Frank Schirrmacher, um dos mais famosos jornalistas alemães

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Frank Schirrmacher (Wiesbaden, 5 de setembro 1959 – Frankfurt, 12 de junho de 2014), um dos mais famosos jornalistas alemães, ele foi jornalista, ensaísta e autor.

O filósofo alemão Frank Schirrmacher acreditava que a humanidade está às vésperas de uma revolução econômica, política e cultural, motivada por uma modificação demográfica radical: o envelhecimento da população. “Nosso envelhecimento pessoal, não apenas o envelhecimento abstrato das estatísticas oficiais, já está sendo tratado como uma catástrofe natural”, escreveu Schirrmacher em seu livro O Complô Matusalém lançado em 2004 na Alemanha.

Ele aconselha os jovens a mudar de comportamento em relação aos idosos desde já, sob o risco de verem a própria ruína em um futuro próximo. Doutor em filosofia pela Universidade de Cambridge, na Inglaterra, Schirrmacher tem 44 anos, é diretor do Frankfurter Allgemeine, um dos jornais mais tradicionais da Alemanha, e publicou mais de uma dezena de livros em que se dedica a analisar a sociedade moderna.

As estatísticas do envelhecimento da população mundial mostram isso. Em 2050, viverão na China tantas pessoas com mais de 65 anos quanto hoje em todo o mundo. Nesse período, o número de idosos no planeta vai triplicar, enquanto o resto da população aumentará apenas 50%. O total de homens e mulheres centenários se multiplicará por dez. Na América Latina, o número de pessoas com mais de 80 anos será quatro vezes maior que agora.

Na Alemanha, em apenas uma década haverá mais indivíduos acima dos 50 anos do que abaixo dessa idade. Quando chegarem à terceira idade, as mulheres alemãs que hoje têm 30 anos serão a maioria no país. Pela primeira vez na história, o número de velhos será maior que o de crianças. A humanidade envelhece numa rapidez nunca vista antes.

Em 99,99% da história da humanidade as pessoas nunca viveram mais que trinta ou 35 anos. A experiência de ficar velho, de viver sessenta anos ou mais, é muito nova. Nossa sociedade foi construída com base na expectativa de vida do século XIX.

Nossas instituições, o casamento, o Estado, as empresas e o sistema de previdência, como conhecemos hoje, vêm de uma época em que apenas 3% das pessoas ultrapassavam a barreira dos 65 anos.

É como uma roupa que ficou muito curta. Não estamos adaptados a essa nova realidade. O resultado é que desperdiçamos o maior recurso que temos: tempo de vida. Os idosos não podem mais ficar em casa, esperando o tempo passar. Nossa velhice não será confortável. Temos de descobrir o que fazer com a segunda vida que ganhamos de presente.

Temos de revolucionar o modo como os idosos são vistos e tratados. Nossas sociedades não vão sobreviver se o seu maior grupo populacional for colocado à margem, como ocorre hoje.

Tiramos dos velhos sua dignidade, seu posto de trabalho e sua biografia. São tratados como um estorvo, como seres improdutivos, sem memória, maçantes e fracos. Imagine uma sociedade em que metade da população sofre esses preconceitos.

Esse será o mundo em que viveremos, se não mudarmos o conceito do envelhecimento a partir de agora. Será um mundo em que a metade mais jovem vai rechaçar a metade mais velha. E os idosos sentirão raiva de si mesmos por consumir os recursos da sociedade sem construir ou produzir nada.

O sentimento de culpa pelo envelhecimento é instintivo. A natureza não se interessa mais por seres que não podem se reproduzir. No reino animal não há envelhecimento. Um ser que perde a função reprodutiva morre ou é morto. Ou simplesmente não chega a esse estágio. Ele vira uma ameaça para o grupo, porque não faz mais nada além de se alimentar. Nos humanos, o sentimento é o mesmo.

Costumamos dizer que não queremos viver até uma idade muito avançada e nos programamos para morrer mais cedo do que as estatísticas prevêem. Achamos feios aqueles que parecem não estar mais em idade reprodutiva e desprezamos os que não trabalham mais. Isso tem de mudar. Já estamos vivendo uma revolução na sexualidade que doma nosso instinto. A pílula contra a impotência masculina é um dos maiores responsáveis por essa mudança de comportamento. O próximo passo é levar a revolução dos velhos ao mundo do trabalho. E, por fim, mudar o modo como eles são vistos pela sociedade.

