Grupo Santa Helena, formado por artistas, eram quase todos principiantes na arte da pintura.

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Grupo Santa Helena, formado por artistas quando se conheceram, na década de 30, eram quase todos principiantes – ou pouco mais – na arte da pintura. Apenas dois ou três tinham pensado nela, até então, como uma possível carreira. Os demais provinham de ofícios em que tintas e pincéis estavam incluídos (como a decoração de paredes com frisos de frutos e florões, tão em moda nas casas daquela época), mas não se envolviam em questões de estética. Tinham ficado alheios – por idade e por classe social – às revoluções do modernismo. Também não possuíam formação acadêmica. Mas, apesar de tudo, sentiam-se pintores. Tanto que se encontravam, nos fins de semana, para ir retratar sem pretensões os arredores de São Paulo – tornando-se sobretudo paisagistas, com uma importante documentação pictórica de época.

A partir de meados dos anos 30, passaram a se reunir diariamente na sala 231 do Palacete Santa Helena, um prédio no centro de São Paulo, do qual acabaram herdando o nome. Independentemente de suas carreiras individuais, foi ainda como os pintores do Grupo Santa Helena que público, crítica e colecionadores os conheceram.

Formaram o grupo: Francisco Rebolo Gonsales (1902-1980), Fúlvio Pennacchi (1905-1992), Mário Zanini (1907-1971), Aldo Bonadei (1906-1974), Alfredo Volpi (1896-1988), Clóvis Graciano (1907-1988), Alfredo Rizzotti (1909-1972), Humberto Rosa (1908-1949) e Manoel Martins (1911-1979). Foram homenageados, na exposição “40 Anos do Grupo Santa Helena”, organizada no Paço das Artes, em São Paulo.

Ao contrário de outras exposições em que os artistas do grupo já tinham sido reunidos, esta exposição optou por obras de época. Foi ilustrado didaticamente o que foi de fato o Grupo Santa Helena, enquanto seus integrantes ainda possuíam ligações. De 1950 para cá, já não há nenhum sentido em considerá-los como um todo.

Por isso, foram fixados como limites os anos de 1935 (quando Rebolo e Pennacchi efetivamente passaram a trabalhar juntos no Santa Helena) e 1950. A coleta de telas levou quase um ano. De Zanini, por exemplo, são exibidos poucos trabalhos, porque um museu não quis ceder os de sua propriedade, alegando problemas de seguro. Ao fim de um custo elevado e de vastos esforços, o Paço conseguiu um conjunto de 87 telas de fato ilustrativo. Particularmente bem representados estavam Bonadei (quinze telas, uma por ano até 1949), Rebolo (catorze) e Volpi (doze). Mais importante para a visão crítica, entretanto, foi poder encontrar, a seu lado, a obra dos menos aquinhoados pela fama, como Rizzotti, Rosa e Martins.

Entre dois fogos – Visto em conjunto – e em obras só de época – o Grupo Santa Helena revelou de fato, primeiro, a certeza de que não houve, entre seus membros, nenhum ideário comum. Isto é: não se tratou de um movimento. Há estilos – e níveis – diferentes, deixando as coincidências sobretudo à área dos temas. Os elos de ligação habitualmente apontados entre os artistas são de caráter sociológico, não estético.

Provinham todos de classes humildes, sendo filhos de imigrantes, como Volpi e Pennacchi. Viviam frugalmente, e não de arte: Pennacchi chegou a ser açougueiro, Volpi, Rebolo e Rizzotti eram decoradores de parede. Rosa foi professor de ginásio, Zanini, no início, era letrista da Antarctica, marcando mesas e cadeiras de bar com o nome da companhia. E o ferroviário Graciano pintava as tabuletas de perdidas estações do interior paulista. Mantinham-se (ou eram mantidos) à margem dos movimentos oficiais. “Ficamos entre dois fogos”, disse Rizzotti lucidamente, num depoimento de 1971. “Os modernistas nos achavam mais ou menos acadêmicos, e os acadêmicos, muito avançados.” Em verdade, mais que avanço, havia a tentativa de suprir, pela intuição, a falta de uma formação artística de base, só possuída por Pennacchi (cujo aprendizado na Academia de Lucca permaneceu perceptível) e por Bonadei (que também estagiara na Europa). Os demais foram autodidatas, e se reuniram no Santa Helena justamente para praticar, sobretudo, o desenho do nu.

Dúvida ingrata – Os “40 Anos do Grupo Santa Helena” não chegou a reservar grandes surpresas. Na obra pintada entre 1935 e 1950, o artista que mais impressionou foi inquestionavelmente Aldo Bonadei, cuja técnica alia-se a uma sensibilidade aguda para as cores e a um acentuado sentido de estruturação do espaço. Volpi – que na obra posterior se transformou, para muitos, no maior artista vivo do Brasil – revela-se inquieto, em busca da linguagem pessoal que depois iria descobrir. E Rebolo confirmou sua aura de ser o mais lírico pintor do grupo.

Os demais apenas compuseram o pano de fundo para o brilho maior desses três. Os quase desconhecidos Rizzotti, Martins e Rosa comoveram em um ou dois quadros – sobretudo Martins, o mais interessante. Pennacchi comprovou sua segurança e o acerto nos temas sacros, que lamentavelmente abandonou. A julgar por essa amostra, Zanini continuou inexpressivo. E Clóvis Graciano – um dos mitos edificados pela arte brasileira entre as décadas de 40 e 60 – surge representado por um conjunto decepcionante. A ponto de suscitar uma dúvida ingrata: não seria tempo de uma revisão?

(Fonte: Veja, 26 de março de 1975 – Edição n° 342 – ARTE/ O grupo completo/ Por Olívio Tavares de Araújo – Pág; 92/93)

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