Mitsui & Co., a grande empresa japonesa, cujas origens remontam há quase 400 anos

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Masami Iijima, chairman da Mitsui AKIO KON/BLOOMBERG

Masami Iijima, chairman da Mitsui AKIO KON/BLOOMBERG

Mitsui & Co., a grande empresa japonesa, cujas origens remontam há quase 400 anos, quando o empreendedor Hachirobei Mitsui transformou a loja de venda de saké e molho de soja do seu pai numa companhia que vendia o que quer que seja que as pessoas necessitavam naqueles tempos. Ao longo dos séculos, o grupo Mitsui produziu e construiu de tudo, desde quimonos de seda até arranha-céus, e deu origem a marcas bem conhecidas como a Toshiba e a cerveja Sapporo. Até fundou um pequeno negócio de fiação de algodão chamado Toyota que anos mais tarde decidiria enveredar pela construção de automóveis.   

Fora do Japão poucos a conhecem, mas o gigante japonês que deu origem à Toshiba tem mais lucros do que a Coca-Cola e tantos trabalhadores quanto a Google.

Mas a actual encarnação da empresa está a passar por uma certa crise de identidade. Com as suas acções arrastando-se no índice de referência de Tóquio, com a sua marca praticamente desconhecida fora do Japão, e com os analistas a terem dificuldades até para categorizar a companhia, a Mitsui está a colocar a si mesma uma questão própria da entrada na maturidade: Quem sou eu?

Aos olhos dos investidores, a Mitsui é a principal negociante de petróleo e minérios de ferro, com interesses que vão desde operações de gás na Rússia até uma mina de carvão em Moçambique. Por isso, castigaram as acções quando os preços do petróleo e dos minérios derraparam. O que espantou o presidente da Mitsui, Masami Iijima.

“Não somos uma empresa de matérias-primas”, afirma Iijima numa entrevista realizada no quartel-general da companhia em Tóquio. Mas, em encontros com jornalistas e investidores, no ano passado, em Londres e Nova Iorque, até mesmo Iijima, um veterano de mais de 40 anos na Mitsui, teve dificuldades para responder à pergunta: O que é que a sua empresa realmente faz?

“Tem que se dar uma resposta concreta, mas temos tantos negócios diferentes que é difícil fazer as pessoas perceberem o que se passo dentro da companhia.”

Isto porque a Mitsui é umas das “sogo shosha” do Japão, as intrincadas empresas que moldaram a ascensão industrial do país. As “shosha” de hoje – incluindo a Marubeni Corp., a Itochu Corp, a Sumitomo Corp e a Mitsubishi Corp. – são uma amálgama de mineiros, vendedores, consultores, corretores, transitários e banqueiros.

As “shosha” declaram que seguem um modelo de negócios único, definido ao longo de séculos. De acordo com “The House of Mitsui”, um livro da autoria de Oland D. Russell e editado em 1939, a família que está por detrás da firma consegue fazer recuar a sua linha genealógica até aos Fujiwaras, uma antiga dinastia que proclamava ser descendente dos deuses que criaram o Japão.

Mas em vez de continuar a obrigar o mundo a tentar adivinhar o que se passa no interior do “buraco negro” dos negócios da Mitsui, Iijima decidiu, em meados de 2014, lançar a primeira campanha de “corporate branding” [promoção da marca] da história da companhia.

O grupo reuniu uma equipa de decididos gestores intermédios comandados por Kenichi Hori, director-executivo da Divisão de Estratégia. Passaram três meses numa sala a tentar definir o que é a Mitsui e no final apresentaram o seu relatório de duas páginas aos executivos de topo, que estiveram um dia inteiro a debater o documento.

Em Dezembro, a Mitsui revelou os resultados aos seus empregados na sua intranet e organizou encontros nas suas principais delegações, pedindo aos funcionários presentes para divulgarem as ideias aí apresentadas. A Mitsui não permite o acesso público ao documento, mas Hori afirma que os seus principais pontos apresentam a companhia como um lugar onde pessoas perspicazes antecipam as novas tendências e extraem grandes lucros de pequenas experiências.

Aprofundar mais já se mostra problemático. Em nenhum lugar existe qualquer outra empresa igual à Mitsui, avança Hori. Os seus interesses são “variados”, “diferentes” e “múltiplos”. A única constante, diz Hori, é a permanente mudança.

Tal mudança pode confundir os analistas e os investidores, mas tem ajudado a empresa, sempre volátil e em alteração de formato, a sobreviver. O que começou como uma pequena loja fundada por um aristocrata em dificuldades financeiras, Sokubei Mitsui, no início do século XVII, sobreviveu a duas guerras mundiais, a crises financeiras e até a um desmantelamento imposto em 1947 pelo Governo japonês apoiado pelas Forças Armadas dos Estados Unidos.

Partes do grupo desmantelado foram recuperadas nos finais da década de 1940, com a Mitsui & Co. a ser das principais beneficiadas pelos primeiros indicadores positivos no meio da crise económica de então. Outras que herdaram partes da herança de Sokubei foram a Sumitomo Mitsui Banking Corp., a Japan Steel Works, e a Toray Industries Inc., a maior produtora de fibra de carbono a nível mundial.