Hoje, cada quatro trabalhadores americanos e europeus sustentam um aposentado. Quando eu estiver velho, essa proporção será de um para um, o que é economicamente inviável. Nos países em desenvolvimento, o crescimento espantoso da expectativa de vida vai causar o mesmo problema. Por isso, as pessoas deveriam trabalhar até uma idade mais avançada, desde que a profissão o permita.

Em compensação, quem tem entre 30 e 40 anos e possui filhos deveria trabalhar menos. E ganhar mais. Está errada a ideia de que os salários devem aumentar quanto mais tempo de serviço o trabalhador tem. Pais que ainda estão criando suas crianças precisam ganhar mais que aqueles cujos filhos já são adultos. Por outro lado, deve-se dar aos idosos as mesmas condições que são oferecidas aos empreendedores jovens para abrir um novo negócio. Atualmente, os bancos dificultam os empréstimos para pessoas acima de 60 anos.

Os idosos podem ser mais lentos ou menos vigorosos, mas compensam com a maior experiência e a confiança no próprio trabalho. O que se deve fazer é empregá-los em funções adaptadas às suas qualidades. Não há estudo que prove que eles são piores no trabalho que os outros. Isso vale apenas para a minoria dos casos. O problema é que, quando você convence alguém de que ele não consegue mais trabalhar, ele realmente não vai mais conseguir. É o que se faz hoje em dia com as pessoas mais velhas.

A guerra vai começar não com os jovens se voltando contra os velhos, mas com os velhos se jogando uns contra os outros. A disputa se dará entre os que têm e os que não têm filhos. Os que tiverem acusarão os outros de só terem vivido para ganhar dinheiro, sem ter se preocupado com a reposição da população, necessária para sustentar o sistema previdenciário.

Isso já está ocorrendo na Alemanha. Mas a verdadeira guerra das gerações se dará na forma de um choque de civilizações. Enquanto a Europa, os Estados Unidos, a América Latina e a Ásia envelhecem, ocorre uma grande explosão de natalidade nos países árabes.

Sociedades com muitos jovens costumam ser muito inquietas, agitadas e instáveis. Isso ocorreu na Alemanha, quando surgiu o nazismo. A Revolução Francesa se deu em um país com muitos jovens. A revolução iraniana aconteceu nas mesmas condições. Esse fenômeno agora está sacudindo todo o mundo árabe. A Faixa de Gaza será o território mais jovem do mundo, com uma idade média de 16 anos. Nos próximos anos, os jovens entre 14 e 24 anos em países como o Egito, o Irã, a Arábia Saudita e a Síria vão representar 20% da população. Haverá enorme pressão política e migratória sobre as sociedades ocidentais. O terrorismo já é uma das conseqüências da instabilidade dos países árabes.

 

A mudança tem de começar pelas propagandas, pelos filmes e pelos programas de TV. As pessoas mais velhas não podem mais ser retratadas sempre como bizarras, loucas ou patéticas. Precisamos de uma campanha de imagem positiva para o envelhecimento. Em 1999, pesquisadores alemães mostraram que crianças de 4 anos de idade que nunca viram desenho animado se comportavam naturalmente quando estavam com idosos. Aos 6 anos, depois de assistirem a vários filmes de animação, as mesmas crianças passaram a ter medo das pessoas mais velhas. Não é à toa. As histórias infantis retratam os velhos como maus, estúpidos ou horríveis. Os jovens não são os únicos que devem mudar o conceito em relação aos idosos. Os velhos também devem modificar a imagem que têm de si mesmos. É preciso amenizar o culto à juventude que existe hoje.

