Manoel de Moraes, padre jesuíta culpado por traições e heresias que o Santo Ofício quis esclarecer.

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Manoel de Moraes, padre jesuíta culpado por traições e heresias que o Santo Ofício quis esclarecer. A complexidade de vidas submetidas a conflitos e guerras, ao trânsito entre o Velho e o Novo Mundo e as mediações culturais entre holandeses e portugueses, índios e negros.
Nascido provavelmente na última década do século XVI, em São Paulo, o jesuíta era mameluco e filho de bandeirante. Estudou na Casa de São Paulo em Piratininga e de lá foi enviado ao Colégio da Bahia. No Recôncavo, aprimorou a educação espiritual, adotando a carreira religiosa. Graças as suas grandes qualidades de missionário, foi mandado para uma das mais prósperas capitanias açucareiras do Brasil, Pernambuco, para atuar entre índios tabajaras e potiguaras. Logo se tornou superior da Companhia no aldeamento de São Miguel de Muçuí. Durante a invasão holandesa, Manoel integrou a linha de defesa erigida pelos jesuítas contra o avanço dos flamengos. Liderando tropas nativas, entre 1630 e 1634, lutou ao lado de Felipe Camarão e caiu prisioneiro dos holandeses na Paraíba. Em decorrência de seus feitos militares, conquistou, mais do que glórias, desafetos. Entre eles, os seus irmãos jesuítas e a oficialidade portuguesa. Sem recompensa, resolveu não só se entregar aos batavos como lhes repassar preciosas informações sobre os territórios a ser conquistados. Tinha início uma nova fase de sua existência, em que ele passa “a seita de Calvino”, renegando o catolicismo.
Não foi o único a trair, um emaranhado de cumplicidade e deslealdades marcou o tempo dois flamengos entre nós, sendo Calabar o exemplo mais conhecido. Na Holanda, Manoel se tornou funcionário da Companhia das Índias, além de ter se casado duas vezes. Mesmo vivendo bem entre os calvinistas, tornou ao catolicismo, assistindo a missa as escondidas. Enquanto isso, o Santo Ofício de Lisboa somava as denúncias apresentadas contra o antigo jesuíta. E foram muitas. “Queimadas em estátua”, em praça pública de Lisboa, seus problemas mais sérios tiveram início. Perseguido por ter se casado duas vezes com “heréticas”, ora agradando as autoridades portuguesas, ora as holandesas, Manoel se enredou cada vez mais numa trama de equívocos que muito serviu aos seus detratores. Na verdade, tentava vender seus serviços a quem pagasse mais. Julgado pelo Tribunal do Santo Ofício, foi torturado e obrigado a sair num auto-de-fé. O pior foi ter os bens confiscados. Seu fim, ninguém sabe, ninguém viu. Expulso da história, entrou na literatura e virou personagem de vários romancistas.

(Fonte: Veja, 18 de junho, 2008 – Livros/Por Mary Del Priore – Edição 2065 – ano 41 – n° 24 – Editora Abril – Pág; 156)

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