Walter Ulbricht, ficou conhecido por mandar construir o Muro de Berlim

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1950 a 1971: 21 anos na presidência do partido único

Walter Ulbricht em 1957

Walter Ulbricht em 1957

REPÚBLICA DEMOCRÁTICA ALEMÃ

Walter Ulbricht (Leipzig, 30 de junho de 1893 – Berlim Oriental, 1° de agosto de 1973), ex-primeiro-secretário do SED, partido da Alemanha Oriental. 

Embora tivesse o título nobiliárquico de presidente do Conselho de Estado e continuasse como membro do Comitê Central e do Politburo do Partido Socialista Unificado (SED), Ulbricht havia, na prática, saído da cena política a 3 de maio de 1971, substituído por Erich Honecker (1912-1994) – e, por isso, nos dois últimos anos o velho bolchevista limitava-se a participar de solenidades públicas e a saudar os embaixadores estrangeiros que convergem com frequência cada vez maior para a Alemanha comunista.

Dentro desse ostracismo – em parte ditado por sua saúde debilitada e em parte por opor obstáculos ao “degelo” preconizado por Moscou – Ulbricht sofria de periódicos acessos de nostalgia pela liderança. No congresso do partido realizado em 1972, por exemplo, antecipou-se a Honecker e fez de improviso o discurso de saudação a Leonid Brejnev (1906-1982). E no dia 30 de junho de 1972, no seu 80° aniversário, apareceu desenvolto e loquaz na televisão, ao ser homenageado pelo Politburo.

Depois, só voltou a ser visto em público uma vez, numa cerimônia em Berlim Oriental, na presença de Leonid Brejnev. Nesse dia, pela primeira vez, Ulbricht ostentava todas as dezenas de medalhas ganhas em mais de meio século de “serviços prestados ao comunismo internacional.”

O longo caminho – Para acumular essas condecorações, em número maior do que as de qualquer líder comunista europeu vivo, foi necessária uma caminhada às vezes tortuosa, frequentemente clandestina e sempre inflexível. Na verdade, foi necessária uma vida inteira, cujos contornos gerais reproduzem a própria história do movimento comunista alemão do século XX.

A participação de Ulbricht nesse movimento começou em 1908, com seu ingresso na Juventude Socialista, aos quinze anos de idade. O jovem Walter, terceiro filho de um modesto alfaiate de Leipzig, permaneceria durante dez anos no limbo social-democrata, antes de travar conhecimento, em 1918, com o pensamento de Lênin, recém-vitorioso sobre a Rússia czarista.

A leitura de “O Estado e a Revolução” o impressionou profundamente – como o impressionaria, em 1922, o contato pessoal com Lênin – e o levou à momentânea ação revolucionária, com a fundação do efêmero e infeliz grupo Spartakus e a posterior adesão ao subversivo Partido Comunista Alemão.

Mas o romantismo revolucionário da vacilante República de Weimar, que serviria de interlúdio entre a defunta Alemanha do Kaiser e o nascente nazismo, não se coadunava com o temperamento do meticuloso e dirigente Ulbricht, nem com sua carência de dotes oratórios.

Naqueles anos tumultuados, no início da República, o socialismo alemão era dominado por figuras fascinantes, apaixonadas – por gente muito mais próxima de Rosa Luxemburgo (1871-1919) do que de Walter Ulbricht. Decididamente, ele não era um homem de ação ou um ideólogo brilhante, e sim um organizador metódico, um “revolucionário de gabinete”.

Ulbricht teve de esperar até 1923 – quando já estava casado com Martha Shiemansk, e tinha uma filha, Dorle, as quais via raramente – para tornar-se membro do Comitê Central do Partido, então em crescente processo de burocratização. Um ano depois, a comunista Clara Zetkin (1857-1933) confessava sua preocupação: “Tomara que o destino poupe o Partido Comunista Alemão da ascensão política desse homem”, escreveu Clara. “Ele não me agrada. No brilho de seu olhar eu vislumbro a astúcia e a deslealdade.”

Realmente, foi com astúcia que Ulbricht se impôs, às circunstâncias. Mas foi, também, com uma missionária dedicação ao trabalho. De 1923 a 1928, quando foi eleito para o Parlamento Estadual da Saxônia, fez um estágio no Komintern, liderou uma greve de 100 000 trabalhadores em Viena e editou o órgão partidário “Rote Fahne” (“Bandeira Vermelha”), em Berlim.

Aliança e fuga – A ascensão de Hitler ao poder, em 1933, levou os esquerdistas da Alemanha, conforme a sorte de cada um, ao cemitério, ao campo de concentração ou à diáspora. Ulbricht conseguiu-se encaixar-se nesse último lote, fugindo para a França no ano seguinte. Antes, porém, ele dera sua contribuição ao nazismo, embora indiretamente.

Obedecendo às ordens de Moscou, mobilizou todas as suas energias e as de alguns companheiros para convencer os demais membros do partido a não se oporem às investidas nazistas – na abstrata esperança de que, no fundo, talvez existisse mesmo uma parte socialista dentro do nacional-socialismo de Hitler. Os comunistas chegaram a se aliar aos nazistas numa greve geral em Berlim, e o próprio Ulbricht posou ao lado de Joseph Goebbels (1897-1945), o chefe da propaganda hitlerista, para um cartaz em favor do movimento.

