Ferreira Gullar, foi um dos maiores autores brasileiros do século 20 e foi eleito “imortal” da Academia Brasileira de Letras (ABL)

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Poeta, escritor e teatrólogo é um dos maiores autores brasileiros do século 20. Ele foi eleito ‘imortal’ da Academia Brasileira de Letras em 2014.

O escritor Ferreira Gullar posa para fotógrafo durante entrevista em sua residência no bairro de Copacabana, na zona sul do Rio de Janeiro (Foto: Wilton Junior/Estadão Conteúdo/AE)

O escritor Ferreira Gullar posa para fotógrafo durante entrevista em sua residência no bairro de Copacabana, na zona sul do Rio de Janeiro (Foto: Wilton Junior/Estadão Conteúdo/AE)

 

Gullar é um dos maiores autores brasileiros do século 20 e foi eleito “imortal” da Academia Brasileira de Letras (ABL) em 2014, tornando-se o sétimo ocupante da cadeira nº 37.

Ferreira Gullar (São Luís (MA), 10 de setembro de 1930 – Rio de Janeiro, 4 de dezembro de 2016), poeta, escritor e teatrólogo maranhense, foi um dos mais importantes literatos da história da literatura brasileira. Ferreira Gullar passeou por vários campos da expressão poética, literária e crítica, quase sempre com um forte tom político. Avesso a rotulações binárias, usualmente se colocava no sentido contrário ao do poder em questão.

Ferreira Gullar assumiu ao longo da vida uma extensa lista de papéis que, sozinhos, não dão a dimensão do seu lugar na cena cultural do país. Um dos fundadores do neoconcretismo, o poeta participou de todos os acontecimentos mais importantes da poesia brasileira.

Seu primeiro livro, depois renegado pelo autor, foi “Um Pouco Acima do Chão”, em uma edição de autor em 1949. Cinco anos depois, veio “A Luta Corporal”, este já com os primeiros esboços da poesia esteticamente ambiciosa em que ele trabalharia incansavelmente até “Em Alguma Parte Alguma” e “Bananas Podres”, dois de seus livros mais recentes.

Ele estava com os irmãos Augusto e Haroldo de Campos na Exposição Nacional de Arte Concreta, em 1956, considerada o marco inicial do movimento concretista, expressão poética fundamental do século 20. Porém a contribuição foi breve: em fevereiro do ano seguinte, Gullar publicou um artigo no Suplemento Dominical do Jornal do Brasil questionando as teses do movimento, e o rompimento viria em seguida.

A disputa entre “concretos” e “neoconcretos” sempre ocupou um campo mais ou menos nebuloso entre a intelectualidade, mas os ecos, que influenciaram muitas das expressões artísticas nacionais desde os anos 1960, chegaram até 2015, quando Augusto de Campos e Ferreira Gullar trocaram cartas agressivas pelo jornal Folha de S. Paulo.

Em 1976, ele lançou seu trabalho mais célebre, o “Poema Sujo” — cem páginas de poesia na sua mais alta expressividade política. Símbolo de resistência à ditadura, o poema chegou aos brasileiros primeiro por uma fita que pertencia a Vinicius de Moraes, trazida de Buenos Aires, onde Gullar estava exilado.

Colecionador de prêmios, Gullar venceu o Machado de Assis da Biblioteca Nacional em 2005, e o Camões, o mais importante da língua portuguesa do mundo, em 2010.

 

Ferreira Gullar, um dos mais importantes literatos da história da literatura brasileira (Foto: Marcos de Paula/ Estadão)

Ferreira Gullar, um dos mais importantes literatos da história da literatura brasileira (Foto: Marcos de Paula/ Estadão)

 

Nascido José de Ribamar Ferreira em São Luís (MA), em 10 de setembro de 1930, Ferreira Gullar cresceu em sua cidade natal e decidiu se tornar poeta na adolescência. Com 18 anos, passou a frequentar os bares da Praça João Lisboa e o Grêmio Lítero-Recreativo da cidade. Aos 19 anos, descobriu a poesia moderna depois de ler Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeira.

