Evaldo Bezerra Coutinho, foi um dos mais importantes pensadores brasileiros, foi contemporâneo de Gilberto Freyre, a quem viria a substituir anos depois na Academia Pernambucana de Letras

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Filósofo, escritor e crítico de arte

 

A introspecção de Evaldo Coutinho

 

 

Evaldo Bezerra Coutinho (Recife, 23 de julho de 1911 — 12 de maio de 2007), filósofo, advogado e escritor, foi um dos mais importantes pensadores brasileiros.

 

Ele nasceu no dia 23 de julho de 1911, no Pátio do Terço, bairro de São José, no Recife, foi professor emérito da Universidade Federal de Pernambuco e fazia parte da Academia Pernambucana de Letras.

 

Evaldo Coutinho estudou filosofia de forma autodidata, chegando a desenvolver um sistema filosófico próprio. Formado pela Faculdade de Direito do Recife, foi professor, escritor, crítico de cinema e filósofo. Em 2000, o cineasta Marcos Henrique Lopes fez o documentário ‘A composição do vazio’, sobre a vida e a obra de Evaldo Coutinho.

 

Evaldo Bezerra Coutinho é autor de nove livros sobre filosofia, estética da arte, arquitetura e cinema, todos publicados pela editora Perspectiva. Segundo acostumou-se a dizer, “minha obra são como nove capítulos de um livro só, por causa da coerência interna que preside a todos”. Fundada na ética, sua exegese não faz nenhuma concessão: é hermética, perfeita no uso da norma culta da língua portuguesa, repleta de neologismos, manuscrita.

 

Desde jovem, Evaldo Coutinho conviveu com algumas personalidades pernambucanas do início do século. Quando cursou o primário, no colégio Americano Batista, foi contemporâneo de Gilberto Freyre, a quem viria a substituir anos depois na Academia Pernambucana de Letras, após a morte do sociólogo. Estudou o secundário no ginásio Pernambucano, instituição reconhecida por formar ilustres alunos. Substituiu o amigo Joaquim Cardozo na cadeira de estética da Escola de Belas Artes (1932), seis anos após a sua fundação. Convidou Ariano Suassuna a substituí-lo. Antes de viajar ao Rio de Janeiro, onde trabalhou no final dos anos 40 na mesma seção de Sábato Magaldi, Lêdo Ivo, Paulo Mendes Campos e Rubem Braga, conviveu com Paulo Freire e, a pedido dele, teve, como assistente, o ensaísta e crítico literário Luiz Costa Lima.

 

Ele teve importante participação no desenvolvimento de estudos acerca da obra espinosista no Brasil, na medida em que, aos 22 anos, ainda estudante da Faculdade de Direito de Recife, em 1932, escreve um longo artigo (influenciado pela leitura de “A Ética”) sobre o tricentenário do nascimento do filósofo holandês de origem judaica. Há, portanto, um paralelo entre Coutinho e o cearense Farias Brito, autor de escritos sobre Baruch Espinosa. Apesar da admiração profunda por Espinosa, efetivamente Evaldo o citou apenas em “A Artisticidade do Ser”, prevalecendo nas suas demais obras o desenvolvimento de uma filosofia própria, centrada na ideia da morte e do solipsismo.

 

Essas ideias estão dispostas nos cinco volumes de “A Ordem Fisionômica”, a base de sua ontologia. O professor e escritor paraense Benedito Nunes encontra nela o que chama de tanatologia, ressaltando que, em sua essência, “alcançou um ritmo sintático, um fraseado aliciante, que seduz o leitor por sua clareza e riqueza vocabular, de cunho metafórico”.

 

Lembra, ainda, a leitura “esplêndida” que nos traz de “O Sofista”, de Platão, ou o paralelo que Wittgenstein lança sobre o solipsismo como tese. “Ele é correto, só que mostra o que não pode ser visto, o que não pode ser dito”. Quer dizer, faz diferença entre o dizer e o mostrar, porque “as coisas que não podemos dizer é melhor calar, pois quando a linguagem filosófica ou poética se cala, ela está mostrando algo que não pode dizer inteiramente”. E é isso que a arte e a literatura fazem. Para Nunes, não se trata de um simples esteta, um mero professor de filosofia, “mas de um verdadeiro filósofo”.

 

Só para ter uma ideia da dimensão de sua obra, basta dizer que a teoria crítica de cinema, escrita de forma autodidata com o nome de “A Imagem Autônoma”, expõe pensamentos pioneiros, antecipando determinados posicionamentos defendidos por André Bazin em seus “Cahiers du Cinéma” e com profundidade suficiente a ponto de chamar a atenção de Paulo Emílio Salles Gomes (na época, editor do suplemento cultural de “O Estado de S. Paulo”), que o indicou para Jacó Guinsburg, o editor da Perspectiva. Evaldo Coutinho também atuou como crítico de filmes do cinema mudo; primeiro em 1929, no “Jornal do Commercio” de Recife, e, posteriormente, no “Diário Carioca”, entre 1946 e 1950.

 

Apesar de ter tido contato com inúmeros intelectuais, é pouco comentado, conhecido, respeitado. Curiosamente, a imprensa brasileira, em 1951, antecipou a sua morte quando “O Globo” publicou uma nota sobre a queda, em Sergipe, de um avião que ia do Rio para o Recife, ignorando o fato de ser um quase homônimo, Ivaldo Coutinho, uma das vítimas do desastre aéreo. O incidente provocou telegramas de pêsames para a família do filósofo, porém, desfeita a gafe, Mendes Campos e Rubem Braga trataram de escrever nos jornais locais, com bastante comoção, sobre o engano.

 

 

Outros dois fatos relevantes são exemplos da peculiaridade da vida desse esquecido escritor. Fundador e primeiro diretor da Escola de Arquitetura de Pernambuco, Coutinho recebeu, em 1960, o filósofo francês Jean-Paul Sartre e sua mulher, Simone de Beauvoir, para uma palestra, mediada e traduzida pelo então superintendente da Sudene, Celso Furtado. Sartre veio ao Brasil por meio da Difusão Europeia do Livro, então dirigida por Jacó Guinsburg. Do Recife, foi a Belém, onde foi recebido por Benedito Nunes, seguindo, depois, para Cuba. Detalhe: Jacó, Benedito e Evaldo ainda não se conheciam. Anos depois, em 1970, seria publicado o excelente ensaio crítico “O Espaço da Arquitetura”, de profundidade poucas vezes encontrada na literatura de arquitetura do Brasil.

 

 

Essa obra foi quase integralmente copiada na tese de doutorado apresentada à Universidade de Madri, em 1979, por seu ex-aluno Max Luterman, hoje professor da Universidade Federal de Alagoas. Na época, a notícia foi um escândalo, obrigando o Ministério da Educação a estabelecer um grupo, chefiado pelo professor Zildo Sena, para investigar o caso. Ao fim das investigações, foi confirmado o plágio, amplamente noticiado no “Jornal do Brasil”, na revista “Veja” e no “Diário de Pernambuco”, já no início dos anos 80.

 

Evaldo Coutinho faleceu em Recife, em 12 de maio de 2007, aos 96 anos.

(Fonte: https://extra.globo.com/noticias/brasil – NOTÍCIAS / BRASIL / Por Pe360º/G1/ Globo.com – 12/05/07)

(Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais – FOLHA DE S.PAULO / + CULTURA / por Marcos Enrique Lopes / especial para a Folha – São Paulo, 22 de julho de 2001)

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Marcos Enrique Lopes é diretor, roteirista e produtor do documentário “A Composição do Vazio” (2001), cinebiografia de Evaldo Coutinho.

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