George Orson Welles, artista lendário, praticamente inventou a linguagem do cinema moderno.

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O Cidadão do cinema, a arte cinematográfica perde o mais genial dos mestres

George Orson Welles (Kenosha, Wisconsin, 6 de maio de 1915 – Hollywood, 10 de outubro de 1985), artista lendário, que revolucionou o rádio, o teatro e praticamente inventou a linguagem do cinema moderno. O talento do menino americano George para criar frases de efeito foi realmente precoce. “O desejo de tomar remédios é, uma das características que diferenciam os homens dos animais”, disse ele quando tinha 1 ano e meio de idade. Aos 4 anos, ele tocava violino para Maurice Ravel e Igor Stravinsky. Aos 16, subiu ao palco pela primeira vez, em Dublin, na Irlanda. Aos 18, percorreu os Estados Unidos atuando em Romeu e Julieta, de Shakespeare. Aos 20, dirigiu um Macbeth só com atores negros. Com 23, provocou pânico nos Estados Unidos irradiando, a invasão da Terra por marcianos. Aos 25, escreveu parte do roteiro, dirigiu e fez o papel central de Cidadão Kane, considerado hoje o melhor filme de todos os tempos. O nome de George Orson Welles tornou-se então uma lenda. Deixou uma antologia de frases célebres ao longo da vida.

“Não quero que nenhuma descrição a meu respeito seja exata”, “Nenhum ator pode interpretar outra pessoa a não ser ele mesmo” e “Paris é o lugar para onde vão os americanos bons quando morrem” foram alguns de seus ditos mais conhecidos. Na velhice, Welles ficou mais amargo, afirmando que era “uma velha árvore de Natal cujas raízes morreram” ou “comecei muito cedo e depois só poderia decair”. Nenhuma dessas frases pode explicar a vida e a obra grandiosa de Welles, mas todas elas lançam luzes sobre a misteriosa e trágica trajetória do gênio. Depois que fez Cidadão Kane, em 1941, o cineasta jamais conseguiu repetir o feito, ainda que tenha realizado alguns filmes inesquecíveis, como A Dama de Xangai (contracenado com Rita Hayworth, sua mulher na época), Macbeth, O Processo, Grilhões do Passado e Verdades e Mentiras, seu último trabalho, terminado há dez anos.

IMPRENSA E PODER – Esperava-se muito mais do garoto-prodígio que havia fundado o grupo teatral de vanguarda Mercury Theatre e, em 1938, explorado ao máximo as possibilidades dramáticas do rádio. Em outubro daquele ano, Welles transmitiu com tanto realismo A Guerra dos Mundos, de H. G. Wells, que milhares de pessoas acreditaram que os marcianos haviam descido em Nova Jersey e dizimado uma divisão do Exército americano. Adquirindo a notoriedade, ele foi convidado a trabalhar em Hollywood, nos estúdios da RKO, com total liberdade. O resultado foi Cidadão Kane, um filme extremamente inventivo tanto na técnica como na narrativa, parcialmente inspirado na vida do magnata da imprensa William Randolph Hearst.

Welles inaugurou no filme certos procedimentos, como o de contar a história misturando presente e passado (os flash-backs), usando o depoimento de vários personagens, que posteriormente seriam incorporados à linguagem do cinema mundial. Além disso, o diretor colocou a inventividade puramente técnica (as imagens superpostas, o cenário com fundo longínquo) a serviço de uma história de dimensões filosóficas que discute desde o significado do tempo (o trenó Rosebud lembrando na bola de vidro) até as relações entre imprensa e poder. Poucas vezes o cinema transformou ideias e sentimentos em imagens com tal brilho como em Cidadão Kane, que mais de quarenta anos depois de lançado ainda é objeto de análises, psicanalíticas e sociológicas. Ao mesmo tempo, é um filme a que se assiste com interesse e divertimento.

NO RIO DE JANEIRO – Cidadão Kane foi moderadamente elogiado pela crítica americana (só foi massacrado pelos jornais da cadeia de Hearst), não chegou a dar prejuízo e só começou a ganhar a fama que tem hoje ao ser lançado na Europa, depois do fim da II Guerra Mundial. Nesse momento, Welles já se havia transformado num problema para Hollywood. Curiosamente, o chamado declínio do diretor começou no Brasil, em 1942, um ano depois do lançamento de Kane. Welles veio ao país para filmar É Tudo Verdade, uma mistura de ficção e documentário em episódios. A confusão começou em Hollywood, pois o diretor voou para o Rio de Janeiro sem fazer a montagem de seu segundo filme, Soberba. No Rio, Welles foi jurado no concurso de fantasias do baile do Teatro Municipal, bebeu a valer (chegou a criar um aperitivo, o Samba em Berlim, feito com cachaça e Coca-Cola), frequentou a zona boêmia e deixou bons amigos. “Ele era um boêmio que ia quase todas as noites ao Cassino da Urca”, lembra o compositor Herivelto Martins.

