Nélida Piñon, foi uma autora brasileira pioneira cuja escrita provocativa ganhou alguns dos prémios mais prestigiados do mundo, e que fez história ao se tornar a primeira mulher a presidir a academia literária do Brasil, escreveu mais de duas dezenas de livros, incluindo os romances “A Casa da Paixão” (1972) e sua obra mais conhecida, “A República dos Sonhos” (1984), que foi inspirada na migração de sua família da Galícia para o Brasil, uma região autônoma da Espanha

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Escritora carioca Nélida Piñon, provocativa romancista brasileira

Amplamente considerada uma das maiores escritoras contemporâneas do Brasil, foi também a primeira mulher eleita presidente da Academia Brasileira de Letras.

 

Sr. Piñon com o cineasta Carlos Diegues, ao centro, e o jornalista Zuenir Ventura em 2022 em evento da Academia Brasileira de Letras. A Sra. Piñon foi presidente da academia de 1996 a 1997. (Crédito da fotografia: Cortesia © Copyright Mauro Pimentel/Agência France-Presse — Getty Images)

Sr. Piñon com o cineasta Carlos Diegues, ao centro, e o jornalista Zuenir Ventura em 2022 em evento da Academia Brasileira de Letras. A Sra. Piñon foi presidente da academia de 1996 a 1997. (Crédito da fotografia: Cortesia © Copyright Mauro Pimentel/Agência France-Presse — Getty Images)

 

Foi a primeira mulher a presidir a ABL (Academia Brasileira de Letras)

A autora brasileira Nélida Piñon esteve em Madri em 2019. Embora o alcance global de sua obra nunca tenha se igualado ao de seus contemporâneos latino-americanos mais conhecidos, sua escrita encontrou um público entusiasmado fora do Brasil e foi traduzida para cerca de 30 idiomas. (Crédito da fotografia: Cortesia © Copyright Zipi/EPA, via Shutterstock)

 

 

Nélida Piñon (nasceu em 3 de maio de 1937, no bairro de Vila Isabel, no Rio de Janeiro – 2022), escritora carioca, foi uma autora brasileira pioneira cuja escrita provocativa ganhou alguns dos prémios mais prestigiados do mundo, e que fez história ao se tornar a primeira mulher a presidir a academia literária do Brasil.

Figura popular nos círculos literários de elite, tanto no Brasil como no exterior, ela contou com Clarice Lispector, Jorge Amado, Toni Morrison e Susan Sontag entre seus amigos íntimos ao longo dos anos.

Sra. Piñon é amplamente considerada uma das maiores escritoras contemporâneas do Brasil, admirada por seu uso magistral do português e sua abordagem lúdica da forma literária.

“A literatura abriu-me as portas do paraíso e, ao mesmo tempo, do inferno”, disse Piñon a uma estação de rádio portuguesa em 2021, referindo-se aos altos e baixos do processo de escrita. “Sempre vivi com intensidade. Não hesitei em amar profundamente a língua portuguesa, que é o grande propósito da minha vida.”

Seu uso caprichoso do simbolismo religioso e sua exploração da sexualidade e do erotismo foram considerados ousados ​​no Brasil profundamente católico, que foi governado por uma ditadura militar repressiva até 1985. E sua experimentação com o barroco e o surreal a diferenciou da maioria dos outros escritores brasileiros de. o tempo dela.

Piñon escreveu mais de duas dezenas de livros, incluindo os romances “A Casa da Paixão” (1972) e sua obra mais conhecida, “A República dos Sonhos” (1984), que foi inspirada na migração de sua família da Galícia para o Brasil. , uma região autônoma da Espanha. Ela também escreveu contos, memórias, ensaios e discursos.

De 1996 a 1997, a Sra. Piñon foi presidente da Academia Brasileira de Letras, instituição cultural que atua como a principal autoridade do país em língua portuguesa. Ela foi a primeira mulher a ocupar esse cargo.

“Ela foi uma pioneira em muitos aspectos”, disse Isabel Vincent, autora e jornalista investigativa cuja amizade com Piñon durou quatro décadas. “E ela estava ciente do tipo de coisas pioneiras que estava fazendo.”

Integrante da ABL (Academia Brasileira de Letras) desde 1989, ela foi a primeira mulher a presidir a entidade. Ocupou o posto de 1996 a 1997.

Descendente de galegos, Nélida Piñon nasceu na capital fluminense em 1937 e se formou em jornalismo pela PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro). Estreou na literatura com o romance “Guia-mapa de Gabriel Arcanjo”, publicado em 1961, que tem como temas o pecado, o perdão e a relação dos mortais com Deus.

Em 1984, lançou uma de suas obras mais marcantes: “A República dos Sonhos”. No romance, baseado na história de uma família de imigrantes galegos, ela faz reflexões sobre Galícia, Espanha e Brasil.

Seus escritos foram traduzidos em mais de 30 países e contemplam romances, contos, ensaios, discursos, crônicas e memórias, que renderam conquistas importantes, entre eles o Prêmio Jabuti, o mais tradicional reconhecimento literário do Brasil. Ela recebeu a honraria na edição de 2005 com o romance “Vozes do Deserto“. Nélida Piñon recebeu ao longo de sua carreira mais de 40 condecorações nacionais e internacionais.

No meio acadêmico, foi professora na Faculdade de Letras da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e obteve o título de doutor honoris causa em instituições de ensino de diferentes países. O diploma é outorgado por universidades a personalidades de grande importância que tenham se destacado pelo trabalho que realizam. Em 1998, foi a 1ª mulher a alcançar esse feito na Universidade de Santiago de Compostela, na região da Galícia, na Espanha.

