Agenor de Miranda Araújo (1958-1990), Cazuza, rebelde, debochado, contestador

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Agenor de Miranda Araújo (1958-1990), já na maternidade ganhou o apelido: Cazuza. Rebelde, debochado, contestador. Foi o maior letrista de sua geração, um ícone do rock nacional. Artistas consagrados se comoveram com sua arte. Mas teve vida breve, e louca, como na música que cantou. Suportou enquanto pôde as pressões da aids. Mas não partiu no tempo. Fez da sua obra sua sobrevivência.
O pai, João Araújo, passara pelas maiores gravadoras do País. Cazuza trombava com os artistas em casa: “Eu acordava de noite para tomar água, e lá estavam Gil, Caetano, Gal”.
O menino cujo apelido quer dizer “vespa solitária” encarna o estereótipo do roqueiro: drogas e bebidas impulsionam sua postura ao mesmo tempo rebelde e carinhosa. Passava horas com os pais em casa, os cobria de abraços e beijos. Solto pelo mundo, era preso por dirigir embriagado, por portar drogas.
Aos 18 anos foi estudar Arte Dramática na Inglaterra. Segundo Lucinha, sua mãe, “fez de tudo em Londres, menos o curso”. Negava-se a estudar. Entrou duas vezes na faculdade, e abandonou-a com a mesma facilidade.
Em 1978, o pai lhe arrumou emprego na gravadora Som Livre, da qual era presidente. Mas logo Cazuza cansou do trabalho. Foi para San Francisco, nos Estados Unidos. “Preferia ser mendigo do que executivo”, diz a mãe.
Natureza revoltada.
Sete meses depois, estava de volta, deixando mais um curso inacabado: fotografia. Sua vocação era mesmo o palco, como descobriu num grupo de teatro. Quase não tinha falas, só cantava. Sua técnica era o grito: “Nunca estudei canto. Eu sou rouco, não tenho cuidado com a voz. Meu exercício é no palco”.
Em 1981, aos 23 anos, é apresentado por Leo Jaime a uma banda, o Barão Vermelho. O cantar rebelde e a qualidade de suas letras fazem a diferença. Ali inicia parceria e amizade únicas com o guitarrista Frejat.
Quando o produtor Ezequiel Neves ouve a banda pela primeira vez, telefona imediatamente para Lucinha: “Seu filho é genial!” Bastaram quatro dias para o primeiro LP ficar pronto, em maio de 1982. A crítica foi só elogios. Cazuza é apontado como o maior poeta de sua geração. Para Caetano Veloso, era um romântico autêntico. “Isso deu à sua poesia um poder de comoção muito grande”.
Apesar do sucesso, depois do terceiro álbum, os ânimos se exaltam. Estraçalha no chão o primeiro disco de ouro. Queria ir além dos rótulos, considerava samba rock and roll. Os companheiros de banda divergem. Parte para à carreira solo, cumprindo a profecia que um astrólogo fizera anos antes: “Seu destino é abrir novos caminhos, ser ponta-de-lança. Por isso sua natureza é revoltada”. O primeiro disco solo sai em 1985: Exagerado.
Ainda nas últimas apresentações com o Barão, tinha febres diárias. Ao descobrir-se portador do vírus HIV, foi para os Estados Unidos fazer tratamentos. Compunha compulsivamente. “Quero trabalhar muito, é só o que posso fazer”. Passou a viver intensamente os últimos sopros da vida. Entre 1988 e 1989, compôs três discos – o último, com 17 canções.
Diante da insistência dos pais para esconder a doença, argumenta: “Eu canto uma música que diz: ‘Brasil, mostra a tua cara!’ Tenho que ser coerente comigo e com meu público”.
A entrega nos palcos era total. Apresentava-se mesmo sob os debilitantes efeitos do AZT. No camarim, tubo de oxigênio, inalador e ambulância, em caso de emergência: “Se acontecer alguma coisa, quero que seja no palco”.
Durante as gravações do último disco, Burguesia, gravava sentado, deitado, com febre. Dizia: “Tenho vontade de criar, é o que me deixa vivo”. No segundo Prêmio Sharp de Música, em 1989, ganhou três estatuetas. Foi à cerimônia de cadeira de rodas, aplaudido com entusiasmo.

 

Morre meses depois, em 7 de julho de 1990. Em oito anos de carreira, deixou 126 músicas gravadas (34 por outros intérpretes), 60 inéditas. E um legado de atitude e enfrentamento da vida sem par.

(Fonte: Brasil Almanaque de Cultura Popular – Ano 9 – Julho 2007 – N° 99 – Ilustres Brasileiros/ Por Danilo Ribeiro Gallucci – www.almanaquebrasil.com.br – Pág; 12)

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