Edmund Husserl, fundador da Fenomenologia, um método para a descrição e análise da consciência.

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Edmund Husserl (Proßnitz, 8 de abril de 1859 – Friburgo, 26 de abril de 1938), educador e filósofo alemão, mestre de Herbert Marcuse (1898-1979), último grande marxista contemporâneo.
(Fonte: Veja, 8 de agosto de 1979 – Edição n° 570 – Ideias – Pág; 121/122)

Edmund Husserl, filósofo alemão fundador da Fenomenologia, um método para a descrição e análise da consciência através do qual a filosofia tenta alcançar uma condição estritamente científica. Nasceu a 8 de abril de 1859 em Prossnitz, Moravia, no então Império Austríaco, hoje Prostejov, na República Checa, e faleceu em 27 de abril a 1938 em Freiburg im Breisgau, na Alemanha. De origem judaica, completou os primeiros estudos em um ginásio público alemão, na cidade próxima, Olmütz (Olomouc), em 1876. Em seguida estudou física, matemática, astronomia e filosofia nas universidades de Leipzig, Berlim, e Vienna. Nesta última passou sua tese de doutorado em filosofia em 1882, com o tema Beiträge zur Theorie der Variationsrechnung (“Contribuição para a Teoria do cálculo de variáveis”). No outono de 1883, Husserl seguiu para Vienna para estudar com o filósofo e psicólogo Franz Brentano. Em Viena Husserl converteu-se à fé evangélica luterana e, um ano depois, em 1887, casou com Malvine Steinschneider, a filha de um professor do ensino secundário de Prossnitz. Esposa energética e competente, ela foi um indispensável apoio para Husserl até a morte dele.

Em 1886 Husserl, com uma recomendação de Brentano, procurou Carl Stumpf, o mais velho dos estudantes de Brentano, do qual se tornaria amigo íntimo, e que era professor de filosofia e psicologia na universidade de Halle. Nesta universidade Husserl passou o concurso para professor conferencista em 1887.

O tema da tese de habilitação foi Über den Begriff der Zahl: Psychologische Analysen (“Sobre o conceito de número: análise psicológica”), o que mostra sua transição da pesquisa matemática para uma reflexão sobre as bases psicológicas dos conceitos básicos da matemática. A tese foi uma versão desenvolvida depois no seu Philosophie der Arithmetik: Psychologische und logische Untersuchungen, cujo primeiro volume apareceu em 1891.

O título de sua conferência inaugural em Hale, onde ensinou de 1887 a1901, foi Über die Ziele und Aufgaben der Metaphysik (“Sobre os objetivos e problemas da metafísica”). O objeto tradicional da metafísica é o estudo do Ser. O texto se perdeu, mas é provável que nele Husserl já apresentasse seu método de análise da consciência como o caminho para uma nova e universal filosofia e uma nova metafísica.

Para ele a base filosófica para a lógica e a matemática precisa começar com uma analise da experiência que está antes de todo pensamento formal. Isto obrigou-o a um intenso estudo dos empiristas ingleses John Locke, George Berkeley, David Hume, e John Stuart Mill, e familiarizar-se com a terminologia da lógica e semântica derivada daquela tradição, especialmente a lógica de Mill.

Essa integração de suas idéias com o pensamento empirista levou-o às concepções apresentadas em sua famosa obra Logische Untersuchungen (1900-01; “Investigações lógicas”), onde apresentou o método de análise que chamou “fenomenologico”.

Após a publicação do Logische Untersuchungen, Husserl foi convidado a lecionar na universidade de Göttingen, onde permaneceu de 1901 a 1916.

Em seu esforço de pesquisa, Husserl chegou a um extremo: anotava todos os movimentos de seu pensamento. Durante sua vida produziu mais de 40.000 páginas estenografadas no método Gabelberger.