O trabalho da Sra. Piñon ganhou prémios nacionais e estrangeiros, incluindo o prestigiado Prêmio Príncipe das Astúrias de Literatura, considerado o equivalente espanhol ao Prémio Nobel. Ela também ganhou duas vezes o maior prêmio literário do Brasil, o Prêmio Jabuti.

A sua escrita foi levada pela primeira vez aos leitores de língua inglesa na década de 1970 por Gregory Rabassa (1922-2016), um ilustre tradutor de literatura espanhola e portuguesa que também trabalhou com nomes como Gabriel García Márquez.

Embora o alcance global do trabalho de Piñon nunca tenha se igualado ao de contemporâneos latino-americanos mais conhecidos, como García Márquez, Julio Cortázar, Mario Vargas Llosa ou Isabel Allende‌‌, seus escritos encontraram um público entusiasmado fora do Brasil e foram traduzidos para cerca de 30 idiomas.

“Uma obra estupenda, literatura de alto nível”, escreveu a Publishers Weekly sobre “A República dos Sonhos” em 1991. “A plenitude amazônica da imaginação de Piñon a coloca na categoria de gênio”.

Nélida Cuiñas Piñon nasceu em 3 de maio de 1937, no bairro de Vila Isabel, no Rio de Janeiro. Seu pai, Lino Piñón Muíños, comerciante, era imigrante galego; sua mãe, Olivia Carmen Cuíñas Piñón, dona de casa, nasceu no Brasil, filha de pais galegos.

Quando criança, Piñon era uma leitora voraz, encantada pelo mundo de fantasia da narrativa. Ela começou a escrever desde cedo, vendendo suas histórias manuscritas ao pai e a outros membros da família por alguns dólares cada.

“Eu queria ser escritora”, disse ela ao jornal brasileiro Estadão em 2021. “Não sei como nem por que, só sabia que adorava as histórias. Acima de tudo, as narrativas impossíveis e, quem sabe, até as ilógicas. Porque a ausência de lógica deu mais poder à história.”

Quando a Sra. Piñon tinha 10 anos, a sua família mudou-se para a aldeia rural da Galiza onde o seu pai cresceu. A viver ali durante dois anos, aprofundou os laços com a herança familiar, à qual mais tarde faria referência no seu trabalho, escrevendo frequentemente sobre as ideias de pertença e ancestralidade.

Depois que a família voltou ao Brasil, a Sra. Piñon passou a estudar na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, onde se formou em jornalismo. Ela começou sua carreira escrevendo para jornais e revistas.

Em 1961 publicou seu primeiro livro, “Guia-mapa de Gabriel Arcanjo”, um romance que imita um extenso diálogo entre um arcanjo e uma mulher que deseja viver fora da fé cristã. Mas foi somente em “A República dos Sonhos”, mais de duas décadas depois, que o status da Sra. Piñon no mundo literário brasileiro foi consolidado.

Descrita pelos amigos como dinâmica e inquieta, a Sra. Piñon viajou muito e passou algum tempo morando na Europa e nos Estados Unidos, embora o Rio de Janeiro continuasse sendo sua base. Ela lecionou na Universidade de Miami de 1990 a 2003 e foi professora visitante em Harvard, Columbia e Georgetown.

Nos últimos anos passou períodos em Portugal, pesquisando o último romance que publicou em vida, “Um Dia Chegarei a Sagres” (2020), que escreveu à mão porque a sua visão estava a desaparecer rapidamente.

Sra. Piñon se baseou em pesquisas meticulosas enquanto elaborava seus romances. Ao escrever “Vozes do Deserto”, uma releitura erótica de “Mil e Uma Noites”, ela leu o Alcorão duas vezes, segundo Vincent.

Seus gostos artísticos eram variados. Amante de faroestes, ela adorava assistir filmes como “Um Punhado de Dólares” e “O Bom, o Mau e o Feio”. Quando ela escrevia, muitas vezes o fazia enquanto ouvia ópera de Wagner.

Piñon iniciou conversas com quase todas as pessoas que conheceu, sempre em busca de uma compreensão mais profunda da natureza humana, disse Vincent em entrevista por telefone.

“Ela estava curiosa sobre as pessoas; todo mundo a fascinava”, disse ela. “Essa era uma espécie de missão dela, tentar entender como as pessoas pensavam, tentar entender a psique humana.”

Nélida Piñon faleceu no dia 17 de dezembro em Lisboa. Ela tinha 85 anos.

Sua secretária e amiga de longa data, Karla Vasconcelos da Silva, disse que a causa foram complicações de uma cirurgia de emergência a que ela foi submetida após lutar contra um câncer de estômago.

A Sra. Piñon não deixa sobreviventes imediatos. Ela nunca se casou ou teve filhos, optando por se concentrar na escrita, disse Karla Lula.

“Ela costumava dizer: ‘A literatura não me deve nada. Devo tudo à literatura’”, disse Karla.

Perto do fim de sua vida, a Sra. Piñon começou a ditar seu trabalho em um gravador. A Sra. da Silva transcreveu suas palavras e as imprimiu em uma fonte grande, para que a Sra. Piñon pudesse revisar sua prosa.

A Sra. Piñon escreveu um último livro antes de sua morte, que foi publicado na primavera de 2023.

“Ela estava se despedindo com este livro”, disse Lula. “Foi a sua despedida do mundo.”

(Créditos autorais: https://www.nytimes.com/2022/12/27/books – The New York Times/ LIVROS/ Por Ana Ionova – 27 de dezembro de 2022)

Uma versão deste artigo aparece impressa na 31 de dezembro de 2022, Seção A, página 19 da edição nova-iorquina com a manchete: Nélida Piñon, foi uma romancista brasileira pioneira.

©  2022  The New York Times Company

(Fonte: https://www.poder360.com.br/brasil – BRASIL/ por PODER 360 – 17/12/22)

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