A Religião convenceu as pessoas de que existe um homem invisível a viver no Céu, que observa tudo…

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A Religião convenceu as pessoas de que existe um homem invisível a viver no Céu, que observa tudo o que fazemos durante cada minuto de cada dia. E o homem invisível tem uma lista de dez coisas específicas que não quer que vocês façam. E se fizerem as coisas que o homem invisível não quer que façam, ele envia-vos para um sítio especial de fogo e fumo e tortura e angústia e grito e sofrimento para todo o sempre e até ao fim dos tempos. Mas ele ama-vos. Ele ama-vos e precisa do vosso dinheiro.

George Carlin

A forma implacável como o comediante americano George Carlin atacou a Religião sempre me fez lembrar a luta que outro ícone da contracultura – Frank Zappa – travou na década de 80 contra a tele-evangelização, a fé no divino lucro e a isenção de impostos para as igrejas.

Zappa escreveu uma canção-manifesto – Heavenly Bank Account – na qual retratava o típico pastor das tresmalhadas ovelhas do Senhor: «Cause he helps put/The Fear of God/In the Common Man/Snatchin’ up money/Everywhere he can/He’s got twenty million dollars/In his Heavenly Bank Account/You ain’t got nothin’, people». Carlin teria subscrito a denúncia sem hesitar.

Ambos partilhavam o mesmo tipo de eloquência feita de palavras e palavrões. Tanto um como outro enfrentaram os donos da moral e dos bons costumes. Eram homens observadores que não tinham medo de colocar questões – quanto mais incómodas, melhor. Zappa fazia-o sobretudo através da música, questionando-a e subvertendo-a, Carlin através do humor. Na base do que os dois faziam esteve sempre uma enorme inteligência e um gozo irresistível em desmontar tabus.

Foi a partir de um célebre número envolvendo apenas palavrões – sete – que George Carlin começou a ser mundialmente reconhecido. As sete palavras eram precisamente as expressões proibidas pelos censores da televisão e da rádio: shit, piss, cunt, fuck, cocksucker, motherfucker e tits. Por causa deste número – absolutamente brilhante – Carlin foi preso a 21 de Julho de 1972 sob a acusação de violar as leis sobre obscenidade.

A transmissão em 1978 de uma versão actualizada do mesmo número por uma estação de rádio em Nova Iorque levou o caso ao Supremo Tribunal. Os magistrados (5 a favor, 4 contra) consideraram que Carlin e a estação não tinham violado qualquer lei, pois o número «era indecente, mas não obsceno». «Indecente», já agora, é o que muitos comediantes sonham ser – e nem todos têm talento, coragem ou inteligência para o conseguir.

Domingo entrou no hospital da Califórnia a queixar-se de dores no peito. Morreu poucas horas depois. Tinha 71 anos. Os médicos anunciaram uma paragem cardíaca como a causa da morte, mas é provável que Deus tenha decidido vingar-se após tantas décadas de afrontas e Carlin passe a eternidade nas chamas do Inferno. Num dos seus números, Carlin desafiava Deus a provar a sua existência instigando-o a matar as pessoas na audiência. Uma vez que o blasfemo era o próprio comediante, o desafio na realidade era outro: Mata estes inocentes, como já o fizeste no passado. Religiosos, ambientalistas, feministas, políticos corruptos, racistas – todos eram levados pela corrente da sua lógica implacável.

Quando lhe questionaram por que razão tinha dado o título «Quando é que Jesus traz as costeletas?» a um dos seus livros, respondeu: «Porque consegue ofender ao mesmo tempo cristãos, muçulmanos, judeus e vegetarianos.» Eram assim as provocações de Carlin. Vai ter portanto o que merece: queimado por fogos que não existem num sítio especial que nunca ninguém viu, como de resto poderão confirmar pelos vídeos que se seguem.

(Fonte: www.bitaites.org – George Carlin, o homem das sete palavras/ Publicado por Marco Santos em Outras Artes – 24/06/2008)

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