Douglas Sirk, cineasta dirigiu alguns dos famosos filmes americanos do gênero melodramático

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Com 29 filmes, diretor influenciou de Almodóvar a autores de novelas brasileiras.

Douglas Sirk, foi sinônimo de melodrama (Foto: 2001video.empresarial.ws/Divulgação)

Douglas Sirk, foi sinônimo de melodrama (Foto: 2001video.empresarial.ws/Divulgação)

 

Douglas Sirk (Hamburgo, 26 de abril de 1900 – Lugano, 14 de janeiro de 1987), cineasta que dirigiu alguns dos mais famosos filmes americanos do gênero melodramático, como Sublime Obsessão, que projetou Rock Hudson para o sucesso, e Imitação da Vida, estrelado por Lana Turner e John Gavin. Nascido na Alemanha, Sirk fugiu para os Estados Unidos em 1937, levando a mulher, judia.

Definir um filme como melodramático soa, por vezes, quase como acusação. De que a obra merece todos os adjetivos depreciativos: existe para consumo fácil, é popularesca, uma fraude e um clichê sentimentalista, com música onipresente e atuações afetadas. Por trás do rótulo, contudo, pode haver valor artístico – e é isso que pretende mostrar a retrospectiva “Douglas Sirk: O Príncipe do Melodrama”.

 

O diretor Douglas Sirk, em 1943. Cineasta ganha mostra em São Paulo (Foto: AFP/The Kobal Collection)

O diretor Douglas Sirk, em 1943. (Foto: AFP/The Kobal Collection)

 

O alemão Douglas Sirk, aportou em Hollywood no início dos anos 1940, onde permaneceria até 1959. Antes, fizera teatro e cinema – rentáveis – em seu país natal. Marido de uma atriz judia, vinha fugido de Hitler. “Eu só estava mais ou menos a salvo porque meus filmes [alemães] davam muito dinheiro”, conta ele no documentário francês “Alguns dias com Douglas Sirk”. A valorização posterior da obra de Sirk é associada, em boa medida, à influência exercida em autores de boa reputação – alguns, inclusive, têm filmes programados em “Douglas Sirk: O Príncipe do Melodrama”. O alemão Rainer Werner Fassbinder (1945-1982) era admirador confesso. Mike Leigh e Todd Haynes estão entre os seguidores. E há o espanhol Pedro Almodóvar, cujos trabalhos recorrem visivelmente a Sirk: a mulher no centro das ações, as cores.

 

Dorothy Malone e Rock Hudson em cena do longa "Almas maculadas" (Foto: Divulgação)

Dorothy Malone e Rock Hudson em cena do longa “Almas maculadas” (Foto: Divulgação)

 

Lugar da mulher e ‘subversão’

Fundamentalmente popular, e comercial, o cinema de Douglas Sirk antecede a novela em alguns de seus aspectos essenciais. No longa “Tudo o que o céu permite” (1955) – um dos mais conhecidos do cineasta e que teve refilmagem de Todd Haynes –, uma viúva “papel de Jane Wyman” (1917-2007) apaixona-se por um jardineiro (Rock Hudson). Estão numa pequena cidade dos Estados Unidos, onde todos sabem da vida de todos, onde a obediência às convenções costuma se sobrepor a desejos como os sentidos pela protagonista. Mas ela parece gostar mesmo do sujeito e do desapego que ele proporciona, no que é recriminada pelo casal de filhos universitários e pela vizinhança. De um lado ou de outro, a viúva terá, enfim, de renunciar.

A “astúcia” de Sirk foi “usar o melodrama como uma espécie de gênero popular que esconde significados subversivos”, como exemplo, cita o papel que as mulheres ocupavam na década de 1950. Nos filmes de Sirk, elas não seriam “simplesmente vítimas”: Não é só o Sirk que faz melodrama, mas no Sirk está muito evidente a forma como se articula o melodrama para dizer alguma coisa a mais.

Dizer alguma coisa a mais significa, novamente, conceder lugar distinto à figura feminina. “Aquele tipo de cinema não é do homem – é da mulher. Os homens funcionam um pouco como escada”. E uma das escadas habituais foi Rock Hudson (1925-1985), presente em nove das produções de Sirk em Hollywood. Sobre o astro, o diretor comenta, no citado documentário: “Eu o transformei num ator, de tanto ensaiar com ele”.

