Louis Malle, diretor de cinema francês

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LOUIS MALLE, um cineasta sem hipocrisia

 

Louis Malle (Thumeries, 30 de outubro de 1932 – Beverly Hills, 23 de novembro de 1995), diretor de cinema francês.

 

Nascido em 1932, Louis Malle é um representante atípico da geração de cineastas que formaram a nouvelle vague. Embora tenha sido contemporâneo de Truffaut, Goddard e Chabrol, a santa trindade do movimento, jamais foi bem aceito pelo grupo, talvez por não se adaptar a dogmas estéticos e formais. Mesmo descolado dos enfants terribles do cinema francês, Malle conseguiu projeção mundial realizando filmes que tocaram nos principais tabus do mundo ocidental, como a liberação feminina (Os Amantes, 1958), o suicídio (Trinta Anos Esta Noite, 1963), o incesto (O Sopro no Coração, 1970) e a pedofilia Menina Bonita (Pretty Baby, 1978).

Seu alvo principal sempre foram os arraigados costumes burgueses, que em suas obras parecem estar sustentados por uma malha fina de hipocrisia, medo e frustração. Formado em Ciência Política na Sorbonne, Malle no início da carreira foi assistente de Robert Bresson e do pesquisador submarino Jacques Cousteau, com quem realizou o documentário O Mundo do Silêncio, de 1956, vencedor do Oscar e da Palma de Ouro.

No final da década de 60, ele retornaria ao gênero realizando em 16mm o revolucionário Calcutta, filme documental sem narrador. Ascensor para o Cadafalso, de 57, foi a primeira experiência solo do diretor, uma incursão pela atmosfera noir parisiense, com trilha excepcional de Miles Davis e interpretação idem de Jeanne Moreau.

Daí para frente sua carreira foi até o fim pontuada de escândalos. Os Amantes, Sopro no Coração e mesmo Perdas e Danos, realizado em 1992, foram vítimas de cortes da censura. Já Lacombe Lucien, de 1973, irritou seus compatriotas por tocar no sempre incômodo tema do colaboracionismo francês com os nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.

Mas se há um filme capaz de resumir a rica filmografia desse diretor que imprimiu em seus filmes as crises do seu tempo, este é O Sopro no Coração, que reúne aspectos de diversas fases do autor, da explosão feminista de Os Amantes até a crônica colegial Adeus, Meninos.

Há ainda a inquietude de Trinta Anos Esta Noite e a crítica à decadência burguesa de Loucuras de uma Primavera, de 1989, brilhante reavaliação da década de 60. Em O Sopro no Coração, Laurent (Benoît Ferreux) é um intelectual precoce apaixonado por jazz e filosofia. O pai, um protótipo do burguês decadente. Os dois irmãos ironizam (ou invejam?) a condição de favorito da mamãe e empurram o perplexo garoto para o mundo dos adultos, chegando a forçar sua patética iniciação sexual. No meio de tantos machos, quem domina a cena é a mãe, Clara (Lea Massari), imigrante italiana que espana o mofo daquela que tinha tudo para ser uma família tradicional. Desejo, ciúme, raiva e inveja só são resolvidos na famosa sequência entre mãe e filho que tanta polêmica provocou à época.

Mas com certeza não foi só a corajosa abordagem do incesto que incomodou os moralistas. Os ataques às insinuações libidinosas dos padres e ao esnobismo dos nacionalistas tampouco passaram despercebidos, confirmando assim a eficácia da obra do diretor francês, capaz de responder aos tabus e às regras sociais com uma única palavra: ternura.

Louis Malle faleceu em 1995, aos 63 anos, de câncer, deixando viúva a atriz Candice Bergen.

Realizou trinta longa-metragens. Foi um dos raros diretores franceses a firmar carreira nos Estados Unidos. Seus filmes são fundamentais para todos aqueles que um dia quiserem entender as angústias sociais que atormentaram o homem moderno na segunda metade do século XX. Sem hipocrisias.

FILMOGRAFIA

– “Tio Vânia em Nova York” (Vanya on 42nd Street), 1994

– “Perdas e Danos” (Damage/1992)

– “Loucuras de Primavera” (Milou en Mai/1989)

– “Adeus Meninos” (Au revoir les enfants/1987)

– “The Pursuit of Happiness” (1987/TV)

– “God”s Country” (1986/TV)

– “A Baía do Ódio” (Alamo Bay/1985)

– “Crackers” (1984)

– “My Dinner with André” (1981)

– “Atlantic City” (1980)

– “Menina Bonita” (Pretty Baby/1978)

– “Close Up” (1976)

– “Black Moon” (1975)

– “Lacombe Lucien (mesmo título em português) (1974) – “Humain, trop humain”(1974)

– “Place de la Republique” (1974)

– “O Sopro no Coração” (Le Souffle au coeur/1970)

– “L”Inde fantôme, L” (1969/TV)

– “Calcutta” (1968)

– “Histórias Extraordinárias” (Histoires extraordinaires/1968)

– “O Ladrão Aventureiro” (Le Voleur/1967)

– Viva Maria (mesmo título em português) (1965)

– “Bons baisers de Bangkok” (1964/TV)

– “Trinta Anos Esta Noite” (Le Feu follet/1963)

– “Vive le tour” (1962) curta-metragem

– “Vida Privada” (Vie privée/1961)

– “Zazie no metrô” (1960)

– “Os Amantes” (Les Amants/1959)

– “Ascensor para o Cadafalso” (Ascenseur pour l”échafaud/1958)

– “O Mundo do Silêncio” (Le Monde du silence/1956)

(Fonte: Veja, 24 de novembro, 1976 – Edição 429 – CINEMA – Pág; 125/126)
(Fonte: www.terra.com.br/cinema/favoritos – CINEMA / FAVORITOS / Por Ricardo Cota)

Por Ricardo Cota, é crítico de cinema do Jornal do Brasil há oito anos, com passagens pelas revistas Cinemin, Set, Tabu, Cinema e IstoÉ, além do jornal O Dia. Foi autor dos cursos Bergman/Woody Allen: Dois Cineastas Face a Face; Huston/Coppola: Os jogadores; e O Cinema Cantado, Breve História dos Musicais.

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