Aribert Heim, médico responsável por atrocidades, Conhecido como Doutor Morte.

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Aribert Heim: A vida secreta do Doutor Morte

Um dos mais procurados nazistas escapou de seus caçadores até o fim

A atividade de caçar nazistas não tem mais o cartaz de décadas atrás. Sessenta e quatro anos depois do fim da Segunda Guerra Mundial, são poucos os alemães acusados de genocídio e crimes de guerra que ainda estão vivos. A busca aos foragidos, porém, continua. O nome mais conhecido da lista é Alois Brunner, que comandou o campo de concentração de Drancy, na França, entre 1943 e 1944. Se estiver vivo, tem 96 anos. É mais provável que tenha terminado seus dias escondido sob nome falso, em algum país sul-americano ou árabe. Destino semelhante teve outro nome no topo da lista de procurados: Aribert Heim.

Conhecido como Doutor Morte, o médico responsável por atrocidades cometidas em prisioneiros do campo de concentração de Mauthausen, na Áustria, morreu em 1992, aos 78 anos, no Cairo, capital do Egito, onde vivia como um convertido ao islã batizado Tarek Hussein Farid. A mirabolante história da fuga de Heim foi contada na semana passada pelo jornal americano The New York Times e pela emissora de televisão alemã ZDF, que o localizaram.

Segundo relatos de sobreviventes do Holocausto, Heim selecionava crânios de judeus com arcadas dentárias em bom estado para decorar sua escrivaninha e a de amigos. Injetava gasolina no coração dos pacientes e removia, sem anestesia, órgãos de prisioneiros vivos. Apesar de tudo isso, quando a guerra acabou, Heim foi libertado depois de um breve período nas mãos do Exército americano. Estabeleceu-se na própria Alemanha, como ginecologista, com a mulher e dois filhos, na estação termal de Baden-Baden. Em 1962, com o recrudescimento da caça aos antigos criminosos nazistas, desapareceu de vez, numa história só agora contada pelos jornalistas que descobriram – tarde demais – seu exílio egípcio.

Uma pasta com documentos de Heim foi entregue aos jornalistas por Mahmoud Doma, filho do dono do hotel de fachada empoeirada onde Tio Tarek, como era conhecido, viveu seus últimos anos. “Ele era como um pai para mim”, disse Doma ao New York Times. Ele afirmou que desconhecia o passado daquele alemão alto e misterioso que gostava de jogar tênis e estudar o Alcorão e andava para todo lado com uma máquina fotográfica pendurada no pescoço, sempre dando um jeito de não aparecer nas fotos tiradas por outros.

“No outono de 1962, a polícia só não me prendeu por mero acaso” ARIBERT HEIM, em uma carta de 1979

A história da fuga de Heim tem detalhes surpreendentes. Embora seus documentos egípcios trouxessem o nome muçulmano, neles a data e o local de nascimento eram os verdadeiros: Radkersburg, Áustria, 28 de junho de 1914. Heim trocava correspondência com a família e aparentemente recebia ajuda financeira deles. Mais surpreendentemente ainda, um dos filhos de Heim, Rüdiger, disse à emissora alemã ZDF que estava ao pé do leito de morte do pai, no Cairo, no dia 10 de agosto de 1992, quando ele morreu de um câncer de reto. Uma certidão de óbito confirma oficialmente essa data. É difícil compreender como tudo isso escapou à tenaz busca de Simon Wiesenthal e outros caçadores de nazistas. Wiesenthal (1908-2005) ajudou a encontrar vários deles, como Franz Stangl, comandante dos campos de extermínio de Sobibór e Treblinka, preso no Brasil em 1967.

Os últimos boatos a respeito do paradeiro de Heim estavam longe da verdade. Acreditava-se que ele estivesse vivendo na Patagônia chilena. A América do Sul – sobretudo a Bolívia e os países do Cone Sul – foi o destino favorito de dezenas de altos oficiais nazistas, o mais famoso deles Josef Mengele (1911-1979), o Anjo da Morte, médico do campo de extermínio de Auschwitz-Birkenau cujo cadáver foi encontrado e identificado em um túmulo de Embu, São Paulo, em 1985.

Outros foragidos, porém, contaram no pós-guerra com a benevolência de países árabes interessados na tecnologia militar alemã. Como simples médico, Aribert Heim evitou misturar-se à pequena comunidade de fugitivos nazistas no Egito.

A papelada guardada no hotel do Cairo revela um homem perturbado e obcecado pelo próprio passado. Em meio a ela, há uma carta endereçada à revista alemã Der Spiegel – que não se sabe se chegou a ser enviada – em que ele acusa Wiesenthal de “inventar” atrocidades. “Em 1978, Wiesenthal disse na televisão que eu tirava órgãos das pessoas, que as operava sem anestesia e que eu as tratava pior que um açougueiro. Seria preciso amarrar as vítimas na mesa de operação, e os gritos seriam ouvidos no campo inteiro.” Na mesma carta, ele conta que escapou da polícia alemã por “mero acaso”, em 1962: não estava em casa na hora em que os policiais bateram a sua porta. Em outras cartas, endereçadas ao Vaticano e a chefes de Estado de vários países, Heim alinhava ideias confusas e racistas sobre os judeus. Dizia, por exemplo, que o termo “antissemitismo” não era apropriado porque muitos judeus não têm origem semita.

O mistério da fuga de Heim só não está completamente resolvido porque não se sabe onde ele está enterrado. O criminoso nazista expressou ao filho o desejo de doar o próprio corpo à ciência após a morte. Esse desejo, porém, ia contra os preceitos muçulmanos, e Rüdiger diz não ter conseguido cumpri-lo. Heim teria sido, então, enterrado em uma cova anônima. “Temos sérias dúvidas quanto a sua suposta morte no Egito”, disse Efraim Zuroff, atual diretor do Centro de Caçada a Nazistas, fundado por Simon Wiesenthal. Não é desta vez, portanto, que a busca será dada por encerrada.

(Fonte: http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI25976-15215,00- Aribert Heim: A vida secreta do Doutor Morte – 05/02/2009)

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