Rufino Tamayo, de reacionário a gênio, uma figura controvertida e indomável.

0
Powered by Rock Convert

Rufino Tamayo (Oaxaca, 26 de agosto de 1899 – Cidade do México, 24 de junho de 1991), artista e pintor mexicano. De reacionário a gênio, vários adjetivos tem sido usados para tentar classificar sua figura controvertida e indomável. Único sobrevivente de uma geração que projetou internacionalmente a arte mexicana do século 20, Rufino Tamayo expôs com sucesso em todo o mundo. Com o mesmo ânimo, investe contra os ilustres representantes da escola muralista mexicana: José Clemente Orozco (1883-1949), David Alfaro Siqueiros (1898-1974) e Diego de Rivera (1886-1957). E até mesmo se recusou a ser considerado como um deles. Sua posição inquestionada de figura mais importante do mundo artístico do país autorizou esses excessos. E tornou, ao mesmo tempo, de inevitável interesse a observação de sua produção. Rufino Tamayo foi um dos primeiros artistas latino-americanos, juntamente com representantes do “Grupo dos Três” famoso (Rivera, Siqueiros e Orozco), atingiu um alívio e uma difusão genuinamente internacional.

A serviço do povo – Fiçho de pais de origem zapoteca, Tamayo nasceu em Oaxaca em 1899. Órfão desde os 8 anos, foi recolhido por uma tia com quem se mudou para a Cidade do México. Na adolescência, vendia frutas no mercado, fazia estudos de comércio e frequentava, às escondidas, a Academia de Belas-Artes. Logo o academismo o irritou, e ele preferiu aprender, por conta própria, as lições dos movimentos de vanguarda da época: o pós-impressionismo, o cubismo, o expressionismo. Em 1921, tornou-se chefe da seção de desenho etnográfico do Museu de Antropologia do México, num decisivo golpe de sorte. Trabalhava sobre material das civilizações pré-colombianas, entrando assim em contato direto com as raízes culturais de seu país.

Data de 1933 seu primeiro mural, no Conservatório de Música do México. Já nessa época, a arte do mural se transformara na forma de expressão por excelência dos grandes artistas da nação. Influenciados por ideias esquerdistas, resolveram colocar sua arte a serviço do povo, falando de suas epopeias, de seus sofrimentos, de sua revolução. Ao mesmo tempo, recusavam a pintura de cavalete, o consumo de telas únicas por parte de colecionadores. Seu desejo, como escreveria mais tarde Siqueiros, era uma “arte pública por natureza, destinada a chegar às multidões”. Com ela encheram prédios e mais prédios públicos em todo o país. Além disso, tornaram-se famosos por suas atitudes pessoais. Siqueiros, por exemplo, participou de um atentado contra Trótski, na década de 30, e até pouco tempo antes de sua morte esteve preso por sua participação em movimentos operários.

Nada disso interessava, no fundo, a Rufino Tamayo. Formado nos Estados Unidos e na Europa, dividindo o tempo entre Nova York e o México, consagrado em 1950 na Bienal de Veneza, ele preferiu acrescentar às fontes mexicanas certas influências cosmopolitas, sobretudo do cubismo e de Picasso. Mas não abandonou, de todo, as reminiscências do folclore mexicano – e a crítica costumava destacar seu colorido, original, vivo, às vezes “brutal”.

Talvez se reflita, em tão rigoroso juízo, uma ponta de oposição ideológica. Rufino Tamayo sempre foi um reacionário, e recorreu a uma espécie de macarthismo, denunciando, através de cartas e entrevistas a jornais americanos, a militância de seus colegas. E embora fez muralismo, continuou falando mal dele, só para cultivar seu mercado. “Para quem acredita que a arte mexicana teve um papel importante no século 20, através da colocação do fato político na monumentalidade do muralismo, Tamayo é a negação de tudo isso. Foi o líder da luta contra a arte política no país. Ele vai para um lado e a vida mexicana para outro”, disse Raquel Tibol, a mais respeitada crítica de arte mexicana.

Apesar de tudo, a mesma crítica de arte consegue fornecer uma visão equilibrada da pintura de Tamayo como um todo. “É um artista de grandes texturas, cria clima em certos quadros, chega quase ao surreal.” E, corroborando uma das informações do próprio pintor sobre sua intensa atividade criadora, conclui Raquel Tibol: “Ele não elabora nada com o intelecto, trabalha visceralmente. E nesse sentido, podemos dizer que é um gênio”.

(Fonte: Veja, 28 de abril de 1976 – Edição n° 399 – ARTE – Pág; 122/124)

Powered by Rock Convert
Share.