Pablo Casals, músico espanhol de caráter inabalável, considerado o maior violoncelista do mundo

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Pablo Casals (1876-1973), músico espanhol de caráter inabalável, considerado o maior violoncelista do mundo. Dele, chegou a dizer Wilhelm Furtwangler, um dos maiores regentes de orquestra de todos os tempos: “Quem nunca ouviu Pablo Casals tocar , não pode ter ideia de como chega a soar um instrumento de corda. Com seu violoncelo, ele era capaz de atingir a última síntese da beleza material e espiritual”. Espanhol de Catalunha, tinha tocado, maravilhosamente, durante quase toda a sua vida.

Antes de ser um artista, porém, Pablo Casals foi um homem de caráter inabalável. Assim, em 1939, “em consideração à liberdade e à dignidade humana” que considerava soterradas, na sua Espanha natal, pelo regime franquista apoiado por Adolf Hitler, saiu do país, exilou-se voluntariamente em Prades, Porto Rico, e deixou de tocar em todas as nações que considerava totalitárias. Na verdade, isolou-se completamente. Até que em 1950 um grupo de amigos convenceu-o a se apresentar nas comemorações do bicentenário de Bach.

A distância das plateias foi para ele um verdadeiro sofrimento. “Cada nota corresponde a uma cor”, dizia. “E cada vez que toco creio estar produzindo cores diferentes. Angustia-me deixar de comunicar essas sensações ao maior número possível de pessoas.” A medida da sua tristeza ele dava todos os dias ao amanhecer, quando fazia com a mulher longos passeios, descalço, sobre as areias ainda frias das praias de Padres. “Eu via o rio Llobregat, os picos de Montserrat. A Catalunha é minha terra, faz-me falta. Eu a amo como se fosse minha mãe.”

Num circo – Pau Carlos Salvador Defillo de Casals nasceu no dia 29 de dezembro de 1876, na cidade de Vendrell, a 40 quilômetros de Barcelona. E começou sua carreira musical muito cedo. “Há 92 anos”, costumava dizer rindo, pouco antes de morrer.

De fato, com apenas 4 anos já cantava no coro da Igreja de Vendrell, da qual seu pai era organista. “Ganhava 10 centavos por apresentação. Dava para uns poucos doces.” Aos 6 começou a compor, com um talento que chegou a ser comparado ao de Mozart. Aos 8 aprendeu violino , aos 10 tocava órgão melhor do que o pai. Um ano depois, enfim, aconteceria o predestinado. Num circo que passava pela cidade, o menino Pablo fascinou-se com o violoncelista.

Quando voltou para casa, logo depois da função, iniciou, incansavelmente, o trabalho de construção de um instrumento igual àquele pelo qual se apaixonara. O pai imaginou que a vocação do filho se inclinava para a marcenaria. Mas logo, depois de pequenos atritos e crises de choro, entendeu que Pablo queria um violoncelo. Em poucos meses o garoto mudou-se para Madri, como aluno do compositor Isaac Albéniz. E foi tão elogiado pelo mestre que a rainha Maria Cristina da Espanha decidiu financiar seus estudos durante dois anos. No selecionadíssimo Conservatório de Bruxelas, Casals tornou-se o primeiro da classe.

Como um menino – Daí em diante, não houve barreiras que prendessem o livre curso de sua inesquecível carreira. E ao fim dela Casals pode ser considerado como o único músico da história cuja musicalidade nunca foi posta em dúvida. O grande violinista Fritz Kreisler uma vez chamou-o de “o rei do arco”. E, com efeito, foi a maneira de Casals usá-lo, como se fosse uma leve pena a hipnotizar as cordas do instrumento, que o tornou o maior dos intérpretes de Bach – com execuções absolutamente diferentes das convencionais. “Cada nota é diferente”, afirmava Casals. E diante dessa convicção ele não hesitava em impor expressões novas às melodias de Bach, fazendo com que os próprios alemães acabassem por aceitar seu modo de tocar.

Nos últimos tempos diminuiu suas aparições públicas. Mas não se preocupou “em controlar um ódio terrível por guerras e ditaduras”. Casado três vezes, há dezesseis anos com sua última mulher, a quem chamava de Martita, garantia que ela lhe tinha devolvido a juventude. “Algumas vezes, ao lado de minha esposa, sinto-me como um menino. Martita e a música me fazem isso.” Dias atrás, já muito doente, antes de entrar na coma que o deixou inconsciente por mais de uma semana, chegou a imaginar um último compasso: “Estou no fim, mas cada dia volto a nascer, cada dia nasço de novo”.
Pablo Casals morreu no dia 22 de outubro de 1973, aos 96 anos, de insuficiência cardíaca, problemas respiratórios e renais acentuados pela velhice. Tinha tocado, maravilhosamente, durante quase toda a sua vida. E foi velado, no seu Porto Rico de adoção, sob os acordes graves e comoventes da “Marcha Fúnebre” da “Heróica” de Beethoven, em último pedido que fizera à sua esposa Marta Montañez, sessenta anos mais jovem.

