Ángel Labruna, foi o mais vezes campeão, somando-se taças como jogador e técnico pelo River Plate.

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Labruna, o maior símbolo do River

Ángel Labruna (Buenos Aires, 28 de setembro de 1918 – Buenos Aires, 20 de setembro de 1983),

Ángel Amadeo Labruna foi eleito em 1999 pela edição especial da Placar sobre os cem craques do século XX. Ele foi escolhido o 25º, à frente, por exemplo, de Gerd Müller, Van Basten, Leônidas, Friedenreich, Falcão, Tostão, Jairzinho, Careca… dentre os argentinos, estava atrás só de Maradona, Di Stéfano e Passarella. Cada nota tinha um título, normalmente o apelido, o feito principal ou uma característica do jogador. O de Labruna, falecido há exatos 30 anos, era simplesmente “Monumental de Núñez”, como se fosse o River Plate em pessoa.

Labruna é nada menos que o homem mais vezes campeão pelo time, somando-se taças como jogador e técnico – chegou a ter estes dois recordes também de forma separada. E é o maior artilheiro do Millo, com 293 gols. Aliás, também o maior goleador do futebol argentino e do Superclásico, vazando 16 vezes o Boca. O aniversário de Labruna foi alçado nada menos a “dia internacional do torcedor do River”. Ele dizia que “o River não é a metade mais um. É o país menos alguns…”. Além das ligações com o clube, ele também é o mais velho a jogar (incluindo em Copa do Mundo) e marcar pela Argentina.

Foram 20 anos como profissional em Núñez, com 515 jogos, e 15 na seleção; até então, outros recordes também (Amadeo Carrizo passou 21 anos e Reinaldo Merlo chegou aos 526 jogos; na seleção, Maradona, Ortega e Zanetti chegaram aos 17 anos). O amor pelo River começou cedo, a ponto de nos inícios praticar basquete e ginástica pela Banda Roja (“exceto nadar, aí aprendi até pingue-pongue”, afirmou), do qual era sócio já com 8 anos de idade. A loja de relógios de seu pai ficava a só duas quadras do estádio que o clube tinha na Recoleta, antes da mudança para a zona de Núñez em 1938.

O pai, italiano de Avellino, queria que o filho continuasse nos negócios. Labruna afirmou que teria seguido no basquete se tivesse conseguido um emprego. “Menos mal que não me conseguiram”, disse com humor. Os primeiros chutes se deram em um time de rua, o Barrio Parque. O talento de Labruna fez com que o próprio presidente millonario Antonio Vespucio Liberti (nome oficial do Monumental) criasse uma sexta categoria juvenil. Ficaria cinco anos na base.

Tinha estilo (popularizou a matada de bola curvando a costa para trás), chutava bem com as duas pernas, era astuto para tocar de primeira, inteligente para armar jogo e se desmarcar, e muito raçudo: “o mais importante são as condições técnicas, o talento, a picardía (…). Mas se além de tudo isso tem garra, então se aproxima do ideal. Essa palavra é a que mais eu gosto de aplicar ao futebol: garra”, disse. E, é claro, era um goleador. Foi duas vezes artilheiro do campeonato. O colega Walter Gómez afirmou que “quando Labruna entrava na área para definir, eu virava para gritar o gol”.

A garra era sem excessos: “era uma rivalidade que, felizmente, começava e acabava dentro de campo, só existindo, gloriosamente, naqueles 90 minutos”, afirmou à própria Placar em 1978 sobre seus jogos contra o Brasil. “Naquele tempo, os jogos eram mais vividos e difíceis. Estádios menores, campos piores – o jogador sentia, realmente, a presença (…) da torcida contrária. Não se tinha essa facilidade de viajar apenas duas horas de avião, ficar em ótimas concentrações. Antes, a gente viajava vários dias de vapor ou por estradas – e isso ia fomentando, dentro da gente, o ambiente do jogo”.

