Foi o primeiro diretor nascido no país do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC).

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Foi o primeiro diretor nascido no país do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC)

Flávio Rangel, diretor e autor teatral. Boa parte das peças que emocionaram as platéias brasileiras nos últimos trinta anos leva a marca deste paulista de Tabapuã, que só foi descobrir o teatro aos 19 anos, como espectador de A Falecida, de Nélson Rodrigues. Flávio se transformou num dos melhores e mais atilados profissionais de teatro do país. De formação autodidata, baseada em sólidos conhecimentos de textos clássicos da dramaturgia internacional, ele foi o primeiro diretor nascido no país do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), sucedendo aos prestigiados Ziembinski e Adolfo Celi, vindos da Polônia e da Itália. Antes disso, jovem e desconhecido, espantou a platéia de um debate ao anunciar, arrogante, que ainda iria dirigir Maria della Costa, a anfitriã do encontro. A bravata se materializou em Gimba, de Gianfrancesco Guarnieri, em 1959, primeira direção profissional de Flávio e um enorme sucesso, que acabou excursionando pela Europa.

Flávio Rangel costumava dizer que as divindades do teatro sempre o tratavam bem. O ator Paulo Autran concorda: “Flávio foi o diretor brasileiro com maior número de sucessos em sua carreira”. Autran credita a Rangel alguns de seus melhores desempenhos, como em A Morte do Caixeiro Viajante, de Arthur Miller. Essa coleção de vitórias deve-se à noção de espetáculo que presidia o trabalho do diretor e a sua obstinação em perseguir o melhor resultado nas montagens. Alguns de seus conselhos foram transformados em máximas dos palcos.

“Para iluminar temos que ter poesia nas mãos”, afirmava. “Quem deixa o conforto dos chinelos e da TV para vir ao teatro deve ser tratado a pão-de-ló”, costumava advertir. Essa fórmula, que exercitou tanto em clássicos, como Esperando Godot, de Samuel Beckett (última interpretação de Cacilda Becker), quanto em textos nacionais, como O Santo Inquérito, de Dias Gomes, também lhe trouxe o rótulo preconceituoso de diretor de “teatrão comercial”. A tais críticas, rebatia: “A mais radical experiência de ultra-vanguarda passa a ser comercial no instante exato em que se abre a bilheteria para vender ingressos”.

A obstinação de Rangel nos palcos se traduziu, na vida pessoal, por uma valentia típica dos homens que sabem conquistar na vida o que ela tem de mais desafiador. Ao saber que tinha câncer, desde 1986, passou a ler livros de medicina sobre o assunto. Mesmo sabendo que seu câncer não podia ser extirpado por cirurgia e que a morte se aproximava, conversava sobre a doença com naturalidade e até com humor com os amigos, com a segunda mulher, a atriz Ariclé Pérez, e com o único filho, Ricardo, de seu primeiro casamento, com Maria Dulce Pedreira. Rangel passou por outros desafios na vida. Em 1968, foi preso pelo regime militar e, depois de ter a cabeça raspada, foi obrigado a lamber o chão da cela do quartel. Depois, seria preso por mais duas vezes por sua liderança política no meio teatral. Rangel morreu na terça-feira, dia 25 de outubro de 1988, de câncer pulmonar, agravado por enfisema, em seu apartamento no Rio de Janeiro, aos 54 anos. Com sua morte, os palcos do país perdem um artista de nobres e muitas batalhas.

(Fonte: Veja, 2 de novembro, 1988 – Edição n° 1052 – DATAS – Pág; 96)

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