 

Em maior ou menor grau, ele sempre existiu, porque os jovens sempre foram maioria. Já o culto moderno à juventude teve início na segunda metade da década de 40, nos Estados Unidos, quando começaram a nascer os baby boomers(nascidos no período de altos índices de natalidade após a II Guerra). Eles transformaram a sociedade radicalmente. Em quinze anos nasceram 70 milhões de pessoas. O fenômeno ocorreu também em menor proporção em outros países. Osbaby boomers provocaram uma revolução no consumo quando se tornaram adolescentes, porque eram muitos e tinham poder de compra. O culto à juventude surgiu como resultado desse fenômeno econômico.

 

As pessoas da geração do baby boom, que revolucionaram a moda, o consumo e a tecnologia no século XX, nos próximos vinte anos estarão aposentadas. Elas detêm hoje 70% do poder de compra nos Estados Unidos e não poderão ser ignoradas. É a geração que dará início à revolução da terceira idade. O que não podemos é esperar ficar velhos para começar a transformar a imagem dos idosos na sociedade. Temos de começar a partir de agora, enquanto somos fortes e poderosos. Depois, nossa credibilidade será menor. Todos aqueles que nasceram entre 1960 e 1980 devem se juntar à revolta. Teremos de modificar em poucas gerações um modelo biológico e cultural construído ao longo de milhares de anos.

 

Está ocorrendo uma infantilização da sociedade. É uma reação ao envelhecimento. O corpo envelhece, mas a personalidade se recusa a acompanhar a mudança. É comum vermos pessoas de 25 a 40 anos que falam ou se vestem como criança. A série de livros infanto-juvenisHarry Potter faz mais sucesso entre adultos que entre crianças. É como uma operação de beleza. Harry Potter é uma cirurgia de beleza para a alma. Faz parte do fenômeno da negação do envelhecimento que existe hoje.

 

O efeito social das técnicas de rejuvenescimento varia de indivíduo para indivíduo. O interessante é que o assunto é tratado como tabu. Apesar de todos fazermos de tudo para parecer mais jovens, criticamos quem se submete a tratamentos de embelezamento. Quando se transforma o corpo com cirurgias plásticas, o que está em jogo é simplesmente se a pessoa está satisfeita consigo mesma ou não. Isso não pode ser censurado. Mas, quando um idoso tenta parecer mais jovem, nossa reação é considerá-lo um impostor. A origem disso é, novamente, o instinto animal. Ao assumir uma aparência jovial, o idoso atrapalha, simbolicamente, a função dos jovens de ter e criar filhos. É como se não fosse permitido aos velhos parecer que ainda estão em idade de reprodução.

 

Nas passarelas de moda, modelos de 13 ou 16 anos são vestidas e pintadas para que pareçam ter 30. Obviamente, qualquer um percebe que elas são bem mais jovens. Por isso, ao se comparar com elas, até uma mulher de 25 anos se sente velha e feia. O ideal de beleza e juventude nos faz sentir culpados e infelizes, mesmo quando ainda somos jovens. Isso desperta em gerações inteiras a sensação de punição e de falta de amor.

 

As famílias serão mais verticais, o que significa que a pessoa que está trabalhando terá de sustentar mais dependentes. Será preciso sustentar os filhos, os pais, os avós e, em alguns casos, até os bisavós. Isso porque, com o aumento da expectativa de vida, várias gerações viverão simultaneamente. Se não mudarmos o conceito de envelhecimento, o mundo será dividido entre a fração dos provedores e a dos egoístas.

 

As pessoas que estão tendo dificuldade para enfrentar o envelhecimento deveriam pensar que o medo do envelhecimento é apenas instintivo e que a ciência nos deu um grande presente: uma vida mais longa. Devem se convencer, também, de que fazem parte de uma vanguarda que vai conquistar uma nova realidade. A de um mundo dominado pelos anciãos.

De 1994 até sua morte em 2014, ele foi editor-chefe do Frankfurter Allgemeine Zeitung (FAZ).

Schirrmacher morreu de um ataque cardíaco, aos 54 anos, em Frankfurt, Alemanha.

 

(Fonte: http://www.ocemiterio.com/12454-frank-schirrmacher-54-anos-jun-2014/details – 12 de junho de 2014)

(Fonte: http://veja.abril.com.br/180804/entrevista – Edição 1867 – Entrevista: Frank Schirrmacher/ Por Diogo Schelp – 18 de agosto de 2004)

 

 

 

 

 

 

 

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