Dias Gomes, dramaturgo, escritor, novelista de TV e membro da Academia Brasileira de Letras

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Homem dos mil tipos

Dias Gomes (www.diariodoaco.com.br)

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Dias Gomes (Salvador, 19 de outubro de 1922 –- São Paulo, 18 de maio de 1999), dramaturgo, escritor, novelista de TV e membro da Academia Brasileira de Letras. O inventor de personagens de novelas que marcaram a história da televisão brasileira. O escritor que soube como poucos retratar as questões sociais do país em ficção.

Nas novelas, Alfredo de Freitas Dias Gomes foi sobretudo um criador de tipos inesquecíveis, que imediatamente caíam no gosto do povo. Como a Viúva Porcina e o Sinhozinho Malta de Roque Santeiro, apresentada entre 1985 e 1986. Ou o bicheiro Tucão de Bandeira 2 (1971-1972). Seu maior momento na televisão, a novela O Bem Amado, de 1973, fez tanto sucesso que se transformou num seriado, levado ao ar durante cinco anos seguidos com altos índices de audiência. O Bem Amado também fornece uma boa pista para se entender a popularidade dos personagens de Dias Gomes.

A maioria deles eram caricaturas de tipos recorrentes na vida nacional. Sucupira, a cidade onde se passava a novela, era governada por um prefeito populista, demagogo e corrupto. A população se dividia emtre os ingênuos que o apoiavam e os que tentavam desmascará-lo. Não faltava também o jornalista às voltas com a censura imposta à imprensa – uma alegoria do que acontecia à época no Brasil real. Dias Gomes inovou ao trazer para as novelas temas que estavam na ordem do dia no país. Como o desquite e a reforma agrária em Verão Vermelho (1970) ou a explosão imobiliária desenfreada nas grandes cidades em O Espigão (1974).

O viés político e social habilmente embutido nos folhetins de Dias Gomes é um reflexo de sua longa militância esquerdista – ele integrou o Partido Comunista Brasileiro durante trinta anos. Como dramaturgo, seu currículo ostentava uma dezena de peças teatrais de sucesso, todas focadas em temas sociais. O mais célebre delas O Pagador de Promessas, levada às telas em 1962 pelo diretor Anselmo Duarte, com Leonardo Villar e Glória Menezes nos papeis principais. No mesmo ano O Pagador de Promessas ganhou a Palma de Ouro no Festival de Cannes. O primeiro filme nacional a conseguir essa proeza.

A história critica a Igreja Católica tradicionalista e defende a reforma agrária. Quando virou minissérie, já nos anos 80, despertou a ira da União Democrática Ruralista, entidade que representava os latifundiários, obrigando a Rede Globo a amenizar o tom da narrativa. No início da década de 70, Dias Gomes chegou a ser duramente criticado pelas esquerdas por seu trabalho na televisão, vista por elas como uma espécie de monstro alienante a serviço da burguesia. Mas quem precisa da esquerda quando se tem o povo? Ao lado da primeira mulher, a novelista Janete Clair (Conquista, Minas Gerais, em 25 de abril de 1925 – Rio de Janeiro, 16 de novembro de 1983), e considerada a melhor autora do gênero na história da televisão brasileira, ele já havia caído no gosto de milhões de telespectadores.

Dias Gomes e Bernadeth Lyzio estavam casados fazia quinze anos e, apesar da grande diferença de idade, aparentavam ser muito felizes. Recentemente haviam mudado para um apartamento no exclusivo edifício Praia Guinle, no bairro carioca de São Conrado, que também abriga o ex-presidente João Figueiredo, o cantor Gilberto Gil, a socialite Lilibeth Monteiro de Carvalho e José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni das Organizações Globo. Da união com Janete Clair, Gomes teve três filhos, com quem ele foi casado durante quase 40 anos. O escritor mantinha contrato fixo com a Rede Globo. Há poucos anos, ganhou o direito de receber uma pensão do INSS, benefício concedido pela Lei da Anistia e pela Constituição de 1988 aos cidadãos que foram perseguidos pelo regime militar de 1964.

Em sua autobiografia, lançada em 1998, o dramaturgo Dias Gomes conta que morreu “temporariamente” em janeiro de 1995. Nessa época, ele implantara pontes de safena no coração, substtuído por uma máquina durante quarenta minutos na cirurgia. “Lembro apenas do apagar de uma lâmpada – se a morte é isso, não há por que temê-la”, escreveu, com o humor elegante que permeou tantas de suas obras. No dia 18 de maio de 1999, aos 76 anos, Dias Gomes morreu de verdade, numa cena bem mais dramática que a descrita no livro. O táxi que o transportava pelas ruas de São Paulo fez uma conversão proibida e foi colhido por um ônibus. O escritor foi cuspido do banco traseiro, e teve morte instantânea. Sua mulher, a ex-atriz Bernadeth Lyzio, 36 anos, que o acompanhava, teve mais sorte.

Foi levada a um hospital e liberada no dia seguinte. O motorista do táxi sobreviveu ileso. Mais tarde, nas primeiras horas do dia, o Brasil acordou chocado. O meio artístico e intelectual lamentava a perda de uma de suas figuras mais queridas e eminentes, o escritor que soube como poucos retratar as questões sociais do país em ficção. A esse círculo se juntaram os milhões de brasileiros que nos últimos trinta anos se emocionaram com as estupendas novelas e minisséries de telelevisão criadas por Dias Gomes. Ao tomar o táxi fatídico na porta de um restaurante paulistano, Dias Gomes fez seu último discurso de cunho social. “Vou pegar seu táxi porque ele é de frota, e sei que você ainda não conseguiu reunir a féria do dia”, disse ao motorista. A cena poderia estar numa de suas novelas.

Uma galeria inesquecível

Leonardo Villar como Zé do Burro no filme O Pagador de Promessas: crítica à Igreja e defesa da reforma agrária valeram Palma de Ouro em Cannes

Paulo Gracindo como o Tucão de Bandeira 2: o bicheiro vilão conquista a simpatia do público, reproduzindo o que acontecia no Rio de Janeiro nos anos 70

Gracindo como o prefeito populista e espertalhão Odorico Paraguaçu, em O Bem Amado: o público adorou a caricatura dos políticos brasileiros

Lima Duarte e Regina Duarte na pele de Sinhozinho Malta e Viúva Porcina, em Roque Santeiro: o país inteiro celebrou a alegria e a breguice do casal

(Fonte: Veja, 26 de maio de 1999 -– ANO 32 -– N° 21 – Edição 1599 -– Memória/ Por Okky de Souza – Pág; 158/159)
(Fonte: www1.folha.uol.com.br – Agência Folha – Do Rio de Janeiro – 24/03/97)

(Fonte: Veja, 20 de novembro de 1994 – ANO 27 – Nº 48 – Edição 1368 – DATAS – Pág: 108)

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