O perfil de Gullar no site da ABL informa que, inicialmente, o escritor “ficou escandalizado com esse tipo de poesia”, mas mais tarde aderiu ao estilo, tornando-se “um poeta experimental radical”. Certa vez, ao comentar o período, afirmou: “Eu queria que a própria linguagem fosse inventada a cada poema”.

Ferreira Gullar durante posse na Academia Brasileira de Letras (ABL) no centro do Rio de Janeiro, em 2014 (Foto: Fábio Motta/Estadão Conteúdo/AE)

Ferreira Gullar durante posse na Academia Brasileira de Letras (ABL) no centro do Rio de Janeiro, em 2014 (Foto: Fábio Motta/Estadão Conteúdo/AE)

 

Nessa época, trabalhou no volume de poesia “A luta corporal” (1954), que o lançou no cenário nacional. Essa obra que resultou de “uma implosão da linguagem poética” é associada ao surgimento da poesia concreta. Gullar, porém, romperia com o grupo mais tarde, passando a fazer parte do movimento neoconcreto, ao lado de artistas plásticos e poetas do Rio.

Foi Gullar quem escreveu o manifesto que marcou a aparição, em 1959, do movimento neoconcreto, do qual também foram expoentes artistas como Lygia Clark e Hélio Oiticica. No mesmo ano, saiu o ensaio “Teoria do não-objeto”, outro texto fundamental do movimento.

Em 2013, Ferreira Goullar recebe Prêmio Governo de Minas Gerais de Literatura (Foto: Renato Cobucci/Imprensa- MG)

Em 2013, Ferreira Goullar recebe Prêmio Governo de Minas Gerais de Literatura (Foto: Renato Cobucci/Imprensa- MG)

Dentre as obras neoconcretas de Gullar, destacaram-se o “livro-poema”, o “poema espacial” e “poema enterrado”.

Derradeiro trabalho neoconcreto do poeta, este último consistia de uma sala que ficava no subsolo do espaço de exposição. A ela, chegava-se por uma escada. Quem “entrava” no poema encontrava lá embaixo um cubo vermelho. Dentro dele, um cubo verde. E dentro deste, um outro cubo, branco, onde se lia em uma das faces a palavra “rejuvenesça”.

Depois do “poema enterrado”, Gullar se afastou do movimento e se envolveu com política, tema de seus trabalhos seguintes. Ingressou no partido comunista e passou a militar contra a ditadura militar. Chegou a ser preso e a viver na clandestinidade. Fugiu do país, passando por Moscou, Santiago, Lima e Buenos Aires.

Durante o exílio na capital argentina, escreveu sua obra-prima: “Poema sujo” (1976). Trata-se de um poema com quase 100 páginas que teve ótima recepção. Foi traduzido para diversas línguas.

Gullar só voltou ao Brasil em 1977, onde foi novamente preso e também torturado. Conseguiu ser solto depois de pressão internacional e trabalhou na imprensa do Rio e como roteirista de TV. Nos anos 1980, escreveu o seriado “Carga pesada” e assinou a novela “Araponga”, essa em parceria com Dias Gomes e Lauro César Muniz.

Em 1985, com a tradução da peça “Cyrano de Bergerac”, ganhou o prêmio Molière, um feito inédito na categoria tradução.

No país, lançou “Na vertigem do dia” (1980) e a coletânea “Toda poesia”. Também artista plástico e crítico, escreveu “Etapas da arte contemporânea” (1985) e “Argumentação contra a morte da arte” (1993).

Em 1986, Ferreira Gullar participou de um quadro no Jornal da Globo onde poetas, dramaturgos, romancistas e cineastas produziam textos inspirados em fatos relatados no noticiário. A ideia era que a participação dos cronistas fosse associada a atividades culturais ou acontecimentos importantes. Gullar fazia comentários sobre artes plásticas.