Debutou em 1939. Naquele mesmo ano, já marcou pela primeira vez em um Superclásico, em vitória por 2-1 em que o River usou reservas porque os titulares se solidarizaram com José Manuel Moreno, suspenso pela diretoria por mal rendimento contra o Independiente (lembre aqui). Começou ali sua folclórica relação contra o rival: “o Boca é um time preparado para ganhar, mas não para dar espetáculo. (…) Eu quero atacar com 5 ou 6 homens, ganhar os jogos por 5-4. O Boca, ao contrário, se satisfaz com o 1-0”. E com o próprio Moreno, estrelaria a linha de frente dos esquadrões que o River montou nos anos 40: La Máquina. “Juan Carlos Muñoz-Moreno-Adolfo Pedernera-Labruna-Félix Loustau” virou o quinteto mais célebre do país. “Sale el sol, sale la luna, centro de Muñoz, gol de Labruna” era um canto popular.

Se firmou em 1941, ano do primeiro título, com direito à maior goleada sobre o Boca: 5-1 com gol dele. No ano seguinte, viria o bi, com volta olímpica na Bombonera após assistência dele a Pedernera. As novas taças viriam em 1945, 1947, 1952, 1953, 1955 (o título veio outra vez no campo rival, mas desta vez sem volta olímpica, a pedido do próprio Labruna), 1956 e 1957. Estes três últimos garantiram o primeiro tri seguido do River, que igualava uma marca exclusiva do Racing. El Feo (“O Feio”, em alusão aos dentes tortos), mesmo já perto dos 40 anos, foi titular em todas as conquistas: só em 1947, quando teve hepatite, jogou menos de 20 das 30 rodadas, atuando 18.

Os 9 títulos fizeram dele o profissional mais vezes campeão argentino. Só foi superado por Leonardo Astrada, que tem dez, todos também pelo River. O detalhe é que 9 títulos de Astrada vieram na era de dois campeões por ano, com os torneios curtos, de turno único – já os de Labruna eram longos torneios de turno e returno únicos para cada ano. O River foi a base da seleção naqueles tempos dourados da Albiceleste; Angelito integrou a fantástica geração ocultada pela II Guerra. Só ele e Néstor Rossi (também do River), dos campeões pela Argentina nos anos 40, jogaram uma Copa, em 1958.

Com quase 40 anos, Labruna foi para a vaga original de outro colega do River, Roberto Zárate, lesionado. Fora de forma, foi incapaz de ajudar os hermanos a se classificarem aos mata-matas. Sua trajetória na seleção acabou na Suécia mesmo, após 37 jogos e 17 gols – o último, em 1957, nos 2-1 sobre o Brasil dentro do Maracanã na estreia de Pelé. Ganhou as Copas América de 1946 e 1955, nesta destacando-se aos 37 anos contra o Uruguai: fez dois gols, foi substituído a onze minutos do fim, voltou a campo e marcou mais outro em um 6-1. Após o vexame na Copa do Mundo, em 1959 veio a notícia desagradável de que o clube prescindiria de seus serviços.

O Millo teve a decência de organizar pela primeira vez um jogo-despedida, o primeiro dos quatro que já realizou, com direito aos velhos companheiros da Máquina em campo. Labruna jogou até 1961, passando pelo Rampla Jrs uruguaio e o Rangers de Talca chileno. Terminada a carreira, ele, que havia recusado vantajosas propostas do Eldorado Colombiano (para onde foram muitos craques daquele River dos anos 40, como Di Stéfano e Pedernera) e da Itália, tentou administrar de hotel em Mar del Plata e pizzaria a loja de carros usados e nenhum negócio vingou.

Também viciado em apostas em corridas de cavalo (nos meses de inverno, arranjava coletes para os colegas usarem por baixo do uniforme. “Eram iguais aos que usavam os jóqueis… quem imaginam que os trazia ao clube?”, gargalhava), só conseguiu manter-se economicamente voltando ao futebol, desta vez treinando. Começou já em 1961, perto da antiga casa, no Platense, da cidade de Vicente López, vizinha ao bairro de Núñez. Chegou até a jogar improvisado duas vezes na 2ª divisão pelo Calamar. Os primeiros sucessos viriam em 1967, próximo à antiga casa: trabalhou na segundona no Defensores de Belgrano, também de Núñez, e ainda no Platense.

O Defe foi campeão, mas sem acesso: precisava ainda passar por repescagens contra os piores da elite, o que não conseguiu. Já no Tense, treinou a melhor campanha inicial do Metropolitano 1967 e só não chegou à final porque sofreu uma das viradas mais sensacionais de todos os esportes, contra o futuro campeão Estudiantes (clique aqui para mais detalhes). Dos vizinhos, Labruna voltou à antiga casa: treinou pela primeira vez o River em 1968. Não teve êxito – chegou a perder o título de 1969 para o nanico Chacarita. Mas o pior foi perder um filho: também chamado Ángel Labruna, ele era um meia promissor que o pai lançara no River, mas morreu de leucemia naquele ano. Don Ángel saiu em 1970.

