Mário Andreazza, ex-ministro dos Transportes e do Interior de três governos militares

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Ministro dos Transportes dos governos Costa e Silva e Médici, foi o responsável por grandes obras realizadas no período da ditadura, como a ponte Rio-Niterói e a rodovia Transamazônica.

 

Mário David Andreazza (Caxias do Sul, 20 de agosto de 1918 – São Paulo, 19 de abril de 1988), ex-ministro dos Transportes e do Interior de três governos militares. O tocador de obras, o ministro das pontes e estradas, que chegou a sonhar com o Planalto. Integrado à maioria das conspirações militares dos anos 50, em 31 de março de 1964 o coronel Mário David Andreazza tomou um bonde que daria muitas voltas, alguma triunfais. Era o bonde do ciclo dos presidentes militares. No 15 de março de 1985, quando o bonde – apedrejado – estacionou como sucata num triste terreno baldio, Mário Andreazza foi um dos últimos passageiros a descer – a maioria de seus antigos companheiros de viagem estava embarcada no lotação da chamada Nova República. Personalidade ligada, de forma indissolúvel, ao regime de 1964, foram seus companheiros do bonde de 31 de março, e que integram o primeiro escalão do governo do presidente José Sarney, que seguraram a carreta com seu caixão.

Acompanhado por 300 pessoas, entre as quais quinze ministros de governos passados e outros cinco que integram a equipe do presidente José Sarney, o funeral de Mário Andreazza foi uma cerimônia com momentos muito delicados. Com seu temperamento folclórico e inconveniente, o ex-presidente João Figueiredo demonstrou, no Cemitério São João Batista, que circula pelo mundo dos vivos – mas parece dialogar com os mortos. Uma repórter do Jornal do Brasil lhe fez, ao longo do velório, uma pergunta banal nessas situações. Quis saber se ele havia “sentido muito a morte do amigo. Isso não é pergunta que se faça, respondeu o ex-presidente. Eu só não lhe dou uma resposta porque você é uma moça, acrescentou.

DESMANCHA-VELÓRIO – Em 1974, quando estava no ponto mais alto de sua gestão no Ministério dos Transportes, onde chegou em 1967 pelas mãos do presidente Arthur da Costa e Silva, atravessou o período em que o país esteve sob o governo da Junta Militar de 1969, e só saiu com a posse de Ernesto Geisel, Andreazza cruzou a ponte Rio-Niterói num passeio inaugural a bordo de um Rolls-Royce em companhia do presidente Emílio Medici. Na ocasião, Figueiredo estava bem perto de Andreazza: sentado no banco da frente, ao lado do motorista, como chefe da Casa Militar.

Dez anos depois, no final da dramática convenção do PDS onde acabou massacrado pelos votos do deputado Paulo Maluf, seu rival na disputa pela vaga de candidato a presidente contra Tancredo Neves, Andreazza ficou sozinho na hora de enrolar a bandeira de campanha. Figueiredo, que simulara apoiar seus movimentos contra Maluf na sucessão, terminou por abandoná-lo. No cemitério, a grosseria do ex-presidente confirmou sua nova especialidade pública – a de desmancha-velório -, causou mal-estar entre os presentes e boa parte deles preferiu sair de perto. Em 1985, no velório do ex-presidente Emílio Medici, a presença de Figueiredo também fora motivo para outra cena constrangedora. “Vai lá, canalha”, disse-lhe Eduardo Medici, neto do ex-presidente, quando Figueiredo chegou para o velório no Clube Militar.

Andreazza começou a morrer quando foi derrotado na convenção do PDS”, afirma o ex-ministro Camilo Penna, da Indústria e Comércio. Ele chega a contar, com ar patético, que antes da convenção fora visitar Andreazza em sua casa, vizinha à de Maluf, em Brasília, e teve dificuldades para entrar de tanta gente que havia à porta. Depois, lembra Camilo Penna, ocorreu o oposto. “Havia tanta gente na porta de Maluf que quase não consegui chegar à casa dele. O comportamento observado por Camilo Penna não chega a ser espantoso, mas é o resultado de uma soma de atitudes corriqueiras nos políticos habituados a apertar a mão dos vencedores – como ele próprio.

ANDREAZZA: 1 TRILHÃO – Aluno brilhante no Colégio Militar, Andreazza foi um ministro que, dentro do governo, tinha a fama de tocador de obras – entregou a Pasta dos Transportes, por exemplo, depois de pavimentar 25 000 quilômetros de estradas de rodagem, o dobro de tudo aquilo que havia no país quando tomou posse. Construiu uma estrada que serviu de bandeira para o Brasil Grande do AI-5, a Transamazônica, mas fez uma ponte, a Rio-Niterói, que todos os dias é utilizada por 150 000 pessoas.

 

Construção da Transamazônica

Assinatura do contrato de construção da Transamazônica: em primeiro plano, os ministros Delfim Neto e Mário Andreazza (Acervo O GLOBO / Arquivo 06/08/1970)

 

Numa época de crédito internacional farto, Andreazza firmou o currículo de maior tocador de obras do país desde Juscelino Kubitschek. Tanto nesse ministério como no outro, do Interior, Andreazza ficou à frente de atividades que mobilizavam muito dinheiro. Ele gastava tanto que, ao deixar o governo Figueiredo, em 1979, o ex-ministro Mário Henrique Simonsen cunhou uma moeda com seu nome, o andreazza, para estabelecer a marca de uma grande fortuna em matéria de gastos públicos, estimada, na época, em 1 trilhão de dólares.

Modesto, pelos seus hábitos, e otimista, por temperamento, Andreazza era pessoa agradável de se conviver. Ele mantinha um padrão de vida pouco superior ao que lhe permitia o soldo de coronel da reserva – mas bastante inferior, por outro lado, ao dos donos e diretores de empreiteiras que fizeram negócios milionários graças às obras que ele construía. Sob o governo de Ernesto Geisel, o ex-ministro de uma das pastas mais ricas do governo foi obrigado a trabalhar para viver, com um emprego como vice-presidente da Companhia Atlântica Boavista de Seguros.

Consumidor de três maços de cigarro por dia, em 1986, Mário Andreazza descobriu que tinha câncer no pulmão esquerdo. Chegou a fazer uma pequena cirurgia, para extrair um nódulo do pulmão. Mais tarde, a doença espalhou-se pelos gânglios e vias respiratórias. Internado no hospital Sírio Libanês, em São Paulo, Mário Andreazza, aos 69 anos, submeteu-se a tratamentos à base de quimioterapia. Quando concluíram que nada mais poderiam fazer para salvá-lo, os médicos cuidaram para que não morresse pelo bloqueio das vias respiratórias, bastante doloroso – mas de parada cardíaca, reforçando transfusões de sangue para forçar o coração a trabalhar.

Com dificuldade para comunicar-se com as pessoas que o visitavam, na terça-feira, dia 18 de abril, 1988, sua mulher, Liliana, e os dois filhos, o engenheiro Mário Gualberto Andreazza, e o administrador de empresas Atílio Andreazza, aproximaram-se de sua cama. O ministro morreu abraçando sua família. Antigo chefe de uma pasta que movimentava bilhões de dólares, um grupo de amigos se cotizou para pagar o transporte, de avião, de seu corpo até no Rio de Janeiro.

Mário Andreazza morreu dia 19 de abril, 1988, aos 69 anos, de câncer, em São Paulo, foi enterrado no cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro.

(Fonte: Veja, 27 de abril, 1988 – Edição N° 1025 – DATAS – Pág; 91 – MEMÓRIA – Pág; 26/27)

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