Heckel Tavares (1896-1969), compositor de (“Casa de Caboclo”, Favela”).

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O primeiro compositor a empregar oboé numa orquestra popular

Heckel Tavares (Satuba, 16 de junho de 1896 – Rio de Janeiro, 8 de agosto de 1969), compositor, maestro e arranjador alagoano de (“Casa de Caboclo”, Favela”). Foi para o Rio de Janeiro em 1921 e lá começou a estudar Orquestração com o maestro J. Otaviano. Ao lado de Waldemar Henrique, Marcelo Tupinambá e Henrique Vogeler, sob a influência nacionalista da Semana de Arte Moderna (1922), criou um tipo de música situado na fronteira do erudito e do popular. Iniciou-se profissionalmente como compositor de teatro de revista, fazendo em 1926 a música para a peça carnavalesca Está na Hora, de Goulart de Andrade, levada no Teatro Glória.

Ainda em 1926 apareceu regendo uma orquestra na revista Plus-ultra, no mesmo teatro. Tavares foi o primeiro a empregar oboé numa orquestra popular, num teatro de revistas, e após compor dezenas de canções de sabor brasileiro, como a canção “Guacira”, passou à música erudita, deixando inacabada uma “Rapsódia Nordestina” em que pretendia incluir rabecas, pífaros, ganzás, violas e até uma sanfona nordestina entre os instrumentos sinfônicos. A música popular brasileira perde Tavares, uma figura representativa da sua evolução, no dia 8 de agosto de 1969, aos 71 anos, no Rio de Janeiro.
(Fonte: Veja, 20 de agosto, 1969 – Edição 50 – GENTE – Pág; 61)

Heckel Tavares foi um compositor que passou muitos anos na fronteira entre o erudito e o popular. Ficou famoso muito cedo, através de suas canções populares com espírito folclórico. Depois tentou penetrar no terreno da música clássica e encontrou resistência de seus colegas e sobretudo da crítica especializada. Retraiu-se e viveu à parte do movimento musical brasileiro, mas sempre em atividade criadora. Estudou, aperfeiçoou-se, editou sua própria música, gravou-a em discos, distribuiu-a aqui e no estrangeiro, vendeu-a com relativa facilidade e realizou esse ideal extraordinário do artista que é viver exclusivamente do produto de sua arte, sem recorrer a “bicos” ou ao ensino. Sua obra é volumosa e merece apreciação bem mais cuidadosa do que lhe foi concedida. Seus trabalhos apresentam falhas, que o compositor era o primeiro a reconhecer, mas nem por isso devemos fingir ignorá-los. O êxito inegável de suas canções, mais de cem, e de seu Concerto para Piano e Orquestra garantem sua permanência em nossa história da música.

Nascido em 1896, em Satuba, Alagoas, estudou com a tia contra a vontade do pai, que preferia vê-lo dedicado à contabilidade. O pendor pela música venceu, mas nem por isso Heckel perdeu uma bem inspirada veia comercial. Veio para o Rio em 1921 e aqui se iniciou em orquestração com João Otaviano. Como compositor sempre foi autodidata: não tinha diploma algum e mostrava sua obra sinfônica a Souza Lima, que há anos o vinha orientando nesse terreno. Teve porém uma brilhante etapa de amplo sucesso no setor da música ligeira e popular, que examinaremos a seguir.

Fez teatro de revista e procurou criar um tipo especial de peças ligeiras para um público sofisticado, que infelizmente não era numeroso no Rio de Janeiro dos anos vinte. Seu primeiro grande sucesso foi Sussuarana, com letra de Luís Peixoto, depois ampliado pela valiosa interpretação de Gastão Formenti da sua Casa de Caboclo (1928). Famosos cantores da época divulgaram suas canções: Jorge Fernandes, Patrício Teixeira, Elsie Houston, Inesita Barroso, Clara Petraglia e, no exterior, Phyllis Curtin e Sarita Gloria. Dentre a obra vocal do compositor alagoano, saliento a inesquecível Favela, as delicadas Bia-tá-tá e Guacira, a expressiva Chove Chuva, a saborosa Bahia, a onomatopaica Banzo e o impressionante Funeral do Rei Nagô, tão divulgado nos últimos tempos, peça obrigatória de todo recital de um bom baixo. Não posso deixar de lembrar também a Oração do Guerreiro (1955), de fatura bem mais elevada, também para baixo, com valioso acompanhamento, ritmo atraente, e que requer considerável habilidade interpretativa e boa dicção.

A canção de Heckel Tavares é, de um modo geral, direta, singela, romântica, de bom gosto. Na primeira audição sua obra agrada e encanta, embora mais de uma vez posteriormente venha a cansar. No final da vida fez uma revisão de sua obra antiga para nova edição. Geralmente escreveu para vozes médias ou graves, com bom conhcimento das tessisturas e muira sonoridade. Por princípio, não usava temas folclóricos, nem harmonizava melodias populares e quase tudo o que fez foi com motivos próprios
Sua etapa erudita iniciou-se com o poema sinfônico André de Leão e o Demônio de Cabelo Encarnado (1935) sobre história de Goeldi. Viajou pelo país em pesquisa folclórica e disso resultou outro poema sinfônicao, Anhanguera, para orquestra, solistas e coro misto e infantil, baseado em temas dos índios do Alto Solimões. Seu Concerto para Piano e Orquestra agradou bastante, mais do que essas duas obras programáticas, que já chegavam um pouco tardias para o gosto da crítica. Concerto para Violino e Orquestra, sob formas brasileiras, confirma seu grande métier de músico, mas não trouxe novidades estéticas ou formais. Ao falecer, tinha já no papel parte de uma Rapsódia Nordestina para piano e orquestra.

Heckel Tavares é uma figura inesquecível, com sua basta cabeleira branca a esvoaçar ao vento, acentuando um temperamento agressivo, mas simpático. Faleceu no Rio em 1969.

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Vasco Mariz – História da Música no Brasil – Editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1981
(Fonte: api.ning.com)

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