La Belle Otéro, estrela de palcos da Belle Époque, considerada a primeira estrela do cinema

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Considerada a primeira “estrela” do cinema

La Belle Otéro (San Miguel de Valga, Pontevedra, na Galícia,1868 – Nice, França, 1965) linda, culta, interesseira, e cortesã, seduziu Paris e estraçalhou uma fileira de corações masculinos na Belle Époque – o período de glamour e deslumbramento vivido pela Europa entre o final do século 19 e o início da 1ª Guerra Mundial. Chamavam-na de Sereia do Suicídio, pois levou sete homens ao suicídio “por não terem dinheiro suficiente para fazê-la feliz”.

Foi amante de seis soberanos poderosos: Afonso XIII da Espanha, Alberto I de Mônaco, do então futuro rei Eduardo VIII da Inglaterra, de Guilherme II da Alemanha, Leopoldo II da Bélgica e Nicolau II da Rússia, bem como do industrial Jules-Albert de Dion, pioneiro da indústria automobilística francesa, do multimilionário americano Joseph Patrick Kennedy (pai do presidente John) e, conforme os mexericos, do pintor francês Pierre-Auguste Renoir, do escritor italiano Gabriele D”Annunzio e do poeta cubano José Martí.

Paris era uma festa e o Maxim’s – o restaurante grã-fino que virou ponto de paquera, na rue Royale, 3 – seu tonitruante salão. Abria às 17 horas, para os aperitivos; servia o jantar das 20 às 22 horas; a ceia ia até a madrugada. Nobres e plebeus, todos milionários, desacompanhados das esposas, noivas e namoradas, apareciam para refeições suntuosas e, sobretudo, para entabular romances e queimar fortunas com as cortesãs mais cobiçadas do mundo. Ali estava La Belle Otéro, tão carregada de jóias que, segundo a maledicência das rivais, ‘caminhava apoiando-se nas mesas’. Na vitrine parisiense da joalheria Cartier ficou exposto por vários dias o valiosíssimo bolero de diamantes que ela recebeu de um admirador. A competição entre as cortesãs era furiosa. Émilienne d’Alençon, por exemplo, não suportava a ostentação de La Belle Otéro. Uma noite, deu-lhe uma estocada: ingressou no Maxim’s sem nenhum colar, brinco ou pulseira, seguida apenas pela criada, que carregava um cofre com suas jóias preciosas.

As cortesãs não eram prostitutas convencionais, pois nunca moravam em bordéis e nem se entregavam a qualquer homem. Tinham instrução, falavam línguas, revelavam-se atenciosas, vestiam-se na moda, sabiam beber e comer bem. Além disso, exerciam um ofício paralelo. Geralmente eram dançarinas, cantoras ou atrizes. La Belle Otéro exerceu as três profissões. Foi bailarina profissional, cantava bem e, na condição de atriz, destacou-se nos palcos. Exibiu-se no cabaré Folies Bergère e no Cirque d’Été. Quando surgia no Maxim’s, os outros paravam de conversar para contemplá-la. Pedia champagne, sua bebida favorita. Sentada à mesa, saboreava pratos especiais criados pelo chef. Um deles, selle d’agneau (carré duplo de cordeiro) Belle Otéro, teve a receita publicada na enciclopédia Larousse Gastronomique. Auguste Escoffier, que também cozinhou para a cortesã, incluiu os filets de sole (filés de linguado) Otéro no seu Le Guide Culinaire, o livro de ouro da culinária da Belle Époque.

La Belle Otéro atraía clientes generosos. Nicolau II dava-lhe uma jóia rara a cada encontro; De Dion ofereceu-lhe seu último modelo de automóvel; Renoir, um retrato; Martí, um poema. A rainha do Maxim’s abdicou da coroa em 1914, aos 46 anos de idade, após amealhar uma fortuna equivalente a 15 milhões, em valores atuais. Entretanto, sendo viciada em jogo, incinerou-a nos cassinos de Monte Carlo e Nice, onde viveu os últimos anos e morreu na miséria. Sustentava-se com a modesta pensão concedida pelos locais nos quais perdera o dinheiro. Até o último dia, mentiu sobre sua origem. Dizia-se natural da Espanha, o que era verdade, porém inventava ter nascido com o nome de Carolina Otéro, em Cádiz, na região da Andaluzia, filha de uma cigana com um homem de negócios grego. Na verdade, sua terra natal era a pequena San Miguel de Valga, perto de Pontevedra, na Galícia, e se chamava Agustina Otéro Iglesias. Ainda criança, transferiu-se com a mãe, camponesa pobre, solteira e assanhada, para Santiago de Compostela. Inicialmente, ganhou a vida como empregada. Ao 10 anos foi estuprada, hospitalizada e ficou estéril. Quando atingiu os 14 anos fugiu para Portugal e ingressou em Lisboa numa companhia de cômicos ambulantes. A seguir, dançou em lugares de má reputação e exerceu a prostituição. Em 1888, atuando em Barcelona, conheceu um banqueiro que se apaixonou por ela e a levou a Marselha. Logo o abandonou e mudou para Paris, onde deu um salto. Explorando seu ‘exotismo’ espanhol, converteu-se em diva noturna, aplaudida tanto em Paris como nas excursões pela Europa e América. Deve ter sido a primeira estrela do cinema. Em agosto de 1898, enquanto se apresentava na cidade russa de São Petersburgo, La Belle Otéro foi filmada por um minuto pelo operador cinematográfico Félix Mesguich, que trabalhava para os Irmãos Lumière. Ao assistirem a sua dança sensual, pessoas comuns que não costumavam freqüentar ambientes permissivos ficaram escandalizadas.

(Fonte: www.estadao.com.br – A rainha cortesã do Maxim”s/ Por Dias Lopes – O Estado de S.Paulo – 22 de novembro de 2007)

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