David Ben Gurion, líder do movimento sionista (unificação do povo judeu) e primeiro premiê do país

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Ben Gurion: da poeira às estrelas

David Ben Gurion (Polônia, 16 de outubro de 1886 -– Tel Aviv, 1° de dezembro de 1973), líder do movimento sionista (pela unificação do povo judeu) e primeiro premiê do país.

Não foi fácil para Israel atender ao último desejo do patriarca de sua independência. Com a mesma firmeza com que dirigiu os primeiros quinze anos de existência da nova nação, ele deixou ordens, antes de falecer no dia 1° de dezembro em Telavive, aos 87 anos de idade.

Ben Gurion renunciava ao lugar que lhe haviam reservado no cemitério dos heróis nacionais, em Jerusalém, ao lado do túmulo de Theodore Hetzl (1860-1904), o pai do sionismo e outra das figuras mitológicas da curta história israelense. Sua vontade era ser sepultado, junto de sua esposa Paula, falecida em 1968, no kibbutz de Sde Boker, açoitado pelos ventos do deserto de Negev.

Assim, os panegíricos foram substituídos por salmos de Davi e Salomão, e as honras oficiais limitaram-se ao mínimo. Apesar disso, no entanto, cerca de 250 000 pessoas desfilaram diante do seu féretro, exposto até à entrada do Knesset, o Parlamento israelense em Jerusalém. Às 11 horas, antes que um helicóptero o transportasse para o deserto, as sirenes de alarmas antiaéreo soaram e todo o país prestou-lhe a homenagem de 1 minuto de silêncio.

Em Sde Boker, num promontório coberto de pimenteiras, debruçado sobre os canyons escarpados do vale descrito na Bíblia como o ermo de Zin, umas trezentas pessoas viram seu caixão baixar à sepultura. Ao mesmo tempo, um soldado cantava o tradicional “El Moleh Rahamim”, a invocação de misericórdia para a alma de “David Bem Gurion, filho de Avigdor, primeiro chefe de governo e primeiro ministro da Defesa, redentor do povo de Israel em sua terra”. Vestida de preto, Golda Meir chorava, cercada por outras figuras do governo e os representantes dos seis únicos países que enviaram delegações oficiais ao enterro: Estados Unidos, Inglaterra, França, Alemanha Ocidental, Holanda e Dinamarca.

Zelo messiânico – Sessenta e sete anos depois de sua chegada à Palestina, Ben Gurion, encerrava, finalmente, sua luta pela implantação do Estado de Israel, sem conseguir alcançar para seu país. O isolamento político dos israelenses, causado pelo boicote do petróleo árabe e os atuais desentendimentos da cúpula dirigente do país, atormentaram os últimos dias do velho líder. Quando um derrame cerebral o paralisou parcialmente, duas semanas antes da morte, ele levou para o leito do Hospital Tel-Hashomer as aflições de uma crise político-militar em que era reclamada a inspiração de uma liderança como a sua.

O sol de Negev, para onde se retirara em 1963, ao deixar o cargo de primeiro-ministro, curtira sua face como um pergaminho. Ben Gurion tinha olhos azuis penetrantes, nariz de pugilista, e uma extraordinária energia, que parecia inversamente proporcional a seu físico diminuto. Seus admiradores o consideravam um visionário, um soldado-estadista de zelo messiânico. Para seus adversários políticos, ele aparecia, frequentemente, como um dono da verdade, um teimoso que impunha sua vontade e seus sonhos ao povo de Israel.

De fato Bem Gurion deveria viver desde a infância em meio à polêmica política e religiosa. Seu pai, ativista sionista, chocou os rabinos de Plonsk, sua cidade natal na Polônia, ao ensinar-lhe hebraico (língua então reservada às cerimônias religiosas) em vez de iídiche. Depois, em meio a uma Europa sacudida pelo anti-semitismo que produziu o caso Dreyfus, o menino David Gruen – que adotaria o sobrenome Bem Gurion, “filho de filhote de leão”, em hebraico, ao chegar à Palestina em 1906 – abraçou apaixonadamente a causa sionista pregada por Theodore Hertzl. Mas logo se convenceu de que o sionismo não teria sentido se os judeus não se instalassem em Israel. Assim, sob protestos do próprio pai, deixou a escola e partiu para a Palestina, onde viviam então 60 000 judeus, num desolado recanto do corrupto Império Otomano.

