa por teólogos medievais, vê no poeta e visionário William Blake um herético no mundo saxão, discute a adesão de Euclides da Cunha ao marxismo e compara a metrópole moderna na poesia de Mário de Andrade e na de T.S. Eliot.

Ao longo de todo O Espelho de Próspero, uma evidente simpatia pelos modos de pensar e agir da América ibérica se faz presente. Morse demonstra que, nos Estados Unidos, sob uma aparência de pluralismo democrático, reina na verdade uma única orientação política e ideológica.

Ao passo que na América Latina, com sua história de autoritarismos, há opções mais ricas para o futuro. Baseou-se no seu otimismo quanto ao vigor latino-americano, ao assemelhar-se a uma simpatia subjetiva transformada em filosofia da História.

O pêndulo da comparação a espelhar o ângulo protestante e o latino-católico, de que resultou a fama de Richard Morse como intelectual malucão, porque apontava que o lance civilizatório estava aqui no Sul, e não no Norte, embora tivesse sido escolhido para dirigir a Fundação Ford, instituição norte-americana que apadrinhara o Cebrap pré-tucano nos finais dos anos 60.

Embora nunca tenha fixado residência no Brasil, Richard Morse manifestava mal-estar em relação à cultura anglo-americana. Ele não tolerava a mulher excessivamente autodisciplinada. A manipulação protestante do afeto não compensaria a riqueza de mercadorias.

Tomando o partido do cubano José Martí, Richard Morse acusou os Estados Unidos de fragmentarem a compreensão da “Nuestra America”, mas o desejo de Morse era conectar as duas Américas: a do Sul e a do Norte.
Richard Morse denunciou a burrice ibero-americana: a de se achar obsoleta.

Morse não gostava do rótulo de “brasilianistae tinha dificuldades para publicar nos Estados Unidos porque, segundo ele “tratava a América Latina e os Estados Unidos da mesma forma, num mesmo plano, o que é absolutamente inconcebível para um editor americano”.

A rigor, não importou muito que assim seja – a força de O Espelho de Próspero está na originalidade das ideias de Morse, na ruptura dos estereótipos sobre as relações Norte-Sul na América e no turbilhão de indagações que suas teses deflagraram.

Richard Morse morreu em Petionville, no Haiti no dia 17 de abril de 2001, casado com uma mulher negra haitiana, a cantora e dançarina Emerante de Pradines.

(Fonte: Veja, 16 de março de 1988 – ANO 20 – Nº 11 – Edição 1019 – LIVROS – Pág: 82/84)

(Fonte: http://cultura.estadao.com.br/noticias/geral – 20010420p3441 – CULTURA – AGENCIA ESTADO – 20 Abril 2001)

(Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq0305200109 – GILBERTO FELISBERTO VASCONCELLOS, ESPECIAL PARA A FOLHA – MEMÓRIA – FOLHA DE S.PAULO ILUSTRADA – 3 de maio de 2001)

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Gilberto Felisberto Vasconcellos é professor da Universidade Federal de Juiz de Fora e autor de “O Cabaré das Crianças”, entre outros.

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