(Fonte: Veja, 31 de outubro, 1973 –- Edição 269 – MÚSICA/ por Diogo Pacheco – Pág; 91)

 

 

1973: Morre violoncelista Pablo Casals

No dia 22 de outubro de 1973 morreu o violoncelista catalão Pablo Casals. O músico havia revolucionado o manuseio do violoncelo.

Pablo Casals durante um ensaio com a Filarmônica de Londres em 1963

Pablo Casals durante um ensaio com a Filarmônica de Londres em 1963

 

Interpretações da música de Johann Sebastian Bach ao violoncelo ficaram durante dois séculos fadadas ao esquecimento, até serem redescobertas por um músico catalão. Um gênio e cidadão do mundo, que lutou durante toda sua vida pela paz e pela liberdade. E para muitos, o maior violoncelista de todos os tempos: Pablo Casals.

Quando Johannes Brahms compôs sua Sonata para Violoncelo op. 99, Pablo Casals tinha 10 anos de idade. Nascido no povoado catalão de Vendrell, Casals tornou-se, no decorrer da sua vida quase centenária, um mediador entre os séculos 19 e 20, entre o romantismo tardio e a era moderna, entre a arte e o homem.

Em suas próprias palavras, “a música, essa linguagem universal maravilhosa, entendida por todos, deveria ser também uma fonte de melhor entendimento entre os homens. Por essa razão, quero fazer um apelo aos meus colegas músicos de todo o mundo, pedindo a cada um deles que coloque a pureza da arte a serviço da humanidade, pois assim estarão contribuindo para o surgimento de relações fraternas entre os homens”.

Multitalento

Os pais de Casals, ambos músicos, incentivaram o filho desde a infância no ofício musical. Pablo tocou com virtuosismo piano, órgão, violino e flauta, mas somente aos 11 anos é que veio a encontrar o instrumento ao qual se dedicaria por toda a vida. Ao ouvir um concerto de um trio de cordas, Casals fascinou-se pelo violoncelo.

Seus pais lhe proporcionaram aulas do instrumento e, um ano depois, aos 12 anos de idade, o jovem músico já ganhava a vida como violoncelista em apresentações em bares e cafés na Espanha.

O compositor Issac Albeniz descobriu o talento de Casals, tendo intermediado sua formação profissional no Conservatório de Madri e seus primeiros grandes concertos. Por volta de 1900, o intérprete catalão já tinha fama mundial como um talento excepcional e um virtuose do violoncelo.

Casals revolucionou o manuseio de um instrumento que até então servia apenas ao acompanhamento, desenvolvendo uma nova técnica de arco e dedilhado, que transformou o violoncelo em um instrumento solo. O dirigente Wilhelm Furtwängler declarou certa vez que “quem nunca ouviu Casals, não sabe como um instrumento de cordas pode soar”.

Defensor da liberdade

Pablo Casals nunca foi, no entanto, apenas um músico de talento. Mais do que isso, o intérprete exemplar foi um lutador apaixonado por valores como a liberdade e a igualdade. Lenin e o stalinismo, Mussolini, a Alemanha de Hitler e a ditadura de Franco o levaram a isolar-se voluntariamente em Prades, um povoado nos Pirineus.

Por várias décadas, Casals não participou de nenhum concerto. Somente a partir dos anos 50 é que o violoncelista voltou aos palcos do mundo como intérprete e também regente. Todos os concertos feitos por ele a partir de então estiveram explicitamente “a serviço da paz e do entendimento entre os povos”.

Sua grande visão acabou, porém, apenas em sonho: “O Hino à Alegria da 9ª sinfonia de Beethoven tornou-se o símbolo do amor entre os homens. Eu sugiro, por isso, que toda cidade que dispõe de uma orquestra e um coro execute essa obra em um mesmo dia, transmitindo-a por ondas radiofônicas aos menores povoados e aos cantos mais distantes desse mundo, como uma nova oração. Uma oração pela paz, pela qual todos nós tanto ansiamos e há tanto tempo esperamos”.

No dia 22 de outubro de 1973, Pablo Casals morreu aos 97 anos. Na memória coletiva, ele continuou, no entanto, imortal. Tanto como grande músico quanto como grande homem.

(Fonte: http://www.dw.com/pt-br – CALENDÁRIO HISTÓRICO/ Por Catrin Möderler – 22/10/2016)

 

 

 

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