Gullar também foi indicado ao Prêmio Nobel de Literatura em 2002.

Ferreira Gullar durante entrevista realizada no Rio, em agosto de 1992 (Foto: Carlos Chicarino/Estadão Conteúdo/AE)

Ferreira Gullar durante entrevista realizada no Rio, em agosto de 1992 (Foto: Carlos Chicarino/Estadão Conteúdo/AE)

Quarto dos 11 filhos do casal Newton Ferreira e Alzira Ribeiro Goulart, ele nasceu José Ribamar Ferreira no dia 10 de setembro de 1930 em São Luiz, no Maranhão. Foi na sua cidade natal que Gullar se descobriu artista ao ler a poesia de românticos, como Gonçalves Dias, e parnasianos, como Olavo Bilac e Raimundo Correia. Em entrevista ao GLOBO, em 2015, ele lembrou do seu espanto juvenil ao conhecer um poeta pessoalmente pela primeira vez, Manuel Sobrinho, que se interessou pelos versos do então jovem iniciante.

— Eu achava que todos os poetas estavam mortos, mas descobri que São Luís estava cheia deles — brincou Gullar, na época. — O modernismo de 1922 só chegou ao Maranhão no fim dos anos 1940. Quando comecei a ler os modernos, minha visão da poesia mudou completamente e senti que não podia mais ficar em São Luís.

Assim, no início da década de 1950, o poeta se mudou para o Rio de Janeiro, onde conheceu o crítico de arte Mário Pedrosa e buscou introduzir na sua poesia as novas leituras: Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Murilo Mendes e Rainer Maria Rilke. Nos anos seguintes, Gullar esteve presente em momentos-chave das vanguardas artísticas brasileiras. Em 1956, participou da exposição concretista que é considerada o marco oficial do início da poesia concreta. Três anos depois criou, com Lígia Clark e Hélio Oiticica, o neoconcretismo, que valoriza a expressão e a subjetividade em oposição ao concretismo ortodoxo.

Militante do Partido Comunista, exilou-se na década de 1970, durante a ditadura militar, e viveu na União Soviética, na Argentina e Chile. Retornou ao país em 1977 e foi preso por agentes do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) no dia seguinte ao desembarque, no Rio. Foi libertado depois de 72 horas de interrogatório graças à intervenção de amigos junto a autoridades do regime. Depois disso, retornou aos poucos às atividades de critico, escritor e jornalista.

Eleito em 2014 para a Academia Brasileira de Letras, colecionava uma vasta lista de prêmios. Em 2002, foi indicado por nove professores dos Estados Unidos, do Brasil e de Portugal para o Prêmio Nobel de Literatura. Em 2007, seu livro “Resmungos” ganhou o Prêmio Jabuti de melhor livro de ficção do ano. A obra, editada pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, reúne crônicas de Gullar publicadas no jornal Folha de S.Paulo ao longo de 2005.

Em 2010, foi agraciado com o Prêmio Camões, o mais importante prêmio literário da Comunidade de Países de Língua Portuguesa, pelo conjunto da obra. No mesmo ano, foi contemplado com o título de Doutor Honoris Causa na Faculdade de Letras da UFRJ. Um ano depois ganhou o Prêmio Jabuti com o livro de poesia “Em alguma parte alguma”. No ano passado, publicou “Autobiografia poética e outros textos” (Autêntica), um misto de depoimento sobre sua vida e obra e reflexão sobre o fazer poético.

