Abelardo Rodrigues, juntou antigas imagens, e organizou a maior coleção de Arte Sacra do Brasil.

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Imagens sem preço

Abelardo Rodrigues (28 de agosto de 1908 – Recife, 18 de dezembro de 1971), pintor, desenhista e paisagista pernambucano. Durante quase quarenta anos, Abelardo Rodrigues juntou antigas imagens de madeira ou barro, percorrendo as mais velhas e remotas cidades brasileiras, e organizou a maior coleção de Arte Sacra do Brasil. Ao morrer, em dezembro de 1971, em Recife tinha a maior e mais rica coleção de imagens do século 20, com mais de mil peças do século XVI (de valor incalculável por sua raridade) ao século XIX (um preço mínimo de 300 cruzeiros, avaliado por outros colecionadores). Algumas delas foram expostas em março de 1972, em Brasília, organizadas pelo Itamaraty. Os governos de Pernambuco e Bahia, além de um museu da Alemanha, interessaram-se em adquiri-la. Segundo colecionadores e estudiosos da arte sacra brasileira, o preço é o grande mistério da coleção. Primeiro porque, de um modo geral, dificilmente se consegue provar que uma imagem é do século XVI ou do século XVII. Segundo porque, quando há provas (é o caso das peças reunidas por Abelardo Rodrigues), a imagem está fora de mercado, não tem preço.

Incalculável – Avaliações recentes podem dar uma ideia da importância das imagens mais antigas colecionadas por Abelardo Rodrigues. Um São Francisco Xavier de início do século XVIII, encontrada em Porto Alegre em 1970, teve oferta de 6 000 cruzeiros. Em julho de 1970, quando foi criado o Museu de Arte Sacra de São Paulo, três de suas 2 000 peças eram avaliadas em cerca de 1 milhão de cruzeiros: duas imagens talhadas no século XVII pelo escultor paulista frei Agostinho de Jesus (uma Nossa Senhora dos Prazeres e uma Santana Mestra) e outra do Aleijadinho (Nossa Senhora das Dores).

A imagem mais antiga da coleção de Abelardo Rodrigues é uma Nossa Senhora do século XVI, trazida de Portugal. Trabalhada em madeira policromada, tem um Menino Jesus no braço e um belo manto azul, branco e vermelho. Quase tão rara é uma Santa Luzia do século XVII, de feições egípcias, ostentando os olhos num prato. Do mesmo século e igualmente sem preço e raríssima, há uma Nossa Senhora com relicário, uma Nossa Senhora da Piedade com o Cristo sobre as pernas e duas imagens de Nossa Senhora da Conceição (uma delas de frei Agostinho de Jesus). Em meados da década de 1950 Rodrigues conheceu os trabalhos do Mestre Vitalino, em Caruaru, formando um grande acervo das produções do artesão. Estas peças foram, posteriormente, doadas para o então chamado Museu de Arte Popular, hoje denominado Museu do Barro, na cidade pernambucana.

O “verdadeiro tesouro” de Abelardo Rodrigues, como dizem com razão seus amigos, se encontra num andar superior e na garagem da casa onde ele viveu até morrer, em Recife. E deve permanecer no Brasil, segundo seu desejo desde quando começou a juntar imagens, aos 26 anos. O desinteresse oficial e mesmo do povo pela preservação da Arte Sacra Brasileira era o único assunto capaz de tirá-lo da calma habitual. Em 1971, quando a Igreja dos Martírios foi ameaçada de demolição para dar passagem a uma avenida, ele foi um dos líderes da campanha em defesa do prédio, como já havia feito em episódios semelhantes. E pouco depois sofreria o enfarte que o matou aos 63 anos.

(Fonte: Veja, 8 de março de 1972 – Edição n° 183 – ARTE – Coleção – Pág; 66 e 67)

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