Joseph Losey, o mais requintado marxista do cinema depois do aristocrático Visconti.

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Joseph Losey (1909-1984), requintado diretor norte-americano, o mais requintado marxista do cinema depois do aristocrático Visconti.

Joseph Losey foi aluno de Brecht na Alemanha, o que fica evidente em sua adaptação de Galileu Galilei para o cinema. A peça de Brecht ganhou o título de A Vida de Galileu (Galileo, 1947).

O filme é um dos seis títulos do diretor que o Instituto Moreira Salles (IMS) selecionou para a Mostra Joseph Losey, que começou em 25 de outubro de 2013 no Rio de Janeiro com a exibição de Cerimônia Secreta (Secret Ceremony, 1969), O Menino de Cabelos Verdes (1948), O Maldito (1951), Eva (1952) e O Assassinato de Trotski (1972).

Os dois filmes pertencem a duas fases distintas de Losey, a primeira caracterizada por parábolas políticas e densas reflexões sobre indivíduos socialmente acossados por sua diversidade – seja um garoto cujos cabelos mudam de cor em O Menino de Cabelos Verdes ou um gênio como Galileu, perseguido por pensar de maneira diferente de seus pares.

A segunda é marcada pela investigação psicológica de personagens nada edificantes. Coincidentemente, começa quando Losey decide fixar residência na Europa, após sua vida se tornar insuportável nos EUA. Perseguido pela caça aos comunistas comandada pelo senador McCarthy, o cineasta, filiado ao PC americano desde 1946, finalmente optou pelo autoexílio na Inglaterra, em 1953.

Essa mudança não significou o abandono da luta contra a desigualdade social. Tampouco a abjuração de seu passado marxista. Filmes como O Criado (The Servant, 1961) evidenciam seu gosto pela metáfora política e inclinação por personagens fora do eixo, oriundos de segmentos sociais menos favorecidos, em busca de vingança contra a classe dominante.

O Criado é um ritualístico jogo de espelhos sobre os males da servidão. Nele, Losey confronta um jovem aristocrata e seu mordomo, que o seduz e conduz ao precipício social, afastando a noiva do patrão, tomando seu lugar e transformando a casa num sucedâneo de bordel.

Essa inversão de papéis é aprofundada em Cerimônia Secreta, história da prostituta Leonora (Elizabeth Taylor), que perdeu a filha e se envolve com a desequilibrada Cenci (Mia Farrow). A garota vê em Leonora uma projeção da mãe. A prostituta, por conveniência, aceita o jogo, recebendo em troca um convite para morar em sua mansão. Uma relação mórbida evolui entre as duas, culminando no súbito aparecimento do incestuoso padrasto, ansioso por se reaproximar da filha.

Todos usam e são usados nesse jogo de gato e rato. Isso até a parábola do final, em que a prostituta, aparentemente a vitoriosa, conta para o público a história resumida da luta de classes: “Dois ratos caem num pote de leite. Um deles grita por socorro e se afoga. O outro não para de se agitar até a manhã, quando acorda sobre um pote de manteiga”.

Considerando as dimensões épicas do brechtiano A Vida de Galileu, o cientista, mesmo tendo renegado suas teses quando convocado pelo Vaticano, acordou em cima do pote. Losey adaptou a peça de Brecht para os palcos americanos e convocou Topol para fazer o papel do cientista no cinema.

Embora relativamente fiel à vida de Galileu, Losey carrega nas lições do teatro brechtiano – especialmente no distanciamento, dificultando o envolvimento emocional do espectador ao colocar em cena um coro de meninos, que surge em primeiro plano comentando a ação. Há quem defenda, porém, que Losey foi essencialmente um trágico. Ele, contudo, sempre duvidou. “São as histórias que são trágicas, histórias de um fracasso e da destruição humana.”

(Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer – NOTÍCIAS – CULTURA/ Por Antonio Gonçalves Filho – O Estado de S. Paulo – 24 de outubro de 2013)

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