Nos seus anos em Göttingen, Husserl rascunhou as linhas gerais da fenomenologia como uma ciência filosófica universal. Seu princípio metodológico fundamental era o que chamou “redução fenomenológica”. Preocupava-se com a experiência básica da consciência, não interpretada, e a questão do que é a essência das coisas, a “reducão eidética”.

Por outro lado, é também a reflexão sobre as funções pelas quais as essências se tornam conscientes. Sob esse aspecto, a redução revela o Eu para o qual todas as coisas têm sentido. Assim, a fenomenologia assumiu o caráter de um novo estilo da filosofia transcendental, o qual repetia e aperfeiçoava, em uma maneira moderna, a mediação de Kant entre o empirismo e o racionalismo.

Husserl apresentou seu programa e delineamento sistemático em Ideen zu einer reinen Phänomenologie und phänomenologischen Philosophie (1913; Idéias;Introdução geral à fenomenologia pura”), obra cuja segunda parte não pode completar devido a romper a Primeira Guerra Mundial. Husserl pretendia que esse trabalho fosse um manual de estudo para seus alunos, mas estes ficaram indiferentes. A maior parte deles considerou a virada de Husserl para a filosofia transcendental como um passo atrás, uma volta ao velho sistema de pensamento e o rejeitaram. Devido a essa reviravolta e à guerra, o movimento fenomenológico se desfez.

Sua posição junto aos colegas em Göttingen era sempre difícil. Sua nomeação para catedrático em 1906 havia resultado de uma decisão do ministro da educação contra a vontade do corpo de professores.

Assim, quando foi convidado em 1916 para catedrático na universidade de Freiburg, isto significou um novo começo para Husserl sob todos os aspectos. Sua aula inicial sobre Die reine Phänomenologie, ihr Forschungsgebiet und ihre Methode (“Fenomenologia pura, sua área de pesquisa e seu método”) definia seu programa de trabalho.

Neste sentido ele havia lançado em suas aulas sobre Filosofia Primeira (1923-24) a tese de que a Fenomenologia, com seu método de redução, é o caminho para a absoluta justificação da vida, ou seja, para a realização da autonomia ética do homem.

Com essa tese, ele continuou a elucidação da relação entre a análise psicológica e a analise fenomenológica da consciência e sua pesquisa quanto ao embasamento da lógica, que ele publicou como Formale und transzendentale Logik: Versuch einer Kritik der logischen Vernunft (1929; Lógica formal e transcendental).

Reconhecimento vindo de fora não faltou. Em 1919 a Universidade de Bonn conferiu-lhe o título de Doutor honoris causa. Muitos visitantes estrangeiros compareciam aos seus seminários, entre eles Rudolf Carnap, figura de proa do Círculo de Vienna, onde nasceu o Positivismo lógico.

Fez palestras na Universidade de Londres (1922), na universidade de Amsterdã e, mais tarde, em 1930, na Sorbone. Deixou de aceitar um convite da prestigiosa universidade de Berlim a fim de poder dedicar todas as suas energias à Fenomenologia. Estas palestras foram aproveitadas em uma nova apresentação da Fenomenologia, que então apareceu com tradução francesa sob o título Méditations cartésiennes (1931).

Quando ele aposentou em 1928, Martin Heidegger, que haveria de tornar-se um expoente do existencialismo e um dos mais importantes filósofos alemães, foi seu sucessor. Husserl o havia considerado seu herdeiro legítimo. Somente mais tarde viu que a principal obra de Heidegger, Sein und Zeit (“O ser e o tempo”), de 1927, havia dado à Fenomenologia uma reviravolta que a levaria para um caminho totalmente diferente. Seu desapontamento fez que seu relacionamento com Heidegger esfriasse depois de 1930.