Multidão embriagada – Nas quatro décadas seguintes, Ben Gurion perseguiu sem descanso seu sonho de uma nação independente para o seu povo. Fundou a Hashomer, a primeira liga judaica de defesa, e se tornou editor do “Achdut” (“Unidade”), o primeiro jornal trabalhista da Palestina. De sua iniciativa também se originaram o Mapai, Partido Trabalhista de Israel, e a Histadrut, a confederação israelense do trabalho. Depois da Segunda Guerra Mundial, conduziu a guerra da independência contra os ingleses, encorajando a emigração maciça e ilegal para a Palestina dos judeus que haviam escapado dos campos de concentração nazistas.

A 14 de maio de 1948, sob um retrato de Hertzl, no museu de Telavive, Ben Gurion anunciou solenemente o nascimento do Estado de Israel. “As 16 horas da tarde, uma multidão embriagada de alegria dançava nas ruas, na mais completa inocência”, relataria mais tarde. “Mas eu estava triste, porque sabia o que iria acontecer. Aqueles foram os momentos mais patéticos de minha vida”. Em 24 horas, Israel estava em guerra com o Egito, Síria, Líbano, Jordânia e Iraque. Seguiram-se dias difíceis, em que Bem Gurion tinha de organizar o novo governo e ao mesmo tempo coordenar as defesas do país, confiadas a oficiais como Yigael Yadin, Moshe Dayan e Yigal Allon.

Ganha a guerra, Bem Gurion lançou-se numa campanha de mobilização de recursos no Ocidente, para o desenvolvimento econômico de Israel. Seu primeiro objetivo interno foi tornar-se aproveitável o deserto de Negev, uma das paixões de sua vida.

Apogeu e desgaste – Com a independência consolidada, a liderança política de Ben Gurion cresceu ao longo dos anos. Em 1956, quando participou com a França e a Inglaterra da ocupação relâmpago do canal de Suez, seu prestígio estava no apogeu. Contudo, a partir de 1960, seu desentendimento com o antigo ministro da Defesa, Pinhas Lavon, sobre uma operação secreta no Cairo em 1956, deu início a um processo de desgaste político que o levou a afastar-se do governo em 1963.

No seu retiro em Sde Boker, Ben Gurion voltou-se à preparação de suas memórias, depois de abandonar o Mapai e de tentar sem êxito levantar um partido dissidente, o Rafi, apoiado por Moshe Dayan. E, depois da Guerra dos Seis Dias, chocou muitos israelenses ao afirmar que todos os territórios ocupados, com exceção das colinas de Golan e da parte oriental de Jerusalém, deveriam ser devolvidos aos árabes. Apesar disso, Ben Gurion foi reeleito para o Knesset em 1969, e se retirou definitivamente da vida pública no ano seguinte. “Está escrito no Talmud”, disse ele certa vez, “que o judeu oscila entre a poeira das estradas e as estrelas.” Antes de morrer, Ben Gurion não viu a paz. Mas pôde ter certeza da transformação de seu país, de atrasada satrapia oriental num moderno Estado com 3 milhões de habitantes.

Esperando Genebra

Foram quinze horas de debates agitados, que avançaram pela madrugada do dia 6 de dezembro na mansão Arlozoroff, sede do Mapai, o Partido Trabalhista israelense. A reunião fora convocada para discutir a plataforma com que a agremiação situacionista, liderada pela primeiro-ministro Golda Meir, certamente será confirmada no poder nas eleições do dia 31 de dezembro. O gabinete israelense teve de suportar pesadas críticas pela maneira como foi conduzida a guerra de outubro contra os árabes. “O governo todo é responsável”, voltou a repetir Golda Meir, oferecendo-se como escudo para o ministro da Defesa, Moshe Dayan, alvo de um furiosa investida de alguns adversários políticos, como o vice-primeiro-ministro Yigal Allon, que exigiam a sua demissão.

David Ben-Gurion em 1949. (Foto: David Eldan/GPO via Getty Images)

David Ben-Gurion em 1949. (Foto: David Eldan/GPO via Getty Images)

(Fonte: Veja, 12 de dezembro de 1973 -– Edição 275 -– ISRAEL -– Pág; 47/50)
(Fonte: Veja, 10 de janeiro de 2007 -– Ano 40 -– N° 1 – Edição 1990 – DATAS –- Pág; 90)

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