Relançou a carreira de técnico no Rosario Central, com sucesso histórico: com os auriazuis, comandou o primeiro título de um clube de interior argentino, na taça nacional de 1971, saborosa também pelo gosto de eliminar o rival Newell’s na semifinal. Mas nunca se desligou do velho clube: chegou até a irritar-se com o jovem Ubaldo Fillol em 1973: o goleiro, ainda no Racing, treinado por Labruna, estava inseguro sobre ir ao Millo. El Feo passou ainda pelo Talleres de Córdoba em 1974 (4º colocado no octagonal final que decidiu o Nacional, projetando La T nacionalmente) até enfim retornar outra vez a Núñez.

O que se passava com o River? O clube vivia seu pior jejum: não era campeão simplesmente desde 1957, quando Angelito ainda jogava. “Volto para ser campeão”, anunciou. Mesmo não sendo especialista tático, conseguiu em dose dupla: a Banda Roja venceu tanto o Metropolitano quanto o Nacional de 1975, dando largada para um fim de década brilhante, que naturalmente manteve Labruna no cargo por um bom tempo. Em 1979, voltou a vencer tanto Metro como Nacional. Foi campeão ainda dos Metros 1977 e 1980, somando seis títulos argentinos como técnico do River. Só foi superado na função por Ramón Díaz, que conseguiu cinco argentinos e ainda a Libertadores 1996 e Supercopa 1997.

O que faltou a Don Ángel foi justo a Libertadores. Chegou no máximo a uma final, perdida em 1976 para o Cruzeiro. A pressão pelo torneio aumentou após o Boca conseguir, justamente nos dois anos seguintes, seus primeiros títulos nele. A eliminação na dura primeira fase em 1981 (só o líder avançava) provocou sua saída; a diretoria optou por chamar Di Stéfano. Na época, um magoado Labruna chegou a declarar-se arrependido por um dia ter ido treinar o clube dos seus amores. Chegou a estar mais exaltado: “quando me fui do River, cheguei a crer que se acabava o mundo. Até quis me dar um tiro”.

O Talleres, onde fizera sucesso em 1974 (não para Angelito: “No Talleres, fracassei. (…) Quero ser ganhador. E em Córdoba, não consegui”, declarou), o trouxe de volta. E Labruna assumidamente seguia pensando no River e ajudando-o: o time de Di Stéfano só avançou de fase no Nacional 1981, para adiante ser campeão, porque La T tirou um ponto do concorrente riverplatense, o surpreendente Loma Negra.

Já em 1983, Labruna vinha treinando o Argentinos Jrs, então um clube de expressão nanica, apesar de revelar Maradona. Dali a um ano, contudo, a equipe do bairro da Paternal conseguiria o que nem com Dieguito (que saíra em 1981) alcançara: títulos na elite, seus primeiros. Mas El Feo já não estaria presente à frente da boa equipe que vinha formando e que até a Libertadores venceria, em 1985. Após uma operação de vesícula, foi caminhar pelos jardins da clínica junto de Fillol, que comandara no Racing, naquele grande River dos anos 70 e, agora, no Argentinos Jrs.

Labruna havia recebido alta, mas um coágulo entupiu uma artéria e provocou o infarto que a nove dias do 65º aniversário lhe matou nos braços do goleiro. Como não poderia deixar de ser, foi velado no Monumental de Núñez. Hoje, jaz ao lado do filho no Cemitério da Chacarita. Ao eleger em edição especial de 2010 os cem maiores ídolos do River Plate, a El Gráfico colocou na capa Amadeo Carrizo, Ariel Ortega, ele, Norberto Alonso, Enzo Francescoli e Bernabé Ferreyra. A revista tratou de colocar a imagem de Angelito na frente das dos outros cinco.

(Fonte: http://www.futebolportenho.com.br/2013/09/19/labruna-o-maior-simbolo-do-river/ – ESPECIAIS/ Por Caio Brandão – 19/09/2013)

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