As atividades de Ulbricht em seu exílio parisiense, no Hotel Lutécia, foram febris, grandiosas e inúteis: em seu minúsculo quarto, promovia sucessivas reuniões com dirigentes socialistas e comunistas, organizando uma “frente ampla contra o nazismo.”

A iniciativa obviamente fracassou, levando Ulbricht a viajar para Moscou e de lá, clandestinamente, para a Espanha, como “comissário político” encarregado de dar assistência aos comunistas envolvidos na Guerra Civil Espanhola. De volta a Moscou, fundou um Comitê Nacional para a Alemanha Livre, que reunia comunistas e “antifascistas de todas as tendências.”

A partir de 1941, com a invasão da Rússia pela Alemanha, Ulbricht começou a prestar serviços mais práticos para seus anfitriões. No ano seguinte, ele já era um importante agente de propaganda no front de Stalingrado, onde conheceu pessoalmente Nikita Kruschev – ampliando assim seu já vasto círculo de amigos na constelação política soviética.

Na mesma época, casou-se com Rose Michel, de quem se afastaria pouco depois. Era o segundo matrimônio que terminava em divórcio. Em Stalingrado, no atormentado ano de 1942, Ulbricht fez veementes apelos aos soldados da Wehrmacht para que se rendessem, e pouco depois começou a apresentar-se ante os prisioneiros alemães com o uniforme do Exército soviético. Em 1945, foi um dos primeiros não-combatentes a chegar à Berlim devastada, viajando num caminhão militar russo.

O homem do muro – Terminada a guerra, Ulbricht lançou-se à tarefa de reunir num só partido os remanescentes do Partido Social-Democrata e do Partido Comunista Alemão e de fundar um Estado comunista alemão na zona de ocupação soviética. Seu sonho tornou-se realidade a 7 de outubro de 1949, com a criação da República Democrática Alemã, no mesmo ano em que, na parte ocidental, surgia a República Federal da Alemanha. Era a consolidação de uma divisão que desde o primeiro momento interessara a Ulbricht, mais empenhado num comunismo majoritário num terço da Alemanha do que num comunismo minoritário na Alemanha unificada.

Mas a Ulbricht, pessoalmente, estava reservado outro papel. Se a criação da RDA, sempre defendida por ele, não foi consequência de sua vontade exclusiva ou de sua ação individual, a construção do “Muro de Berlim” em 1961, isolando a parte ocidental da cidade, o foi.

Por isso, ele passou à história alemã contemporânea como “o homem do ‘Muro’”. Até mesmo sua residência em Wandlitzsee, ao norte de Berlim, era cercada por um muro intransponível.) Ironicamente, sua filha Dorle refugiou-se em Berlim Ocidental, seu irmão Eric naturalizou-se cidadão americano e sua irmã Hildegard mudou-se para Hamburgo.

Com ele ficaram outras duas filhas e um filho do terceiro casamento, com Lotte Kuhn, que também terminou em divórcio. Ironicamente, também a “fronteira ideológica” – razão da fortuna de Ulbricht no mundo comunista nos anos da guerra fria – acabou sendo a razão de sua desgraça: sua oposição a qualquer tipo de relacionamento com os alemães ocidentais, antes benéfica, acabou se tornando prejudicial aos interesses soviéticos. Por isso caiu em 1971, aos 77 anos.

De lá para cá, uma nova República Democrática Alemã despontou no cenário internacional, reconhecida por mais de setenta nações. Desapareceu a “versão prussiana do marxismo”. Na boca de Honecker, de Willi Stoph (1914-1999) – (provável sucessor de Ulbricht na presidência do Conselho de Estado) e de Horst Sindermann (1915-1990) – (possível sucessor de Willi Stoph como primeiro-ministro), os anátemas contra os “imperialistas” e os “revanchistas” não poderiam ter o mesmo sabor e vigor que tiveram na “era Ulbricht”.

Em pouco mais de dois anos, os novos dirigentes criaram um novo estilo. O que restava do velho, além da transformação do país na oitava potência industrial do mundo, desaparecerá definitivamente com a morte de Ulbricht.

Subitamente, na tarde do dia 1° de agosto de 1973, a emissora oficial da República Democrática Alemã suspendeu sua alegre programação musical vespertina, e um locutor, com voz grave, começou a ler o despacho extraordinário. A notícia dizia, simplesmente: “O Comitê Central do Partido Socialista Unificado, o Conselho de Estado, a presidência da Câmara Popular e a presidência do Conselho Nacional da Frente Popular comunicam, com profundo pesar, que nosso camarada Walter Ulbricht morreu hoje, quarta-feira, 1° de agosto de 1973, às 12h55”. Novamente fez-se silêncio, e em seguida a rádio passou a transmitir apenas música clássica.

(Fonte: Veja, 8/15 de agosto de 1973 – Edição 256 – REPÚBLICA DEMOCRÁTICA ALEMÃ – Pág: 37/38)

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