Durante o “boom” económico do Japão, a recuperada secção comercial da Mitsui fez aquilo que melhor sabia: descobriu produtos e serviços que as pessoas necessitavam e vendeu-lhas – mais exactamente gasolina, electricidade, minérios e matérias-primas. Quando na década de 1990 a economia japonesa entrou em recessão, a China chegou-se à frente, e os negócios centrais da Mitsui continuaram a prosperar.

Mais tarde, em finais de 2011, os preços das mercadorias começaram a baixar, e muitas “shosha” mudaram o seu enfoque para a venda a retalho, alimentação e serviços. O problema da Mitsui era que ao longo de quatro décadas tinha apostado forte nas matérias-primas, o que a deixara com poucos investimentos significativos nas outras áreas.

Jiro Iokibe, do Daiwa Securities Group, acredita que a Mitsui deveria aceitar isso e concentrar-se em ser uma empresa de mercadorias. Afinal de contas, até mesmo Iijima concorda que a próxima fase positiva do ciclo económico já não deverá estar longe.

Mas não é isso que a Mitsui é, diz Iijima. “Especializámo-nos em fazer muitos negócios e retirar daí sinergias”, conta.

Por exemplo, quando a Mitsui começou a desenvolver o gás de xisto nos Estados Unidos, há cerca de cinco anos, utilizou isso como um trampolim para se lançar nas áreas dos químicos, dos oleodutos e gasodutos, e para vender combustíveis para centrais de produção de energia.

“Cada vez vejo mais e mais companhias a passar para o modelo de negócio das ‘shosha’”, em que cada oportunidade origina outras oportunidades em novas áreas, explica Iijima. E aponta o exemplo da General Electric Co. (GE), cujo presidente, Jeffrey Immelt, considera seu amigo.

“Começaram com a lâmpada eléctrica de Edison e agora estão metidos em caminhos-de-ferro, infra-estruturas, tecnologias da informação e finanças”, concretiza Iijima.

Já Immelt considera que a Mitsui tem sido um grande parceiro da General Electric (GE). “Iijima-san é uma pessoa muito aberta e disponível para correr riscos”, escreve o director da GE num e-mail. “É excelente a imaginar e a desenvolver novas ideias. Tenho sempre muito prazer em estar com ele.”

A General Electric está actualmente a vender a maior parte das suas holdings financeiras, de forma a concentrar-se no fabrico e produção. Mas pelo menos é uma marca muito conhecida a nível mundial.

“Não serve de nada tentar calcular o valor da marca Mitsui & Co.”, é a opinião de Yuki Wada, director-executivo da Interbrand Japan.

Mas o “branding” está a ser cada vez mais importante para a Mitsui, especialmente no estrangeiro, onde precisa de recrutar colaboradores, afirma Wada. Assim sendo, Iijima entrou em contacto com Kashiwa Sato, cujo gabinete de design, Samurai, conta com clientes como a cerveja Kirin, os automóveis Honda e a linha de roupa informal Uniqlo, bem como a famosa boys band japonesa SMAP, que há mais de vinte anos lança êxitos musicais.

Sato ficou surpreendido com o contacto. “Oh, é claro que conhecia o nome Mitsui”, conta-nos no escritório minimalista do seu estúdio em Tóquio. “Tinha a ideia de que eles faziam montes de coisas diferentes. Só não sabia exactamente que coisas eram essas.”

O designer passou seis meses a conversar com funcionários da Mitsui, de todas as idades e cargos, em reuniões formais ou em saídas mais descontraídas, acerca do que eles pensavam que constituía a essência da Mitsui. Descobriu que nem sequer os logótipos nos cartões-de-visita eram iguais.

Assim, harmonizou o símbolo da empresa, que já tinha mais de cem anos, e acrescentou um novo slogan: “360 degree business innovation” [inovação empresarial a 360 graus], delineado para demonstrar que a Mitsui congrega pessoas provenientes de diferentes locais e áreas de conhecimento, para delinear novas formas de fazer comércio.

Ambos foram apresentados em Outubro no Mitsui Club, uma mansão em estilo barroco num abastado subúrbio de Tóquio construída no início do século XX pela família Mitsui para organizar recepções e festas. O slogan já está presente no novo vídeo institucional disponível no site da companhia.

Yuki Wada, da Interbrand, suspira quando lhe pergunto para avaliar o impacto destas alterações. “Fiquei bastante desapontado. Não me parece que tenham mudado muita coisa.”

Iijima diz que esta é apenas a primeira etapa no processo de transformação, que demorará anos.

Entretanto, a empresa sempre em mudança continua a fazer aquilo que sempre fez, descobrindo novas formas de vender e comprar. Iijima avança que está à procura de parceiros fora do Japão para criar uma área de negócios digitais, via Internet, e que as respostas têm sido imensas.

“Costumávamos desempenhar o nosso papel mas de forma discreta”, termina Iijima. “Agora já temos um certo número de investimentos e devemos reforçar a nossa imagem.”

(Fonte: http://www.publico.pt/economia/noticia – ECONOMIA/ YURIY HUMBER e ICHIRO SUZUKI – 19/10/2015)

Exclusivo PÚBLICO/Bloomberg News

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