 

Cena de 'Recomeçar a vida', filme que está na programação da mostra (Foto: Divulgação)

Cena de ‘Recomeçar a Vida’, filme que está na programação da mostra (Foto: Divulgação)

 

Hudson se tornaria, adiante, famoso ainda por sua trajetória controvertida: o homossexual que, pressionado a manter a imagem de galã, engajou-se num casamento de fachada com uma mulher; anos depois, já declarada sua orientação, morreria por causa da Aids. “O papel dele nos filmes [de Sirk]é um pouco o de bonitão, de bibelô. É uma lógica comercial”. “O Sirk inventa a figura masculina do Rock Hudson, esse homem perfeito dos anos 1950. Uma imagem muito cativante, e o Sirk é o cara que faz a operação.”

 

Rock Hudson, o astro de Hollywood, um dos mais desejados do cinema nas décadas de 1950 e 1960. (Foto: Film Society of Lincoln Center/Divulgação)

Rock Hudson, o astro de Hollywood, um dos mais desejados do cinema nas décadas de 1950 e 1960. (Foto: Film Society of Lincoln Center/Divulgação)

 

Resgate
Esses ingredientes básicos do melodrama bastavam para o público – mas excediam para os críticos de então, que repudiavam os exageros e os artifícios do estilo. A chamada “reabilitação” de Douglas Sirk começa pouco antes de ele partir de Hollywood. Alguns dos primeiros a enxergar nele algo além da banalidade foram os críticos e cineastas da publicação francesa “Cahiers du Cinéma”. Elogiado por Jean-Luc Godard, François Trufautt e companhia, o diretor viu melhorar sua reputação. Também contribuíram alguns estudos universitários, já na década de 1970.

Essa leitura é totalmente acadêmica, de inspiração feminista e freudiana. É ela que vai identificar no melodrama uma zona de confronto. De todos os gêneros, o melodrama foi o mais achincalhado. O western foi reabilitado, o noir virou a grande inspiração de todo mundo – e o melodrama ficou para gente que gosta de novela.

Não era totalmente involuntária, contudo, a opção de Douglas Sirk, embora suas decisões tenham sido calculadas conforme as circunstâncias. Na Alemanha, Sirk a certa altura saiu da direção de um teatro mais elitista, em Hamburgo, para assumir o palco de uma cidade menor, “onde ele teve de montar textos populares – não podia mais montar só Shakespeare ou Molière, por exemplo”.

Sirk falava que, a partir dali, descobriu como poderia usar o popular para mesclar com o erudito. Quer dizer, é a mesma estratégia que ele vai usar a vida inteira.

O Brasil também tem estado em dívida com Douglas Sirk: muitos de nossos novelistas já citaram o cineasta como fonte de inspiração. Num texto publicado em seu site em abril de 2011, Aguinaldo Silva fala precisamente sobre melodrama, cujas origens remontam à ópera. E escreve isto: “[Com o cinema] o melodrama passou a ser considerado o reino das histórias melosas e das interpretações exageradas. (…) Hoje uma releitura nos mostra que não foi bem assim. O melodrama no cinema, cujo mestre supremo foi o grande, imenso São Douglas Sirk (a volumosa biografia deste ‘santo’ serve de base ao meu monitor aqui em Lisboa)…”.

“O que os caras das novelas entenderam é que aquele modelo funcionava – e continua funcionando”, observa Cássio Starling Carlos. “Porque é um público iletrado, vamos dizer assim, e que absorve aquelas lições a partir desse gênero de valores muito prontos. As figuras no melodrama são todas claramente definidas: a má, o salvador… A gente copiou isso? Não, mas a gente filtrou a partir da nossa sociedade.”

O cineasta morreu dia 15 de janeiro de 1987, aos 86 anos, de câncer, em Lugano, na Suíça.

(Fonte: Veja, 21 de janeiro de 1987 – Edição 959 – DATAS – Pág; 83)

(Fonte: http://g1.globo.com/pop-arte/cinema/noticia/2012/05 – Douglas Sirk: O Príncipe do Melodrama – POP & ARTE – CINEMA/ / Por Cássio Starling Carlos, ao lado de Pedro Maciel Guimarães / Por Cauê Muraro Do G1, em São Paulo – 16/05/2012)

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