Welles nunca terminou É Tudo Verdade (a maior parte dos negativos do filme só foi encontrada, num arquivo em Hollywood) e sua passagem pelo Brasil acabou de maneira patética. Ele pretendia filmar a epopeia de quatro jangadeiros cearenses que, meses antes de sua chegada, haviam navegado de Fortaleza ao Rio de Janeiro para pedir melhores condições de trabalho ao presidente Getúlio Vargas. Welles encontrou um dos participantes da viagem, o jangadeiro “Jacaré”, e o chamou para interpretar seu próprio papel em É Tudo Verdade. Numa filmagem na Baía de Guanabara, a 50 metros da praia, a jangada virou e Jacaré morreu afogado quando um pedaço de madeira bateu na sua cabeça.

FALASTRÃO MELANCÓLICO – De volta aos Estados Unidos, os problemas se agravaram. Soberba foi mutilado pela RKO, que reduziu de 140 para 88 minutos, e ele foi despedido da empresa. A partir de então, a feitura de seus filmes se tornou cada vez mais complicada. Welles não cumpria orçamentos, abandonava projetos no meio e, segundo alguns de seus biógrafos, sofria de uma incapacidade neurótica para terminar seus filmes. Desde 1958, ele não realizou mais nenhum filme nos Estados Unidos, passando a viver na Europa, onde também teve muita dificuldade em conseguir verbas. Seu último filme, Verdades e Mentiras, um curioso estudo sobre a ilusão da arte, foi feito há dez anos, na França, com capital iraniano. A despeito de toda essa balbúrdia, a obra de Welles é admiravelmente coerente. Seus temas foram a solidão do poder (Falstaff, Cidadão Kane, Macbeth), a impossibilidade do amor (Grilhões do Passado, A Dama de Xangai) e a magia da arte (Verdades e Mentiras).

A tragédia de Welles – filho de pais divorciados, a mãe era uma pianista fracassada e o pai, alcoólatra e inventor igualmente fracassado – foi não ter correspondido totalmente ao que se esperava dele. Nos últimos anos ele se tornou mais conhecido que seus filmes, desperdiçando seu talento ao interpretar o papel de Welles velho. Um velho glutão, bebedor, aferrado ao passado, falastrão e melancólico, que fazia comerciais de vinho na televisão. Ele já não pensava mais no destino de sua obra. “Nada poderia ser mais vulgar do que me preocupar com a posteridade”, disse, há quinze anos. A posteridade, é certo, fará justiça a esse artista que não pode ser explicado por nenhuma palavra menos poderosa que “gênio”. Ele não foi apenas o reflexo, o porta-voz ou mesmo a síntese da arte do cinema. Welles foi o próprio século do cinema.

No dia 10 de outubro de 1985, esse artista lendário, morreu de um ataque cardíaco, aos 70 anos, em Hollywood. Orson Welles morreu de maneira semelhante ao seu mais famoso personagem, Charles Foster Kane: velho, gordo, sozinho, na cama. Kane, no entanto, murmurou “Rosebud” (botão de rosa) antes de expirar, proferindo a palavra mágica que detona a trama do filme. No final de Cidadão Kane, o repórter que procurou decifrar o significado de Rosebud chega à seguinte conclusão: “Não acredito que qualquer palavra possa explicar a vida de um homem. Acho que Rodebud é apenas uma peça de um quebra-cabeça, uma peça perdida”. Welles, por sua vez, não disse nenhuma palavra que tenha sido ouvido quando estava à morte.

(Fonte: Veja, 16 de outubro, 1985 – Edição 893 – DATAS – Memória – Pág; 103/104)

Em 1° de maio de 1941 – O filme Cidadão Kane,de Orson Welles, estreou nos Estados Unidos.
(Fonte: http://www.guiadoscuriosos.com.br/fatos_dia – 1° de maio)

Em 30 de outubro de 1938 – O programa A Guerra dos Mundos, uma adaptação de Orson Welles para o texto de H.G. Wells foi transmitido nos Estados Unidos. A invasão de marcianos, narrada como se fosse ao vivo, deixou a população em pânico.
(Fonte: http://www.guiadoscuriosos.com.br/fatos_dia – 30 de outubro)

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