Foi um dos primeiros a escrever sobre o prazer sexual feminino

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Aventuras do inglês, de uma vida dedicada à aventura

Richard Francis Burton (Torquay, Inglaterra, 19 de março de 1821 – Trieste, Itália, 20 de outubro de 1890), explorador inglês do século XIX, foi o descobridor da nascente do Rio Nilo, foi tão popular na época e seu nome tornou-se imediatamente reconhecido diante das expedições, povoadas por tribos africanas em pé de guerra, viagens aventureiras e profanação de templos sagrados.

A mais eletrizante das aventuras vividas pelo explorador: a expedição em busca da nascente do Rio Nilo, uma jornada tão difícil quanto em explorar regiões inóspitas da África e da Ásia. Era mestre também na arte de percorrer corpos femininos em busca de emoções diferentes. Foi Burton quem descobriu para o Ocidente o Kama Sutra, o mitológico tratado oriental sobre sexo, fazendo a primeira tradução do livro para o inglês.

Linguista, ele dominava 25 idiomas e dezenas de dialetos. Místico, era iniciado em alquimia, hipnotismo, bramanismo, espiritualismo, teosofia, percepção extra-sensorial e, para escândalo da Inglaterra da época, declarava ser adepto da religião muçulmana – a ponto de realizar uma preregrinação a Meca de acordo com os preceitos islâmicos.

Burton se diferenciava dos dândis ingleses de seu tempo, que dominavam diversos assuntos com o único intuito de brilhar nos salões da elite, por ancarar seus estudos com uma seriedade que fazia dele muito mais do que um diletante. Por causa dessa seriedade, ele deixou obras sobre culturas da África e da Ásia que até hoje são consideradas precursoras da moderna antropologia. Pelo mesmo motivo, teve dissabores a vida inteira. Ao descobrir a nascente do rio Nilo ao lado do explorador inglês John Speke (1827-1864), Burton relutou em apresentar a novidade à Real Sociedade Geográfica Britânica por considerar que as provas não eram suficientes.

Resultado: John Speke, o sócio mais esperto, relatou a descoberta como se fosse só dele e conseguiu verba para voltar várias vezes ao local até provar que estava certo, enquanto Burton amargava um longo período de descrédito e ostracismo.

Nascido em março de 1821 na cidade de Torquay, na Inglaterra, Burton era filho de pai irlandês, tinha ascendentes franceses e foi criado na Itália – ou seja, foi poliglota desde o berço. Aos 21 anos iniciou uma carreira militar, indo combater com as tropas inglesas na Índia e no Paquistão. Era um péssimo soldado, pois, em vez de lutar, ficava aprendendo os dialetos nativos e pesquisando os costumes locais.

Expulso do Exército aos 29 anos, passou três anos morando com a mãe, na França, época em que escreveu seus primeiros livros sobre a Índia. Foi aí que deslanchou sua vida de aventureiro profissional com três viagens emocionantes: a peregrinação a Meca, a expedição à cidade proibida de Harar, na Etiópia – consta que foi o primeiro branco a voltar com vida de lá -, e a primeira caravana em busca da nascente do Nilo, que acabou num ataque de tribos locais no qual Burton, que teve o rosto atravessado por uma lança disparada por um nativo, quase perdeu a vida.

EMPREGO EM SANTOS – De volta à Inglaterra, Burton resolveu se dedicar àquela que era sua grande paixão, ao lado das viagens aventureiras: a literatura erótica. Além de traduzir o Kama Sutra, e o tratado marroquino O Jardim Perfumado, o explorador causava escândalo alardeando suas opiniões sobre o assunto. Ele foi um dos primeiros a escrever sobre o prazer sexual feminino, que a rígida moral vitoriana encarava como um fenômeno mais desconhecido, e infinitamente menos interessante, do que a nascente do Nilo.

Com essa postura, ele ganhou tantos inimigos quanto leitores – principalmente leitoras. Uma delas, a bela Isabel Arundell, gostou tanto do que leu que se apaixonou pelo escritor, com quem acabaria se casando. A união entre Burton e Isabel, que era católica, tornou o explorador mais malvisto ainda. Na Inglaterra do século XIX, desposar alguém que não professasse a religião anglicana era tão condenável quanto casar com um nativo hindu ou africano. “A Inglaterra é o único país do mundo onde eu não me sinto em casa”, queixava-se Burton.

Disse isso porque não conhecia ainda o Brasil, o lugar que mais odiou ter visitado. Desiludido com o episódio da nascente do Nilo e com a falta de reconhecimento de seu trabalho, Burton, por influência de Isabel, conseguiu um emprego de cônsul em Santos. Veio e se arrependeu. Nem bem pisou em solo brasileiro, sua mulher pegou uma doença tropical que quase a levou à morte. Para compensar o baixo salário, Burton tentou investir em café e na mineração – perdeu dinheiro nas duas empreitadas.

As cartas que Burton escrevia do Brasil para seus parentes na Europa eram uma antítese da obra literária de Pero Vaz de Caminha. Ele, que já havia enfrentado situações inóspitas na África e na Ásia, reclamava das chuvas constantes, dos insetos, das cobras, “que andam por todo lado”, e das formigas que são tão grandes.

Burton detestava o Brasil na mesma medida em que amava a obra do poeta português Luís de Camões, com quem se identificava. “Ele foi um romântico e um aventureiro numa época propícia para isso. Eu tento o mesmo numa época imprópria”, escreveu certa vez. O explorador infeliz passou os últimos dias de sua vida, na cidade italiana de Trieste, tentando traduzir para o inglês os versos de Os Lusíadas. Não chegou a completar o trabalho. Consumido por constantes depressões – quando entrava em crise, refugiava-se em drogas como o álcool, o ópio e a maconha -, morreu em outubro de 1890.

Grande parte de seus escritos foi queimada por Isabel, a mulher, sem explicação lógica. A perda, inestimável para a antropologia, não intimidou os admiradores após sua morte, esgotam-se livros e emocionam plateias com as histórias eletrizantes de uma vida dedicada à aventura.

(Fonte: Veja, 22 de agosto de 1990 – ANO 23 – Nº 33 – Edição 1144 – CINEMA – Pág: 112/113)

 

 

 

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