Com a chegada ao poder de Adolf Hitler em 1933 ele foi excluído da universidade. Porém recebia a visita de filósofos e intelectuais estrangeiros. Condenado ao silêncio na Alemanha, ele recebe, na primavera de 1935, um convite para falar para a Sociedade Cultural em Viena, onde discursou por duas horas e meia sobre Die Philosophie in der Krisis der europäischen Menschheit (“A filosofia na crise da humanidade europeia “) palestra que repetiu dois depois. Desta conferência e de outras que fez em Praga surgiu seu último trabalho Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie: Eine Einleitung in die phänomenologische Philosophie (“A crise da ciência europeia e a fenomenologia transcendental: uma abordagem da filosofia fenomenológica”), de 1936, da qual somente a primeira parte veio a público em um periódico para emigrantes.

Enfermo a partir de 1937, disse desejar morrer de modo digno de um filósofo “Eu vivi como um filósofo – disse -, e eu quero morrer como um filósofo”. Por não ser comprometido com nenhum credo em particular, ele respeitava toda crença religiosa autêntica.

Seu conceito de auto-responsailidade filosófica absoluta ficava perto do conceito protestante da liberdade do homem em sua relação imediata com Deus. Na verdade, é evidente que Husserl caracterizava a manutenção da redução fenomenológica não apenas como um método mas também como uma espécie de conversão religiosa. Ele morreu em abril de 1938 e suas cinzas foram enterradas no cemitério em Günterstal, perto de Freiburg.

FILOSOFIA

Husserl achava que os filósofos estavam complicando a teoria do conhecimento, em lugar de considerarem com objetividade o fenômeno da consciência como é experimentado pelo homem. O que importava, para ele, era o que se passava na experiência de consciência, através de uma descrição precisa do fenômeno. Por isso deu o nome de “fenomenologia” à sua teoria que deveria ser uma ciência puramente descritiva, para somente depois passar a uma teoria transcendental à experiência, o seja, para além do método cientifico.

As teorias do conhecimento de Descartes e de Kant tinham um defeito insanável, em seu entender. Era o fato de faltar qualquer certeza de que o que aparece na consciência correspondesse inteiramente ao real. O que havia era uma “pressuposição” de que aquilo que estava na consciência guardava relação de alguma sorte com os objetos correspondentes do mundo exterior. A filosofia, a mais fundamental das ciências, devia ficar livre de suposições. Pensar o mundo somente poderia ser feito depois de bem examinado como esse mundo é matéria no campo da consciência. Em sua opinião não adiantava em nada discutir uma teoria do conhecimento sem esse primeiro passo, pois o que tinha existência verdadeira e assegurada eram os fatos da consciência. Husserl colocaria qualquer problema filosófico tradicional entre aspas, para ser examinado somente após estar completa a descrição fenomenológica. A isto chamou criar uma “época” para a questão em exame.

Chamou “redução transcendental” a esta redução da coisa aos detalhes da sua apreensão como fenômeno da consciência propriamente; significava retirá-la de uma visão teórica, transcendente, para tomar conhecimento dela de modo preciso e objetivo, analítico, como simples experiência de consciência. No entanto, na primeira fase do desenvolvimento da sua doutrina, Husserl não partia daí para descrever o “Eu” ou o que a consciência era, mas sim para estudar as idéias, os vários tipos de idéias, como as cores, a superfície, etc.. A esse detalhamento das idéias que se juntam com outras idéias para formar a essência de cada coisa, deu o nome de “redução eidética” (idéia, imagem, forma). Com este procedimento queria chegar a uma metodologia perfeita para a filosofia, de modo a garantir a certeza absoluta, e buscou estudar o que John Locke já havia escrito a respeito. Somente mais tarde, no que foi considerada uma reviravolta em seu pensamento, Husserl passou ao estudo do Eu, do que existe no Eu que lhe faculta o conhecimento, o que foi considerado um retrocesso à filosofia transcendental de Kant.

(Fonte: www.cobra.pages.nom.br – Página de Filosofia Contemporânea escrita por Rubem Queiroz Cobra)

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