Thomas Mann, foi autor de um romance pelo qual se pode medir o resto da literatura “A Montanha Mágica”

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Gênio humanista

Mann: o correto burguês que viu o século XX com a dignidade e a esperança do século XIX

Thomas Mann (Lübeck, Alemanha, 6 de junho de 1875 – Zurique, Suíça, 12 de agosto de 1955), foi autor de um romance pelo qual se pode medir o resto da literatura “A Montanha Mágica”.

Filho de senador e neto de cônsul, última descendência de uma rica família de Lübeck, em junho de 1875, Mann compõe com precisão o retrato do correto burguês da literatura: vasta cultura, pena talentosa e substância moral. Sua obra foi considerada a medida de todas as obras, passaporte de universalidade para a literatura, por um dos críticos mais importantes do século XX, o húngaro Gyorgy Lukács. Seus 28 livros, romances, contos e ensaios – onde o dilema do artista e a crise do mundo burguês têm papel preferencial – parecem suportar sobre suas frágeis páginas toda a responsabilidade de um Homero em inglória odisseia.

Suas fotografias são milimetricamente posadas, como se fosse indigno de um cavalheiro germânico deixar-se surpreender na intimidade de um gesto desabrido. Rosto austero, gravatas sóbrias, nenhuma ruga – como em sua vida particular, do casamento de meio século ao dosado refinamento de suas bibliotecas particulares. Nem mesmo a celebridade – apanhando Thomas Mann já aos 25 anos, com o êxito da novela “Os Buddenbrook”, consagrando-o aos 54 anos com o Prêmio Nobel de Literatura e acompanhando-o até sua morte, em 1955, aos 80 anos – viria macular esta imagem de probidade e equilíbrio. Nada perturbava seu ritual de escrever duas páginas todos os dias.

HARMONIA E FEBRE – Mas o Thomas Mann amigo íntimo de tantos dignitários da cultura, como Albert Einstein, Sigmund Freud ou o compositor Arnold Schoenberg, nunca deixou de ser o jovem leitor dos heréticos Arthur Schoppenhauer e Friedrich Nietzsche – os terroristas domésticos do sereno iluminismo alemão. E suas melodias harmoniosas permaneceram como filhas diretas de partituras atonais: sua prosa serena esconde um pensamento convulsivo, inquieto, febril. O racionalista Mann tematizou a decadência, a abjeção, a queda dos corpos e almas. Em “Os Buddenbrook”, uma família degenera. No “Doutor Fausto”, o demônio disfarça em genialidade o preço pago pelo pacto certo com a loucura. Em “Morte em Veneza” (1912), o artista se entrega à vertigem simultânea pela morte e pela beleza. E, na “Montanha Mágica”, publicado originalmente em 1924, Mann traça a parábola de uma Europa enferma vista através de um luxuoso sanatório para tuberculosos.

LIVROS QUEIMADOS – Uma límpida alegoria das duas Europas que coabitavam o início do século XX – o liberalismo em seu crepúsculo e a ascensão de um autoritarismo premonitório da catástrofe nazista -, a montanha mágica de Mann jamais resvala para a exemplaridade caricatural. Seus tipos são verdadeiros, não verossímeis. O realismo de Mann é sua ambivalência, apenas ligeiramente solucionada: o Século das Luzes conquista seu partidarismo; o gótico medieval, suas simpatias de aristocrata.

Do exílio, discursos antinazistas

O mais ensaístico de seus romances, a “Montanha Mágica”, é também um momento-chave para o cidadão Thomas Mann. Seis anos antes, em 1918, ele havia sido saudado pelos conservadores – e rompido com o irmão Ludwig Heinrich (1871-1950), um liberal – por suas “Considerações de um Apolítico”, uma discreta apologia do nacionalismo germânico e dos benefícios da guerra. Quando esta veio, de fato, ele começou a rever suas posições, encaminhando-se daí para um difuso socialismo, que lhe valeria o exílio após a vitória dos nazistas, em 1933, e a queima pública de seus livros, três anos mais tarde.

A “Montanha Mágica”, é, então, a primeira confirmação de seu vigoroso antitotalitarismo (confirmado no exílio americano por inúmeras conferências e discursos radiofônicos) e o mais completo libelo humanista a que o século XX assistiu: um afresco suntuoso sobre os homens da planície, “o mundo dos ignorantes” que Mann tratou com a dignidade e complacência de um espírito do século XIX. Porque em sua obra os secretos bastidores de toda abjeção ocultam sempre algum princípio de ordem, a promessa reiterada de uma Idade de ouro.

(Fonte: Veja, 25 de junho de 1980 – Edição 616 – LIVROS/ Por Marília Pacheco Fiorillo – Pág: 91/92)

O homem difícil por trás do escritor de gênio

Gigante da literatura mundial do século XX, é um autor mais admirado do que amado. Admirar o escritor alemão é fácil, muitas vezes ele se mostrou um sujeito egocentrado, pedante e inacessível.

(Fonte: Revista Veja, 29 de novembro de 2000 – ANO 33 – Nº 48 – Edição 1677 – Livros / Por Flávio Moura – “Thomas Mann: Uma Biografia”, de Donald Prater – Pág: 160/161)

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