Renée Gumiel, bailarina e professora fundadora da Companhia de Dança Contemporânea Brasileira.

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A bailarina, fundadora da Companhia de Dança Contemporânea Brasileira, participou do espetáculo “Os Sertões”, de José Celso Martinez Correa

Renée Gumiel (Saint-Claude, 20 de outubro de 1913 – São Paulo, 10 de setembro de 2006), bailarina e professora fundadora da Companhia de Dança Contemporânea Brasileira.

Uma bailarina incansável, forte, apaixonada pela arte. Renée Gumiel andava lentamente, sua figura aparentemente frágil escondia uma mulher forte, amante das artes. Sua presença nos teatros era certa, sempre com um cigarro entre os dedos, batom vermelho nos lábios e uma taça de champanhe.

Jamais abandonou os palcos, recentemente viajou para a Alemanha ao lado do consagrado bailarino Ismael Ivo, atuou nos espetáculos de do diretor José Celso Martinez Corrêa, na seqüência de “Os Sertões” e em janeiro dançou “Cinzas”, no Sesc Pinheiros.

Renée Gumiel foi sem dúvida uma das figuras marcantes da dança moderna brasileira. Sua vida poderia ser adaptada como roteiro para cinema – histórias não faltam para isso. Ela costumava contar com orgulho a suas experiências pelos teatros europeus, parcerias com figuras históricas como os brilhantes Igor Stravinski e Jean Cocteau.

Também nunca se esqueceu das amarguras de uma guerra, da dureza de enfrentar e resistir aos exércitos de Franco durante a Guerra Civil Espanhola, e de resistir aos nazista durante a Segunda Guerra Mundial. Some a tudo isso, a paixão pela vida: resistiu a três cânceres.

A força de Renée vinha do amor por sua arte, dela tirava forças para superar as adversidades e os desafios. Ainda muito jovem, aos 17 anos perdeu a mãe, Marguerite vítima de leucemia, seu pai Maximiliano foi vítima dos nazistas, em junho de 1943, enquanto a jovem bailarina se refugiava na Espanha.

A bailarina nasceu na cidade francesa de Saint-Claude, onde teve o seu primeiro contato com a dança aos cinco anos. O balé a acompanhou em todos os momentos, mesmo quando tentou mudar de ares, estudou psicologia e filosofia na Sorbonne, mas seu destino era o palco. Foi aluna de mestres como Rudolf Laban (1879-1958) e Kurt Joss.

Com Laban aprendeu os componentes rítmicos da dança, a ação da força da gravidade sobre os movimentos e as múltiplas qualidades do gesto. De Joss, o precursor da dança expressionista alemã, Renée herdou a capacidade de investigação e o modo de estimular seus alunos e bailarinos a pesquisar. Em entrevista ao Estado, disse: “os bailarinos clássicos ficam restritos à técnica, mas também sou contra a essa mistura de malabarismos e acrobacias às coreografias. A dança vai muito além disso, é importante expor a individualidade de cada intérprete, deixar que digam algo e liberar a imaginação.”

Sua dança toma por base os gestos do cotidiano, atitudes inspiradas nas ações humanas. A expressividade dramática nascia de um jogo entre a tensão e descontração. Para ela, cada gesto é como uma palavra. Precisamos de pausas. Na sua concepção, os artistas precisam descobrir o próprio corpo – o rosto, os músculos e os ossos – e sentir na pele cada movimento.

Jamais separou dança e música, o corpo seguia o encadeamento e as pausas. A paixão pela grandes composições levou Renée a estudar com um dos pioneiros da música eletrônica, Karlheinz Stockhausen. Em 1937, dançou “L’Histoire du Soldat” com orquestra regida por Igor Stravinski no Teatro Champs Elysées, em Paris e em 1938, apresentou “Les Parents Terribles”, roteiro de Cocteau. Esses fatos nunca foram comprovados pela coreógrafa, que costumava justificar que teve todos os seus documentos e recortes de jornais confiscados quando estava presa na Espanha, durante a 2.ª Guerra.

Como coreógrafa também buscou o diálogo entre a dança e a literatura, montou obras inspiradas em Kafka, Sartre e Brecht, sempre em busca da expressividade. Em 1979, flertou com o butô de Takao Kusuno na montagem de “As Galinhas”, ao lado de Ismael Ivo. E em 1997 foi premiada como melhor atriz no Festival de Gramado por sua atuação em “Ruído de Passos”, de Denise Gonçalves. Prêmios não faltaram, em 1996 a Unesco lhe concedeu o Mérito Artístico em Dança. Trabalhou com o diretor de teatro José Celso Martinez Correa, do Oficinal, onde atuou em “Cacilda!” e na série “Os Sertões”.

Brasil

Assim que desembarcou no País abriu sua primeira escola, nos idos de 1957. O endereço: Rua Augusta, 877. Lá construiu a sua história brasileira e a da dança moderna em São Paulo. Permaneceu três anos na cidade, cansou. Voltou em 1960 para a Europa, com o intuito de trabalhar com Kurt Joss (1901-1979) na Alemanha. Não conseguiu ficar distante do Brasil, voltou no ano seguinte e montou novamente sua escola, que permaneceu aberta até 1988. O sucesso das aulas, que Renée nunca abandonou, propiciou a criação, em 1964, de seu primeiro grupo: a Companhia de Dança Contemporânea Brasileira. Um feito: superou a incompreensão do público acostumado ao balé clássico e os preconceitos.

Sua atuação transpôs os limites da dança. Atuou com atores, como Irene Ravache em 1977, quando fez a preparação corporal da atriz para a peça “Os Filhos de Kennedy”. Também trabalhou com Renato Borghi, Sérgio Brito, Raul Cortez e Marília Pêra. Além de influenciar e formar gerações de bailarinos, como Marika Gidali, diretora do Balé Stagium.

Renée deu seu último adeus aos palcos. Morreu em 10 de setembro de 2006, aos 92 anos, no Hospital Santa Cruz, em São Paulo, vítima de bronco-pneumonia.

(Fonte: http://www.estadao.com.br/arquivo/arteelazer/2006/not20060911p1483 – CADERNO 2 – VARIEDADES – 11 de Setembro de 2006)
(Fonte: http://www.selecoes.com.br – GENTE & HISTÓRIAS/ Por Regina Echeverria – Fevereiro de 2007 – Pág: 130/133)

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