Foi o primeiro judeu a tornar-se professor titular de All Souls College de Oxford

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Isaiah Berlin, ensaísta que dedicou sua vida a discutir a natureza da liberdade e alertar contra o perigo das verdades absolutas. Nascido numa família que fugiu da revolução bolchevique de 1917, e com os avós, um tio, uma tia e três primos mortos em campos de concentração nazistas, Berlin passou a vida na Inglaterra, onde foi o primeiro judeu a tornar-se professor titular de All Souls College de Oxford. Comprou briga com os marxistas, por censurar os abusos da revolução e escrever uma biografia crítica de Marx. Mas considerava-se de esquerda, por defender a justiça social.
Sem crer em grandes verdades, achava que o maior desafio da humanidade era criar uma sociedade que respeitasse o pluralismo de ideias e modos de vida.
“A raposa sabe muitas, e o ouriço apenas uma”, dizia uma das frases favoritas de Berlin, retirada de um poema grego, que usou no seu livro sobre intelectuais russos. Ela também serve para resumir sua visão da filosofia. Berlin desconfiava de pensadores como Platão, Marx ou Hegel, “ouriços”, que tinham a pretensão de explicar o mundo em um grande sistema, e considerava-se uma “raposa”, como Maquiavel e Montaigne, que cultivavam ideias várias em escritos rápidos. Para ele, a discussão filosófica essencial dizia respeito à natureza da liberdade. Que não pode ser absoluta, porque nesse caso permite que os fortes aniquilem os fracos. Mas, sendo regulada, leva à questão: quem a controla, e com que direito?
No mundo acadêmico, Berlin era o que se costuma chamar de um pensador menor: um intelectual que escrevia bem, tinha ideias inteligentes e se destacava entre os mestres de Oxford, mas cujo impacto na história do pensamento não se comparava ao de seus contemporâneos de Cambridge – Bertrand Russell e Ludwig Wittgenstein -, nem mesmo ao dos existencialistas franceses. Seus comentários são precisos (“Gosto muito de Theodor Adorno, conversamos muito sobre música, mas nunca consegui entender nada do que ele escreve”), e suas críticas não são jamais levianas.
Berlin ironizava a própria preguiça em sistematizar as ideias e o conceito que desfrutava na academia. “Minha reputação é baseada numa superavaliação sistemática de minhas faculdades”, brincava. Amigo da boa mesa e do bom vinho, ele fez amizade com grandes fiiguras do século, de Freud a Stravinsky, passando por T.S. Eliot e Winston Churchill. Com o último, porém, só veio a se encontrar depois de um dos mais patéticos desencontros da História. Durante a II Guerra Mundial, Berlin trabalhou no serviço diplomático inglês. Churchill, admirado com o brilhantismo de seus relatórios, convidou-o para jantar. A conversa, porém, não fluía. Só depois de quase duas horas o primeiro-ministro descobriu que, no lugar do filósofo, os funcionários do cerimonial haviam convidado Irving Berlin, o compositor de God Bless America e Cheek to Cheek.
Isaiah Berlin, inimigo das verdades absolutas, morreu em novembro de 1997, aos 88 anos, depois de uma longa batalha contra o câncer.

(Fonte: Veja, 12 de novembro de 1997 – Edição 1521 – Memória/ Por D.N.G – Datas – Pág; 127)

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