 

Fereira Gullar - (Foto: Leonardo Aversa / O Globo)

Fereira Gullar – (Foto: Leonardo Aversa / O Globo)

 

Veja, abaixo, os livros publicados por Ferreira Gullar

Poesia
“Um pouco acima do chão” (1949)
“A luta corporal” (1954)
“Poemas” (1958)
“João Boa-Morte, cabra marcado para morrer” [cordel](1962)
“Quem matou Aparecida?” [cordel](1962)
“A luta corporal e novos poemas” (1966)
“Por você, por mim” (1968)
“Dentro da noite veloz” (1975)
“Poema sujo” (1976)
“Na vertigem do dia” (1980)
“Crime na flora ou ordem e progresso” (1986)
“Barulhos” (1987)
“Formigueiro” (1991)
“Muitas vozes” (1999)

Crônica
“A estranha vida banal” (1989)

Infantil e juvenil
“Um gato chamado gatinho” (2000)
“O menino e o arco-íris” (2001)
“O rei que mora no mar” (2001)
“O touro encantado” (2003)
“Dr. Urubu e outras fábulas” (2005)

Conto
“Gamação” (1996)
“Cidades inventadas” (1997)

Memória
“Rabo de foguete” (1998)

Biografia
“Nise da Silveira” (1996)

Ensaio
“Teoria do não-objeto” (1959)
“Cultura posta em questão” (1965)
“Vanguarda e subdesenvolvimento” (1969)
“Augusto dos Anjos ou morte e vida nordestina” (1976)
“Uma Luz no Chão” (1978)
“Sobre Arte” (1982)
“Etapas da Arte Contemporânea: do Cubismo à Arte Neoconcreta” (1985)
“Indagações de Hoje” (1989)
“Argumentação Contra a Morte da Arte” (1993)
“Relâmpagos” (2003)
“Sobre Arte, sobre Poesia” (2006)

Teatro
“Se Correr o Bicho Pega, se Ficar o Bicho Come” (1966), com Oduvaldo Vianna Filho
“A saída? Onde fica a Saída?” (1967), com Antônio Carlos Fontoura e Armando Costa
“Dr. Getúlio, Sua Vida e Sua Glória” (1968), com Dias Gomes
“Um rubi no umbigo” (1978)
“O Homem como Invensão de si Mesmo” (2012)

Ferreira Gullar durante entrevista realizada no Rio, em outubro de 1994 (Foto: Otávio Magalhães/Estadão Conteúdo/AE)

Ferreira Gullar durante entrevista realizada no Rio, em outubro de 1994 (Foto: Otávio Magalhães/Estadão Conteúdo/AE)

 

Seu último livro foi “Autobiografia poética e outros textos”, lançado em 2016.

Ferreira Gullar morreu em 4 de dezembro de 2016, aos 86 anos, vítima de uma pneumonia. Ele estava internado há 20 dias no hospital Copa D’Or, na Zona Sul do Rio de Janeiro.

A escritora e também imortal da ABL Nélida Piñon destacou a biografia de Gullar que, segundo ela, não foi ofuscada por sua obra.

— O seu legado é a obra, que, às vezes, faz a gente até esquecer a biografia. Mas este não é o caso. Ele teve uma vida bonita, difícil e de grande dignidade. O sofrimento do exilado não lhe tirou a graça.

O jornalista Zuenir Ventura esteve com o escritor e sua família no hospital nos últimos dias. Ele conta que o poeta estava consciente da gravidade de seu estado de saúde e, numa decisão lúcida e corajosa, não quis prolongar sua vida por meio de aparelhos.

Gullar foi velado na Biblioteca Nacional a partir das 17 horas do domingo, 4. Pela manhã, houve um cortejo até a Academia Brasileira de Letras. O poeta foi enterrado à tarde, no Mausoléu da ABL, no Cemitério São João Batista.

(Fonte: http://g1.globo.com/pop-arte/noticia – POP & ARTE/ Por G1 – 04/12/2016)

(Fonte: http://cultura.estadao.com.br/noticias/geral – GERAL – CULTURA/ Por Redação, O Estado de São Paulo – 4 Dezembro 2016)

(Fonte: http://oglobo.globo.com/cultura – CULTURA/ POR O GLOBO – 04/12/2016)

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